UOL


São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

A agonia do modelo

Na coluna de ontem afirmei que o período atual é semelhante ao da agonia do modelo nacional-desenvolvimentista.
A crise do modelo anterior começou em 1974, com a primeira crise do petróleo. A sobrevida foi assegurada no governo Geisel pelo aumento exponencial do endividamento interno e externo e um pacto com o poder econômico hegemônico de então, as lideranças industriais paulistas, organizadas em torno da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
Como não havia plano de vôo, foram sendo criadas disfunções de toda espécie: superinvestimentos do BNDES, fechamento de mercado, nacionalização dirigida de empresas multinacionais. As doenças do organismo econômico se manifestavam na perda de competitividade, na inflação e no aumento progressivo das dívidas interna e externa. Esse nó górdio só foi rompido no governo Collor, depois de o país ter perdido dez anos sem rumo.
No rastro da crise dos anos 80 consolida-se a nova elite econômica do país. Saem os industriais da Fiesp e entram os novos capitalistas, os bancos de investimento que fazem fortuna no período especulando na Bolsa ou trabalhando com informações privilegiadas do Banco Central.
No início dos anos 90 os interesses dos novos capitalistas estavam suficientemente consolidados para que assumissem papel privilegiado no processo de privatização de Collor.
Mesmo com essas concessões, o primeiro governo Collor tinha equipe capenga, mas visão estratégica afiada, combinando redução da dívida interna (por meio do "confisco"), abertura gradual da economia e início dos programas de qualidade.
Esse modelo resultou na crise política que culminou com a entrada de Marcílio Marques Moreira no Ministério da Fazenda. É ele quem dá início ao novo ciclo, focado exclusivamente em fatores macroeconômicos, com ênfase na liberação dos capitais e na melhoria dos fundamentos fiscais.
Politicamente, o modelo conseguiu se consolidar juntando duas pontas: o setor financeiro e os grandes grupos nacionais -incluindo a mídia-, com acesso ao crédito em dólares. A disfuncionalidade apareceu logo, agravada pelos erros do câmbio no Plano Real -que aprofundou de maneira temerária o modelo. Produziu rapidamente uma dívida interna gigantesca e uma vulnerabilidade externa que explodiu em 1999, provocando gigantescos prejuízos nos grupos que se endividaram em dólar.
Hoje em dia, o modelo se tornou disfuncional. Só interessa aos grupos especuladores. É só analisar a progressão da dívida pública, a situação dos Estados e municípios, a estrutura de juros e de tributos, a crise das pequenas, médias e grandes empresas. Não há mais espaço para aumento de tributação nem para manutenção do nível atual de juros.
Resta saber se o governo Lula conseguirá romper o imobilismo e começar a pensar na transição controlada para o novo modelo ou se as mudanças se darão mais uma vez por meio da crise.

E-mail -
Luisnassif@uol.com.br


Texto Anterior: Publicidade: Justiça manda Schin tirar campanha do ar
Próximo Texto: Transgênicos: Justiça de SC ordena retirada de produtos sem rotulagem
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.