São Paulo, domingo, 19 de agosto de 2001

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COMÉRCIO EXTERIOR

Maioria dos setores apresenta crescimento acanhado por falta de plano de longo prazo, avalia AEB

"Máquina exportadora" só patina no Real

Marcelo Min/Folha Imagem
Nestor Bergamo na linha de montagem da fábrica de móveis que leva o nome de sua fámilia


JOSÉLIA AGUIAR
DA REPORTAGEM LOCAL

Quase uma década de abertura comercial e estabilidade de preços mudou pouco a radiografia das vendas externas brasileiras. Entre os 32 principais setores exportadores, a maioria teve crescimento tímido nos anos do Real e sem ter obedecido a uma estratégia voltada para o mercado externo.
Análise e dados compilados pela AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil) mostram que somente seis segmentos conseguiram impulsionar as vendas para o exterior por causa de um plano definido para o longo prazo. O país, que, em 1994, ano de estréia do Real, respondia por 1,04% das exportações mundiais, perdeu mercado. A participação brasileira caiu para 0,88% em 2000, já com moeda desvalorizada.
O crescimento vegetativo das exportações brasileiras ocorre por razões que vão desde o chamado "custo Brasil" -imposto alto, dificuldade de crédito, problemas de infra-estrutura- à maior concorrência internacional e às barreiras comerciais criadas pelos países para proteger seus próprios produtores. "Mas, acima de tudo, pode-se dizer que estamos longe de ter um resultado programado", avalia José Augusto Castro, diretor da AEB.
Castro afirma que a trajetória das exportações é descontínua porque varia de acordo com fatores como o comportamento do mercado brasileiro e as mudanças de preço. "No geral, vemos que, quando consumo interno está ruim, as indústrias direcionam um pouco mais das vendas para o exterior. Em alguns casos, o desempenho subiu em dólar porque os preços aumentaram."
Alguns exemplos. De 1994 a 2000, o setor de químicos exportou 175% a mais e subiu da quarta para a segunda posição no ranking dos principais produtos brasileiros vendidos lá fora. Castro explica que esse crescimento (medido por dólares) ocorreu basicamente devido à alta do petróleo. O de laminados de aço e ferro exportou 37% menos após a queda de preços no mercado internacional e o maior consumo interno.
Exceções à regra, segundo o diretor da AEB: segmentos como o de aviação, com crescimento de 2.007% no período -por mérito de uma única empresa, o da ex-estatal Embraer-, e os de móveis e de carnes, que venderam 75% e 44%, respectivamente, como resultado de uma estratégia específica para conseguir maior participação lá fora. Os setores automotivo, de computadores e de celulares também tiveram desempenho acima da média porque se estruturaram para vender no exterior.

Pouca tradição
A avaliação de José Augusto Castro, da AEB, leva o tema do fraco desempenho das exportações do país a uma velha discussão: a de que o tamanho do mercado brasileiro é um dos motivos que fazem com que os diversos setores da economia se concentrem nas vendas internas e apresentem interesse restrito de entrar em novos mercados.
"Parte da pouca tradição que temos para exportar ocorre por causa do grande mercado que as indústrias têm para atender aqui dentro", avalia o economista José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. "É fato também que o incentivo governamental foi muito mais retórico do que concreto", acrescenta.
O ex-diretor do BC Paulo Yokota, hoje na Idéias Consultoria, reforça esses argumentos. "Um país que quer exportar precisa ter disposição para isso. No Brasil, o governo desestimulou as exportações, e as empresas não saíram atrás para saber o que o consumidor de fora queria e para oferecer seus produtos."
O diretor-adjunto de Comércio Exterior da Fiesp, Maurício Costin, afirma que quem demorou para se modernizar na última década perdeu o ritmo no mercado internacional. "Criar um mercado para industrializados é muito mais difícil. E ainda há empresários que não se deram conta das vantagens de exportar."



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