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ANTONIO CARLOS LEMGRUBER
Exuberância irracional
O capitalismo da exuberância irracional está mais dramático em razão da globalização
e da liberdade de mercados
HÁ ALGUNS anos, o ex-presidente do Federal Reserve
Alan Greenspan usou a expressão "exuberância irracional" a
respeito do exagero na alta de preços
das ações nos Estados Unidos, aproveitando termo criado pelo economista Robert Schiller. De fato, verificam-se em certos mercados movimentos de preços que não parecem
ter explicação baseada nas leis de
oferta e demanda.
Será que a essência do capitalismo
-liberdade das forças de mercado
na formação de preços- tem esse
"defeito"? Temos bolhas demais nos
preços de ativos importantes como
ações, imóveis, commodities, câmbio?
Sem falar em 1929 -até hoje um
período de desemprego e queda de
preços que não sai da nossa mente-,
tivemos em 1987 num dia apenas
queda na Bolsa de Nova York que
equivaleria hoje a mais de 3.000
pontos (ou mais de 25%). E se acontecesse de novo? O economista Robert Samuelson anda tão preocupado que disse o seguinte: para 2008,
pode-se esperar qualquer coisa. E
Paul Samuelson: se você, economista, é obrigado a fazer previsões, faça
com muita freqüência.
Hoje em dia, há uma redescoberta
de economistas que ficaram na sombra de Keynes e Friedman, tais como Minsky e Pigou. Lá pela década
de 30, esses estudiosos descreveram
processos irracionais de formação
de preços de ativos, que conduzem à
formação de bolhas. Mais recentemente, na década de 70, Dornbusch
e Jacob Frenkel demonstraram que
esse fenômeno aparentemente irracional era muito freqüente no câmbio e nas commodities.
Acontece que a taxa de juros é a ligação entre o presente e o futuro.
Portanto, a cada momento, o preço
futuro esperado de uma ação ou outro ativo tem de refletir uma relação
direta com a taxa de juros. Surge o
que Dornbusch denominou "overshooting".
Seja com o real, nossa moeda, com
uma ação, com um imóvel, o "preço"
desse ativo deve atingir um certo nível a cada momento que faça com
que a expectativa para esse mesmo
preço dentro de 90 dias (por exemplo) produza um "diferencial" em
relação a hoje exatamente igual à taxa de juros (no caso do câmbio, deve-se descontar a taxa de juros internacional).
Assim, por exemplo, é preciso que
o real tenha uma certa apreciação
em relação ao dólar até que, em determinado momento, a expectativa
de desvalorização a partir daquele
ponto será igual ao diferencial de juros entre o Brasil e os Estados Unidos. Da mesma forma, o preço da
ação XYZ. O mesmo vale para petróleo ou soja.
Surgem as bolhas e a volatilidade
em preços importantes como o
câmbio, as ações e as commodities.
Não tem jeito: esse é o capitalismo
selvagem da exuberância irracional,
que está mais dramático em razão
da globalização e da liberdade de
mercados, valendo frisar a incorporação de novos "players" como China, Índia e Rússia.
Ninguém até hoje explica direito o
que aconteceu em 1929 ou em 1987.
Por outro lado, dá um certo conforto
o fato de que em geral a evolução dos
preços desses ativos tem sido relativamente pouco volátil. Ou seja: essas coisas só acontecem no capitalismo de vez em quando. Resta saber se
2008 vai ser mais parecido com a regra geral de bom comportamento,
ou com 1987 nos Estados Unidos, ou
com 1971 no Brasil (o país cresceu
mais de 10% ao ano durante seis
anos entre 1968 e 1973; porém, sem
mais nem menos, em 1971 a Bolsa
brasileira desabou inexplicavelmente).
ANTONIO CARLOS LEMGRUBER, 60, economista, foi presidente do Banco Central.
alemgruber@uol.com.br
Excepcionalmente, hoje, a coluna de LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS não é publicada.
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