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LUÍS NASSIF
O pacto que levou ao FMI
Nas últimas semanas há um clima novo no Planalto. A crise aguçou o sentimento de sobrevivência da equipe ministerial, FHC
rompeu o autismo que caracterizou sua ação frente à deterioração
das contas externas e firmou-se
um pacto onde, pela primeira vez,
foi definida uma estratégia pró-ativa de combate à crise.
A definição ocorreu em uma penosa reunião ministerial, alguns
dias antes da ida do ministro da
Fazenda, Pedro Malan, para a
reunião anual do Fundo Monetário Internacional (FMI). Participaram os principais homens da
Fazenda, do Banco Central (BC),
mais os irmãos Mendonça de Barros e o ministro da Educação, Paulo Renato de Souza -esses últimos representando a posição crítica em relação à continuidade do
modelo atual.
Desde a eclosão da crise da Ásia,
o ministro das Comunicações,
Luiz Carlos Mendonça de Barros,
vinha defendendo a tese de que a
crise se tornara sistêmica. Portanto, não haveria mais sentido em
manter a política atual, de taxas
de câmbio elevadas, para atrair
capital volátil, aguardando a normalização do mercado de capitais.
Esse foi o teor da longa conversa
mantida entre ele e seu irmão José
Roberto com FHC, numa noite de
sexta- feira, logo após a crise da
Rússia.
²
Ruptura de mercado
Em encontro ministerial ocorrido três semanas antes dessa reunião decisiva, a banda heterodoxa do ministério havia sugerido
um caminho alternativo. Se o
mercado estava fechado, haveria a
necessidade de aproveitar a crise e
montar um colchão de liquidez
com o FMI que, no mínimo, cobrisse a sangria de recursos externos brasileiros por 12 meses. A ala
ortodoxa foi contra. Alegou a impossibilidade de um acordo prévio
com o FMI, por parte de um país
que ainda dispunha de reservas
cambiais. E ainda se apostava em
uma recuperação do mercado.
Para a reunião, a banda heterodoxa convidou um brasileiro experiente, que atua no mercado financeiro nova-iorquino, que reafirmou que a crise da Rússia provocara ruptura total no mercado
de bônus e de investimentos de
curto prazo nos mercados emergentes. Não haveria sentido na
manutenção de taxas de juros elevadas por parte do Banco Central,
porque, em fases de excessiva desconfiança, quanto maiores os juros, maior a suspeita de calote.
Mas a reunião terminou sem conclusões maiores.
Três semanas depois, com as reservas se esvaindo em sangria desatada, ocorreu a nova reunião. A
essa altura começava a se esboçar
a percepção de que a crise já estava batendo às portas do sistema
bancário do Primeiro Mundo.
Com isso, o Brasil passaria a ser
peça-chave da estabilidade, podendo ser o primeiro país a pleitear ajuda do FMI dentro de um
novo modelo de intervenção, fora
dos padrões tradicionais.
Dali mesmo o FMI foi contatado
telefonicamente. E Malan embarcou para os Estados Unidos com a
estratégia definida. A reunião foi
importante para homogeneizar
pontos de vista. O único recalcitrante foi o diretor de Política Monetária do BC, Francisco Lopes,
que persistiu em sua visão de que
a crise deveria ser tratada com juros altos -e tratou de expor seu
ponto de vista em longa entrevista
ao "Estado", no período em que
Malan e Gustavo Franco já estavam em fase de negociação com o
Fundo. Mas Lopes conseguiu fazer
prevalecer seu ponto de vista, de
manutenção da política monetária pelo menos até que o conjunto
de reformas esteja encaminhada
com segurança.
²
Proposta inédita
Malan seguiu para Washington
com duas propostas inéditas para
o Fundo. A primeira, a da concessão de um empréstimo "stand by"
para um país ainda com reservas
cambiais elevadas. A segunda, que
esse empréstimo fosse feito com
grau de interferência limitada do
Fundo. O Brasil se comprometeria
com um ajuste fiscal, seguido de
queda dos juros.
Mas manteria um grau de liberdade para implementá- lo, sem a
necessidade das consultas a cada
passo, que caracterizavam os
acordos tradicionais do Fundo. E,
principalmente, sem submeter ao
Fundo os próximos passos de sua
política cambial, já que seria uma
discussão inócua nesse momento,
pois -independentemente da posição da equipe- nenhum passo
poderia ser dado antes da obtenção das condições prévias, de equilíbrio fiscal e colchão de liquidez.
A definição do Ministério da
Produção selou o pacto final firmado no Planalto.
²
E-mail: lnassif@uol.com.br
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