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LUÍS NASSIF
O limite dos procuradores
Afinal, procuradores devem ou não se valer da mídia para divulgar meras suspeitas? Recentemente, uma procuradora federal em São Paulo, aguerrida, porém equilibrada, defendeu que o exagero de alguns procuradores não deveria
impedir o acesso dos demais à mídia.
A autonomia do Ministério Público foi uma das grandes conquistas democráticas do país. O MP ganhou poder e, como tal, tem de saber dosá-lo. O processo
jurídico é necessariamente complexo, por envolver muitos componentes, e exigir a análise técnica dos fatos levantados por ambas as partes. Não é trabalho para amador. Para entendê-lo, exige conhecimento jurídico e muito discernimento para separar alhos de bugalhos e filtrar a verdade.
O trabalho do procurador é levantar peças de acusação. Assim
como o jornalista que consegue
seu "furo", o procurador procura
supervalorizar os indícios que levanta, esquentar suas suspeitas,
tirar conclusões que podem ou
não ter consistência. Mas o seu limite é dado pelo Judiciário, incumbido de analisar todos os argumentos e proferir a sentença.
Quando a reportagem ouve o
procurador que, em "off" ou em
"on", apresenta suas suspeitas
como sendo provas -ou mesmo
quando divulga esse primor acaciano tipo "se houver provas contra tal candidato, ele será indiciado"-, confere-se um poder
sem limites a ele. Ele pode dispor
de suspeitas sem fundamento, de
acusações sem prova, mas no
ambiente não-técnico de uma reportagem dará sua palavra final.
O limite do poder do procurador -assim como do jornalista- está dado pela análise técnica dos fatos. O procurador tem
de se ater aos fatos. Se se tirar esse limite, não tem como controlar a corporação, e será fácil alguns procuradores se prestarem
a jogos de interesse, ou exercerem o poder pelo poder.
Recentemente, Zeca do PT foi
alvo de um tiroteio por parte de
procuradores com os quais tem
desavenças antigas. Os procuradores divulgaram acusações, de
supostas ligações do governador
com criminosos que atuavam na
fronteira. Era uma profusão de
informações, de personagens, de
fatos, de tentativa de estabelecer
ilações, relações entre personagens e fatos, denotando a complexidade do episódio.
Muitas questões tecnicamente
justificáveis eram apresentadas
como "denúncias" pelos procuradores. Como, por exemplo, o
tom de acusação adotado para
denunciar o fato de um coronel
ter obtido habeas corpus para
responder ao processo em liberdade. O habeas corpus havia sido
concedido por unanimidade pelo
tribunal -provavelmente pelo
fato de o coronel ser réu primário. Ou seja, uma decisão absolutamente justificável, do ponto de
vista técnico, ganha ares de escândalo quando transportada
para as páginas dos jornais sem
as devidas explicações. Quem resiste?
No foro técnico adequado -o
processo-, a informação da reportagem era a de que o MP em
Brasília não teria identificado
nenhuma evidência contra o governador que permitisse transformar o processo em inquérito.
No entanto os procuradores conseguiram fazer prevalecer sua
posição no foro não-técnico (a
mídia).
Às vezes pode ser que o processo esbarre em posições suspeitas
de juízes. Ocorre que o direito de
ir à mídia e fuzilar reputações é
dado indistintamente a todos os
procuradores -dos responsáveis
aos tresloucados. E cada um deles decide de forma pessoal e intransferível como utilizá-lo: se
com discernimento ou se como
um novo-rico do poder.
Cada manipulação política
dessa arma é debitada ao MP como um todo, prejudicando o trabalho daqueles procuradores que, sem o foco da mídia, trabalham de maneira anônima e técnica para cumprir sua função constitucional.
E-mail - LNassif@uol.com.br
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