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São Paulo, terça-feira, 19 de agosto de 2003

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GRADUALISMO DO BC/A FAVOR

Aperto tem que continuar, diz ex-diretor do FMI

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

Para retomar um processo de crescimento sustentável, o Brasil deveria perseverar a política econômica atual por pelo menos mais um ano, ao longo do qual reduziria gradativamente os juros.
Segundo Michael Mussa, diretor do Departamento de Pesquisas do FMI (Fundo Monetário Internacional) entre 1991 e 2001, o país deveria manter um superávit primário superior a 5% nos próximos 12 meses "para mostrar que pretende controlar de forma consistente a dívida pública".
"Há um longa história de altos e baixos no Brasil, e um afrouxamento agora passaria um sinal muito pouco positivo", diz. "Para aguentar socialmente essa política, o país deveria aprofundar programas sociais mais focalizados."
Mussa afirma que, mesmo com uma política fiscal apertada, o Brasil deve voltar a crescer neste semestre. Leia trechos da entrevista de Mussa à Folha:
 

Folha - Como o sr. analisa o atual momento da economia brasileira? O Banco Central não está demorando demais para baixar os juros?
Michael Mussa -
A área econômica do governo Lula vem tendo resultados razoavelmente positivos neste ano. O Brasil vem obtendo um superávit primário acima da meta, os "spreads" cobrados do país internacionalmente caíram substancialmente e o BC acaba de iniciar o processo de redução dos juros. O ritmo está um pouco lento pelo fato de a inflação ter ficado em patamares muito elevados no início do ano. A consequência disso é que o crescimento da economia tem desapontado, mas creio que uma nova fase de recuperação deva começar ainda neste ano e firmar-se em 2004.
Há um longa história de altos e baixos no Brasil, e um afrouxamento agora passaria um sinal pouco positivo. O importante dessa vez é não forçar uma redução maior dos juros e manter a política fiscal apertada. A inflação mostrou uma força muito grande, pressionada pelo câmbio, mas agora parece que esta vindo abaixo. No final do ano, provavelmente a taxa de juros já estará abaixo de 20% ou até em 15% ao ano.

Folha - O Brasil não está exagerando, por exemplo, ao fazer um superávit primário maior do que os 4,25% do PIB acertados com o FMI?
Mussa -
Um superávit primário acima de 5% é ainda desejável por mais um tempo, tendo em vista o tamanho do estoque da dívida brasileira. Embora o tamanho da dívida externa em relação ao PIB tenha diminuído pelo efeito do câmbio, a interna vem sendo pressionada pelos altos juros. Com mais um ano, sem uma crise que leve o câmbio a um patamar muito diferente do atual, muito provavelmente o custo real da dívida pública brasileira terá um declínio importante, abrindo espaço para juros bem menores e uma redução do superávit primário. É importante que o governo passe a percepção a todos os investidores e ao mercado de que o Brasil está trilhando um caminho de longo prazo para conter a sua dívida pública. Aí está a chave para baixar os juros de maneira consistente.

Folha - Como o país aguenta socialmente, com o desemprego no patamar atual e com as demandas de vários grupos?
Mussa -
Creio que ainda exista um problema de falta de foco no Brasil. Quando falamos dos pobres brasileiros, nos referimos muitas vezes a pessoas que ganham menos que US$ 500 (R$ 1.500,00) por ano. O Brasil precisa de políticas mais efetivas para identificar essas pessoas e transferir um pouco mais de renda.


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