São Paulo, segunda-feira, 19 de janeiro de 2004

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SALTO NO ESCURO

Consórcio controlado pela norte-americana deve US$ 700 mi ao banco, relativos à compra de ações da estatal

Cemig gera nova disputa entre BNDES e AES

ANA PAULA GRABOIS
DA SUCURSAL DO RIO

Resolvida a dívida de US$ 1,2 bilhão da AES relativa à privatização da Eletropaulo, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) tem agora outro problema a enfrentar com a empresa americana.
O consórcio SEB (Southern Electric Brasil), controlado pela norte-americana AES, deve US$ 700 milhões ao banco. A dívida corresponde a um empréstimo contraído para a compra de parte da Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais), em 1997.
O valor já foi provisionado integralmente pelo BNDES desde novembro passado, ou seja, foi contabilizado como prejuízo em seu balanço financeiro.
Os três sócios privados, entretanto, vêm recebendo regularmente os dividendos pagos pela Cemig. Desde que entraram no negócio, já receberam R$ 236,3 milhões (US$ 133,5 milhões), segundo a Cemig. Também foi aprovado o pagamento de outros dividendos no valor de R$ 36 milhões (US$ 12,2 milhões), a ser feito até dezembro deste ano.
A Cemig é controlada pelo governo de Minas Gerais, que tem 50,96% do capital votante. A SEB tem 32,96% do capital com direito a voto da empresa. Além da AES, que detém 65,5% das ações, participam da SEB a americana Mirant (antiga Southern) e o banco Opportunity (9,4%).
Desde maio, quando venceu a primeira parcela do financiamento, o consórcio controlado pela AES não paga ao BNDES.
O presidente do banco, Carlos Lessa, classificou recentemente o problema como "um subfantasma". O fantasma em questão era a dívida da AES relativa à privatização da Eletropaulo, cujo acordo já foi formalizado. Faltam acertos burocráticos que devem ser fechados até o próximo dia 31.
Em fevereiro, o diretor da área financeira do BNDES, Roberto Timótheo da Costa, que ficou à frente das negociações do caso AES/Eletropaulo, deve se dedicar ao caso Cemig.
O empréstimo à SEB foi usado para comprar a participação do próprio BNDES na Cemig. O banco havia ficado com parte do capital da distribuidora devido a um acordo entre o governo de Minas e o governo federal durante a renegociação da dívida estadual com a União. A negociação ocorreu no governo anterior (1995-1998), do ex-governador Eduardo Azeredo (PSDB). Na época, o valor do empréstimo correspondeu a US$ 526,5 milhões.
Logo após assumir o governo mineiro em 1999, o ex-presidente da República Itamar Franco conseguiu na Justiça retirar dos acionistas privados o direito de veto no Conselho de Administração da Cemig. A SEB estava à frente da gestão da empresa e do conselho.
O argumento da AES para a inadimplência com o BNDES é que o valor pago pelas ações lhe daria o direito de mandar na empresa.
Atualmente, a SEB participa do conselho de administração, mas sem o direito de veto e de participar diretamente da gestão. Ou seja, alegam que pagaram um preço alto pelas ações que têm agora.
No BNDES, a questão já passou do setor de recuperação de créditos para o de contenciosos, o que permite ao banco recorrer à Justiça. Se essa for a opção, a solução será a venda em leilão das ações correspondentes ao empréstimo. O BNDES pode ainda concorrer no leilão e voltar a ser acionista da empresa estatal mineira.
O presidente do Conselho de Administração da Cemig e secretário de Desenvolvimento Econômico e Social de Minas Gerais, Wilson Brumer, diz que a questão deve ser tratada no âmbito estritamente judicial. Segundo ele, o governador Aécio Neves (PSDB) não vai intervir na questão.
Como presidente do conselho, Brumer diz que o assunto não interfere nos negócios da Cemig e que todos os conselheiros vêm se entendendo bem. Segundo ele, se não houver acordo e a solução for a entrada do BNDES na Cemig, não haverá problemas.
Procurados pela Folha, a AES e o Opportunity não comentaram o assunto.


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