São Paulo, quinta-feira, 20 de janeiro de 2005

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Adesão chegará a 70%, diz responsável pela troca

SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

Mesmo sob intenso bombardeio de críticas dos credores estrangeiros, a oferta de troca da dívida pública argentina alcançará 70% de adesão, na estimativa de Luis Corsiglia, presidente da Caixa de Valores do país vizinho.
A entidade dirigida por Corsiglia é uma central de custódia e liquidação de títulos, responsável pela troca dos papéis da dívida pública no território argentino.
Em entrevista à Folha, o presidente da Caixa de Valores defendeu os termos da renegociação argentina e criticou a taxa de juros do Brasil. Leia a seguir.

 

Folha - Na sua opinião, a Argentina alcançará os 50% de adesão à troca da dívida, meta anunciada pelo ministro da Economia, Roberto Lavagna ?
Luis Corsiglia -
Penso que será maior, que chegará a 70%.

Folha - Qual é o atual resultado da troca, após a adesão de 20% na abertura?
Corsiglia -
Sexta [a abertura] foi um dia especial, porque houve um acordo [do governo] com a AFJP [fundo de aposentadoria e pensão com 10 milhões de acionistas], para que aderissem a um bônus desenhado para eles [Cuasi Par, com desconto de 30% e prazo de pagamento de 42 anos]. Isso se cumpriu, e esse bônus praticamente esgotou.
Segunda foi muito diferente. Só ingressaram investidores médios ou pequenos, num total de US$ 500 milhões. No exterior os balcões estavam fechados, pelo feriado nos EUA.
Muitos investidores estão em férias. Tomam conhecimento de que a troca começou e estudam se podem melhorar sua posição, com as chamadas arbitragens. Uns vendem bônus no mercado, e outros aproveitam para comprar, melhorando sua posição.

Folha - Isso indica a redução do ritmo de adesão?
Corsiglia -
Vai ser diferente agora, mais lento.

Folha - Analistas dizem que os credores internacionais aderirão por estar cansados de esperar uma solução. O que leva os argentinos a aceitar a troca?
Corsiglia -
Os títulos chegaram a ter um valor muito baixo, menor do que 20%. Hoje, estão acima de 30% do valor original. Os credores reconheceram que a capacidade de pagamento do país está muito limitada.
Foram aceitando a situação e pensam: hoje, o que tenho é esse bônus, a esse preço. Mas, se eu contribuir para desatar esse nó que é a Argentina em moratória, o país poderá diminuir seu endividamento, crescer, e o valor do meu bônus irá melhorando.

Folha - O sr. diz que os credores argentinos arcam com o prejuízo em favor do país?
Corsiglia -
Exatamente. É muito diferente do perfil do investidor estrangeiro, que continua reclamando seus direitos. Estar à distância é mais complexo. É como se eu tivesse que opinar sobre a política interna do Brasil. Observo o Brasil a uma distância média.

Folha - Se o sr. tivesse que opinar sobre a taxa de juros do Brasil, por exemplo?
Corsiglia -
A primeira coisa que diria é que me parece extraordinariamente alta. Não entendo como fazem para se endividar a 16%, e a inflação é muito menor. Custa-me crer, mas cada país sabe administrar suas finanças de uma maneira tão especial.

Folha - Ou não.
Corsiglia -
Aqui acreditávamos que sabíamos administrar a dívida. Veja onde estamos.

- Folha - Os credores internacionais classificam a proposta de "mesquinha" e dizem que a Argentina pode pagar mais, segundo os resultados de sua economia nos últimos dois anos.
Corsiglia -
Quando um devedor começa a se recuperar, todo mundo quer ser o primeiro a receber. Mas é preciso ter cautela, porque, se lhe exigem muito, freiam sua recuperação. Por isso a Argentina diz que vai pagar essa quantidade de dívida e não mais. É a forma de ter dinheiro para investir em infra-estrutura, que nos permita continuar crescendo, garantir as mínimas condições sociais a um país com alto índice de pobreza.

Folha - Alguns analistas políticos criticam o clima de "tudo ou nada" criado em torno da saída da moratória. Qual o papel da renegociação da dívida no futuro da Argentina?
Corsiglia -
Decididamente é muito importante. Ninguém pode crescer sem investimentos. Para ter investimentos estrangeiros, um país necessita uma qualificação mínima que é a situação de sua dívida pública. Neste momento, não estamos qualificados, porque estamos em moratória. Se conseguirmos sair, teremos os investimentos necessários ao crescimento a médio prazo.


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