São Paulo, terça-feira, 20 de janeiro de 2009

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agrofolha

Seca arrasa trigo argentino e pesa na inflação do Brasil

A menor em duas décadas, safra do país vizinho deve apresentar quebra de 43%

Para analistas, volume para moinhos brasileiros vai recuar 80%; alternativa é comprar produto mais caro, ofertado por EUA e Canadá

THIAGO GUIMARÃES
DE BUENOS AIRES

Protagonista da maior crise argentina em 2008, o setor rural do país vizinho inicia mais um ano de dificuldades com o governo Cristina Kirchner.
Para o Brasil, a principal consequência está na queda na produção argentina de trigo. A safra 2008/09, segundo a Bolsa de Cereais de Buenos Aires, foi de 8,7 milhões de toneladas -a menor em 20 anos e 43% abaixo dos 15,2 milhões de toneladas da temporada passada.
Analistas estimam que o Brasil -dependente do trigo argentino- terá 80% a menos para importar do vizinho. Ao buscar o grão mais caro em outros países, como EUA e Canadá, o resultado será mais inflação, dizem moinhos nacionais.
A maior seca em 70 anos, a queda na produção, a perda de rentabilidade e a intervenção estatal nos mercados de grãos, carne e leite reforçam o mal-estar entre produtores e governo.
A crise começou em março de 2008. Durante alta recorde das commodities, o governo criou um sistema "móvel" de impostos sobre exportações de grãos, que seguia as cotações externas. "Tentou-se que o setor pagasse muito acima de sua capacidade", diz Ricardo Bindy, do site agrositio.com.
O campo reagiu. Promoveu locautes e 4.000 bloqueios de estradas pelo país. Houve desabastecimento, a causa ganhou apoio nacional e o projeto do governo caiu no Senado em julho, com desempate do vice-presidente, Julio Cobos.
Na semana passada, Cristina anunciou facilidades para comprar máquinas e fertilizantes. Não agradou às principais entidades do setor, que pedem menos impostos e entraves a exportações. "Não há diálogo com o governo, que nos vê como oposição", afirma Javier Jayo, secretário-geral da CRA (Confederações Rurais Argentinas).

Queda de produção
Produtos primários (22%) e manufaturas agropecuárias (34%) respondem pela maior fatia das exportações argentinas -os dados são de 2007. O saldo comercial do país em 2008, até novembro, ficou em US$ 14,3 bilhões, o maior desde 2003 (US$ 15,7 bilhões).
Projeções privadas apontam queda de 20% na safra total de grãos deste ano -de 98 milhões para 78 milhões de toneladas.
O pior quadro é o do trigo. Seca, restrições a exportações e menor rendimento por baixo uso de fertilizantes explicam a situação. Como o governo limita a venda externa do cereal para conter a inflação, restariam apenas 2,3 milhões de toneladas para exportar, diz Mariano Lamothe, economista-chefe da consultoria Abeceb.com.
Isso "significa aumento de preços no Brasil", afirma o vice-presidente da Abitrigo (Associação Brasileira da Indústria do Trigo), Antenor Barros Leal.
O país compra cerca de 60% do trigo que a Argentina exporta. Em 2009, diz Leal, precisará importar 6 milhões de toneladas e terá que recorrer ao produto de países como EUA e Canadá, 40% mais caro.
Os moinhos brasileiros reclamam da taxação para o trigo. Como as tarifas de exportação alcançam 23% para o cereal sem processar e apenas 18% para a farinha, a farinha argentina chega ao Brasil mais barata do que a nacional. A Abitrigo prepara uma queixa antidumping.
A Secretaria da Agricultura argentina não atendeu aos pedidos de entrevista da Folha.


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