São Paulo, sexta-feira, 19 de abril de 2002

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COLAPSO DA ARGENTINA

Presidente não aceita exigências de diretor do Fundo; cotação da moeda dos EUA vai a 3,12 pesos

Duhalde ataca receita do FMI e dólar dispara

FABRICIO VIEIRA
DE BUENOS AIRES

O presidente Eduardo Duhalde não gostou das declarações do diretor-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), Horst Köhler, e atacou as receitas e exigências feitas pela entidade para que o país receba ajuda financeira e tente sair da crise econômica.
"As exigências do Fundo podem levar o país a dificuldades ainda maiores. A Argentina não vai dizer sim a tudo o que o FMI pede", desafiou Duhalde.
O presidente ficou incomodado com a afirmação de Köhler de que a solução para a crise não será fácil para o povo argentino. Em declarações a uma rádio local, Duhalde disse que o ministro da Economia, Jorge Remes Lenicov, "vai apresentar o que o governo argentino entende por plano sustentável. Não é um programa alternativo ao do Fundo, apenas tem algumas modificações".
O mercado reagiu mal ao enfrentamento de Duhalde, por prever maiores dificuldades para o fechamento do acordo de socorro financeiro que o país necessita. O resultado foi a disparada do dólar, que saltou 6,8%. A moeda foi vendida a 3,12 pesos no fim dos negócios, o maior preço desde o dia 26 do mês passado.
A previsão do FMI de que o PIB (a soma das riquezas produzidas) da Argentina deve cair entre 10% e 15% no ano também desagradou ao mercado. Além de as perspectivas do governo serem bem mais otimistas -de queda do PIB de 4,9% no ano-, a larga variação apresentada na projeção da entidade mostra, segundo analistas, as incertezas que a economia do país geram até mesmo no FMI.
Lenicov se encontra hoje em Washington com o secretário do Tesouro norte-americano, Paul O'Neill. Amanhã o ministro tem uma reunião com Köhler e com vice-diretora-gerente do Fundo, Anne Krueger.
"Há coisas que evidentemente temos de fazer, mas não podemos firmar um acordo que sabemos que não vamos cumprir", disse Duhalde, em referência aos ajustes exigidos nas Províncias pelo Fundo, que incluem corte de 60% no déficit fiscal e suspensão da emissão de bônus.
Somada às declarações de Duhalde, a dificuldade do governo em chegar a uma decisão para frear a saída de recursos do curralzinho, que tem acontecido devido a decisões judiciais, também agitou o mercado.
O rumor de que seria decretado feriado bancário e cambial a partir de hoje tumultuou o centro financeiro de Buenos Aires. Milhares de pessoas e empresas correram para comprar dólares. O Banco Central argentino desmentiu os rumores apenas no fim da tarde.
O BC também limitou US$ 500, o montante que as pessoas podem comprar nos bancos de moeda norte-americana vendida pela autoridade monetária. Antes, esse limite era de US$ 1000.

Títulos públicos
A equipe econômica trabalhava ontem com a hipótese de apresentar um projeto de lei que faça com que os recursos liberados pela Justiça do bloqueio dos depósitos bancários sejam pagos com títulos públicos.
Na prática, seria uma reedição do "Plano Bonex", lançado pelo ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) no início da década de 90 para devolver os depósitos bancários congelados no período. Como a Suprema Corte deu seu aval à medida na época, o governo acredita que com esse precedente ficaria livre da possibilidade de a Justiça barrar a decisão.
Duhalde já avisou não estar convencido da viabilidade da proposta da equipe econômica. Na quarta-feira, Duhalde desautorizou e entrou em conflito com Lenicov devido a outra proposta desenhada pelo Ministério da Economia para resolver o problema.
A informação da possibilidade de se implementar essa medida fez com que as ações de bancos disparassem na Bolsa Buenos Aires e fizessem o Merval fechar com alta de 8,6%. Os papéis do Banco Francés dispararam 23,8%, e os do Grupo Financeiro Galicia, 18,3%. Analistas afirmam que a devolução de depósitos por meio de títulos públicos representaria um forte alívio na situação atual dos bancos.
Os governadores peronistas -do mesmo partido de Eduardo Duhalde- aumentaram ainda mais a turbulência ontem, ao confirmarem o cancelamento do encontro que teriam com o presidente para discutir os ajustes fiscais exigidos pela equipe de técnicos do Fundo.



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