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São Paulo, terça-feira, 18 de novembro de 2003

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REUNIÃO DE MIAMI

Documento empresarial diz que negociação chegou a encruzilhada e defende retomada de "objetivos originais"

Empresário de Brasil e EUA pede Alca ampla

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MIAMI

Perplexos com a mudança de rumo nas negociações da Alca, os empresários do Brasil e dos Estados Unidos lançaram documento conjunto no qual defendem "os objetivos originais", ou seja, "manter ampla agenda temática sobre a mesa", em vez de aceitar a Alca desidratada que os governos dos dois países estão propondo.
Mas o documento empresarial, certamente por influência do lado brasileiro, recomenda "pragmatismo" na busca de "consenso em áreas sensíveis".
Os empresários dos dois lados reconhecem, de todo modo, que o processo Alca chegou a uma "encruzilhada", o que torna necessário "reestruturar o formato das negociações, de forma a mitigar dificuldades e obstáculos que prejudicaram as negociações hemisféricas nos anos mais recentes".
O texto reflete, de alguma forma, o "estado de choque" em que os empresários ficaram, na expressão de Gilman Viana Rodrigues, representante da Confederação Nacional da Agricultura, durante encontro anteontem à noite com a delegação brasileira.
O "estado de choque", admitido por outros empresários brasileiros, mas com linguagem menos dramática, deve-se ao fato de que todos eles trabalhavam, até 10 dias atrás, com uma visão abrangente da Alca e com a perspectiva de uma colisão frontal em Miami, entre Brasil e Estados Unidos.
Desembarcaram na sempre ensolarada cidade da Flórida, para o Fórum Empresarial das Américas, com um acordo aparentemente firme entre Brasil e Estados Unidos em torno de uma Alca expurgada de quase todos os temas que não sejam comércio de bens propriamente dito.

Visões divergentes
A perplexidade ajuda a entender a diversidade de opiniões entre os membros da Coalizão Empresarial Brasileira, o guarda-chuva que reúne representantes dos mais diferentes setores de negócios nas rodadas comerciais regionais ou globais.
Viana Rodrigues reclama, por exemplo, que o governo brasileiro "aceitou não discutir o apoio interno aos agricultores norte-americanos, o que é ruim para o Brasil, mas não aceitou discutir investimentos, o que também é ruim para o Brasil, que precisa do investimento externo".
O representante da CNA admite que a proposta norte-americana na área de investimentos é ruim (tira toda a possibilidade de políticas autônomas de regulação ou direcionamento do capital externo). Mas, acrescenta: "A gente não precisa aceitar um mau acordo. Se a regra para investimentos do Nafta é ruim, deveríamos usar esse exemplo para corrigir os erros e fazer um acordo melhor".
Nafta é o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (EUA, Canadá e México), que, de fato, prevê liberdade irrestrita para o movimento de capitais.
Concorda, em parte, Guilherme Duque Estrada de Moraes (Abiquim, Associação Brasileira da Indústria Química): "O governo aceitou tirar da negociação temas que poderiam ajudar, pela barganha, no capítulo de acesso a mercado nos Estados Unidos".
Mas Humberto Barbato (vice-presidente da Abinee, Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica) toma o rumo oposto: "As assimetrias entre as economias da Alca são tamanhas que só se pode mesmo buscar uma Alca possível. É positiva a nova visão que foi dada a ela no documento conjunto".
Pragmático, Pedro de Camargo Netto, com larguíssima experiência em negociações na área agrícola, como empresário ou como alto funcionário da Agricultura no governo anterior, acha que "empurrar com a barriga" era mesmo o que se tinha que fazer, dada a dificuldade da negociação.
Para ele, o documento conjunto Brasil-EUA apenas mantém a negociação em "respiração assistida", à espera de novo momento.
A perplexidade dos empresários se deve também ao fato de que o trabalho deles se torna a rigor inútil ou superado. Os documentos do Fórum Empresarial vinham sendo trabalhados há meses, com base na visão de Alca abrangente.
Não haverá tempo, nos três dias de reuniões em Miami, para adaptá-los à nova visão, até porque Duque Estrada (Abiquim) diz que, pelo relato da própria delegação oficial aos empresários no domingo à noite, "as coisas não estão ainda definitivamente resolvidas".
Não chega a ser novidade, lembra: quando o documentos dos encontros empresariais são entregues aos ministros (o que, em Miami, acontecerá amanhã) os vice-ministros já terminaram de elaborar a Declaração Ministerial. É o que ocorrerá de novo em Miami, salvo um impasse total, que, de todo modo, anularia o documento empresarial.


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