São Paulo, quinta-feira, 19 de dezembro de 2002

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Leme defende o aumento do superávit fiscal

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

A decisão do BC de elevar a taxa básica de juros de 22% para 25% ao ano pode deteriorar significativamente o perfil da dívida brasileira se o governo eleito não anunciar um forte aumento do superávit primário e mostrar disposição real de fortalecer a política fiscal. A opinião é de Paulo Leme, diretor de pesquisas de mercados emergentes do banco Goldman Sachs, em Nova York.
Leme disse ainda estar preocupado com sinais errados vindos da Comissão de Orçamento do Congresso. "Na terça, o relator do Orçamento, senador Sérgio Machado, criou, de maneira mágica, 1,1% do PIB em receitas fictícias para 2003. E, para piorar, propôs gastá-las, em vez de poupá-las."

Folha - Por que o sr. não está inteiramente satisfeito com o aumento dos juros?
Paulo Leme -
O que me preocupa é a substância do problema. A taxa de juros é um instrumento da política econômica insuficiente para resolver objetivos múltiplos. A abordagem mais saudável teria sido um aumento de juros acompanhado por sinais de um aumento do superávit primário.

Folha - Por quê?
Leme -
Porque isso debelaria qualquer preocupação com relação ao impacto do aumento dos juros no coeficiente dívida-PIB. Essa é a principal preocupação macroeconômica. Cabe ao Copom e à próxima administração resolverem esse dilema, senão a eficácia do aumento dos juros é limitada e continuaremos com dúvidas sobre a solvência fiscal.

Folha - Qual o impacto do aumento dos juros na relação dívida-PIB?
Leme -
Cada elevação de 100 pontos-base (ou um ponto percentual) equivale a um aumento de 0,2 ponto percentual no coeficiente dívida-PIB.

Folha - Qual seria o aumento do superávit primário necessário para compensar os efeitos da última elevação dos juros?
Leme -
A conta mais importante é outra. Considerando que houve uma mudança permanente na taxa de câmbio, o número necessário para trazer a sustentabilidade fiscal é 5% do PIB. Na verdade, não se pode aumentar o superávit primário toda vez que os juros sobem. Portanto, a decisão mais adequada seria aumentar logo o superávit para 5% e reavaliar mais tarde.

Folha - Será necessário aumentar os juros novamente?
Leme -
Sim, mas o aumento exato depende do superávit fiscal que se pretende fazer. Quanto maior for o choque de credibilidade trazido pelo aumento do superávit primário, menor vai ser a necessidade de um aumento de juros.

Folha - O sr. tem feito críticas à discussão orçamentária no Congresso. Por quê?
Leme -
Ontem, Sérgio Machado, relator da comissão de orçamento, fez a seguinte mágica: aumentou a projeção da inflação e do deflator do PIB para o ano que vem de um modo que criou, de maneira mágica, 1,1% do PIB de receitas. A pior notícia, no entanto, é que ele vai gastar esse dinheiro que não existe. Ele poderia ao menos dizer que irá "economizar" essas receitas fictícias.


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