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Pânico alcança nível histórico no crédito
Mercado tem a maior fuga rumo a "ativos seguros" desde a 2ª Guerra Mundial; empréstimos interbancários congelam
Para tentar conter ganhos de operadores com quebra de instituições, autoridades restringem negociação
de ações a descoberto
Andre Penner/Associated Press
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Operador da BM&F Bovespa no pregão de ontem em São Paulo
KRISHNA GUHA
MICHAEL MACKENZIE
GILLIAN TETT
DO "FINANCIAL TIMES"
O pânico nos mercados de
crédito atingiu intensidade histórica, ontem, provocando uma
fuga rumo à segurança de intensidade não vista desde a Segunda Guerra (1939-45).
Os barômetros de problemas
financeiros atingiram picos
históricos em todo o mundo. O
rendimento dos títulos de curto prazo do Tesouro americano
atingiu sua marca mais baixa
desde os ataques aéreos alemães contra Londres. Os empréstimos interbancários estão
literalmente paralisados, e os
investidores estão correndo
para retirar seus fundos de
qualquer instituição ou setor
cujo futuro tenha sido colocado
em dúvida.
O empréstimo de emergência de US$ 85 bilhões que o Federal Reserve (Fed, o BC dos
EUA) fez à gigante dos seguros
AIG, anunciado na noite de terça-feira, não bastou para conter
a disparada na aversão a riscos.
Em lugar disso, os mercados foram atingidos por nova onda de
ansiedade.
Uma das causas de medo
emergiu quando as cotas em
um fundo mútuo de mercado
monetário supostamente seguro caíram abaixo de seu valor
de face -um fenômeno conhecido como "breaking the
buck"- devido a prejuízos relacionados a dívidas do Lehman
Brothers. Isso agravou o risco
de que os investidores de varejo
em outros fundos como esse
entrem em pânico e retirem
seu dinheiro.
A busca por lucro foi abandonada enquanto os operadores
corriam para a segurança dos
títulos de curto prazo do Tesouro, e o rendimento da nota
de três meses caiu a apenas
0,03% -semelhante aos níveis
que caracterizaram a "década
perdida" do Japão. A última
ocasião em que o rendimento
esteve tão baixo foi em janeiro
de 1941.
As ações dos dois últimos
bancos de investimento de
grande porte que mantiveram a
independência nos Estados
Unidos, o Morgan Stanley e o
Goldman Sachs, despencaram
devido à elevação do custo de
garantia de suas dívidas, o que
coloca em risco a capacidade de
ambos para se financiarem
com recursos de mercado.
As repercussões se fizeram
sentir bem além dos Estados
Unidos. Houve transações turbulentas de papéis da HBOS,
uma grande companhia britânica de crédito hipotecário, que
foi forçada -sob pressão do governo britânico- a iniciar negociações de fusão com o banco
de varejo Lloyds TBS, depois de
registrar quedas drásticas nos
preços de suas ações.
Os empréstimos interbancários na Europa e nos Estados
Unidos estão para todos os efeitos suspensos. O chamado
"spread Ted" -a diferença entre a taxa Libor de três meses e
o rendimento dos títulos de Tesouro americano do mesmo
prazo, que serve para medir os
temores do mercado quanto
aos bancos- subiu a mais de
3%, o que supera seu fechamento recorde depois do crash
dos mercados de ações conhecido como "segunda-feira negra", em 1987.
As autoridades americanas
reagiram, e o Departamento do
Tesouro anunciou que tomaria
dinheiro para fornecer recursos ao Fed, que poderia usá-los
em suas operações de empréstimos de emergência -na prática, isso equivale a remover
quaisquer restrições contábeis
aos gastos em socorro.
A Securities and Exchange
Commission (SEC, órgão que
fiscaliza e regulamenta o mercado de valores mobiliários)
anunciou novas restrições,
classificadas pelos operadores
como draconianas, para operações de venda a descoberto. Os
adeptos da prática, que lucram
quando os preços das ações
caem, vêm sendo culpados pelos problemas da AIG. Mas essas medidas não bastaram para
evitar pesadas vendas, especialmente de ações de companhias financeiras dos EUA, que
caíram na média 9,4%.
A instabilidade é a mais alta
registrada desde março nos
mercados de ações. O dólar caiu
ligeiramente, e o iene japonês
se recuperou, à medida que arriscadas transações de financiamento cambial eram liquidadas. O ouro subiu 9%.
Um índice que acompanha o
custo de garantias de crédito
para os grandes operadoras no
mercado de derivativos de crédito sublinhava os sentimentos
negativos com relação aos bancos. O índice de risco de contraparte em transações de CDR
subiu acima dos 400 pontos básicos, ante 180 na semana passada. As ações dos mercados
emergentes caíram em mais de
7%, de acordo com o índice
MSCI, bem mais do que as
ações européias e americanas.
Andrew Brenner, co-diretor
de produtos estruturados e
mercados emergentes na MF
Global, disse que "parece que
ninguém deseja aceitar o crédito de ninguém mais... É como se
estivéssemos num precipício".
Muitos analistas criticaram
severamente as autoridades
por sua ação arbitrária quanto a
operações de resgate financeiro -a AIG foi salva, o Lehman
Brothers, não, o que torna impossível aos investidores prever o que vai acontecer, o que
solapa ainda mais a confiança.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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