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OPINIÃO ECONÔMICA
Dois cenários
JOÃO SAYAD
A chuva diminuiu um pouco. O vento amainou, as ondas
já são menores. O céu ainda está escuro e carregado de nuvens. Mas podemos pensar em
alternativas.
A primeira alternativa é a do
governo, que quer manter a
mesma política.
Consegue um empréstimo internacional vultoso, que eleva
as reservas para US$ 80 bilhões, mantém a desvalorização de 6% ou 7% ao ano, faz
programa cruel de corte de
gastos e aumento de impostos e
tenta reduzir as taxas de juros
muito vagarosamente.
Não corre nenhum risco de
retorno da inflação. Tem a certeza de que produz uma recessão bastante forte e desemprego ainda maior.
Muitas empresas não conseguem pagar juros e quebram,
criando problemas para o sistema financeiro.
Assistiremos aflitos à corrida
entre dívida interna e superávit primário. Se o superávit
primário ganhar dos juros, a
estratégia dá certo. Se os juros
ganharem do superávit primário, começamos a perder confiança na dívida interna.
A recessão pode transformar
o déficit comercial em pequeno
superávit.
Depois de algum tempo, os
sobreviventes estarão vivendo
em país sem nenhuma inflação
(talvez uma persistente e forte
deflação), muitos desempregados e violência nas ruas.
A taxa de câmbio terá se desvalorizado em 15% ou 21% após
dois ou três anos.
O ministro da Produção, depois de muitos esforços para incentivar produção e as exportações, pede demissão e é substituído por outro que nunca despachará com o presidente. A posição se transformou em cargo para barganha política para permitir a aprovação de alguma reforma no Congresso.
Permanece o risco de desvalorização espontânea e descontrolada, particularmente se houver
alguma crise em países emergentes. Nesse caso, o risco de retorno
da inflação com desemprego é
muito grande.
Na eleição de 2002, teremos
muitos candidatos radicais e
exóticos, líderes de audiência de
programas de rádio ou televisão,
líderes religiosos de religiões comerciais, policiais acusados de
matança, curandeiros e profetas.
A campanha eleitoral pode ter
batalhas de ruas, com grupos paramilitares ou da segurança dos
candidatos atacando adversários.
O cenário alternativo é mais
otimista.
O governo obtém grande empréstimo internacional.
O Banco Central, carregado de
dólares, desvaloriza o câmbio de
forma a que ninguém tenha dúvidas de que as exportações serão extremamente rentáveis e as
importações muito caras.
Torna-se mais barato ir a parques temáticos nacionais do que
à Disneylândia. Voltamos a consumir carvão nacional no churrasco de fim-de-semana.
A taxa de juros doméstica pode
cair bastante ou mais rapidamente do que no caso anterior.
Aumenta significativamente o
endividamento das empresas
brasileiras que têm dívidas em
dólares. Mas as empresas conseguem pagar os juros.
A dívida interna cresce à mesma taxa do crescimento do produto. O déficit público deixa de
ser assunto.
A desvalorização cambial
equivale a corte bastante forte
da demanda agregada e, portanto, gera recessão.
Mas será recessão diferenciada: diminui a demanda de produtos comerciáveis (soja, automóveis, microcomputadores) e
em compensação aumenta a demanda por produtos não comerciáveis (habitação, saúde, educação, lazer).
Corremos o risco de passar por
reflação, isto é, o fim da deflação, que ainda é conceito exótico
para os brasileiros de hoje.
O desemprego será menor do
que na alternativa anterior, a
produção maior. O Plano Real
estará salvo.
Esta é a alternativa que o Brasil sempre usou.
Não se trata de retorno aos
anos de inflação do período 67-
94.
Trata-se de alternativa que o
país adotava nos anos anteriores
à crise de 30. Quando caía o preço do café, o governo desvalorizava o câmbio, mantinha a renda do setor cafeeiro e aumentava a demanda por produtos nacionais. É um retorno aos anos
20 e 30. A globalização financeira fez o mundo voltar atrás.
Neste cenário, nas vésperas da
próxima eleição o país estará
crescendo com base em exportações maiores e importações
maiores e desemprego menor.
Os candidatos de 2002 estarão
concentrados no centro do espectro político, discutindo a reforma política, educação e proteção
ambiental. Talvez alguém venha
com a história de reeleição. Nada é perfeito: é risco que temos
que correr.
²
João Sayad, 51, economista, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP
e ex-ministro do Planejamento (governo José
Sarney), escreve às segundas-feiras nesta coluna.
E-mail: jsayad@ibm.net
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