São Paulo, sexta-feira, 20 de fevereiro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

O país que criamos

Aquilo deu nisso, como diria o samba debochado dos anos 70 ou 80. O modelo de governabilidade criado no governo Fernando Henrique Cardoso, preservado e aprofundado pelo governo Lula, conseguiu expulsar o país do governo e tornou a economia formal uma cidadela sitiada pela expansão do crime organizado.
Anos e anos de estagnação da economia, taxas de juros exorbitantes e arrocho fiscal sem precedente conferiram tal poder político às fontes de liquidez da economia que só um estadista em um ponto qualquer do futuro para romper com essa tragédia.
O primeiro governo FHC foi o da farra cambial e fiscal. No segundo prosseguiu a farra dos juros, um pouco amenizada, mas ainda farra, e procedeu-se a um dantesco arrocho fiscal. Cada aumento de juros, cada aumento de impostos, ajudava a alimentar as duas grandes fontes de riqueza que prosperaram no período: na economia formal, o sistema financeiro e alguns setores oligopolizados; na economia informal, o crime organizado. E tinha que se ouvir que esse caminho é que levaria ao futuro.
Analise-se o país pelas últimas semanas. Os banqueiros do bicho, que tinham uma banca restrita -em geral financiavam parlamentares que foram secretários de segurança-, hoje em dia têm uma influência acachapante sobre o Executivo federal, sobre a Câmara Federal e sobre diversos governos estaduais. O país virou uma enorme lavanderia e toda essa sonegação foi compensada pelo aumento dos tributos sobre os empresários da economia formal.
Petrobras e grandes bancos têm exibido lucros sem paralelo na história do país. Todo esse sorvedouro de dinheiro sai da veia da economia formal -empresários e contribuintes- direto para esses setores. Sem condições de produzir, de sobreviver nessa selva, os empresários que entram em processo de crise são esmagados, assim como os consumidores que não dão conta de financiamentos contratados.
Sobre esses recai a mão pesada do Estado e de todo o aparato de cobrança e fiscalização. Atrasou o tributo, multas pesadíssimas, correção monetária; atrasou com os bancos, renegociação em bases onerosas, nome no cadastro negativo. As informações sobre o empresário em dificuldade se espalham como um corisco. Imediatamente seu nome é mandado para todos os serviços de proteção ao crédito, a troca de informação entre fiscalização federal e estadual o submete a levas e levas de visitas de fiscais.
Há um completo descaso e desconhecimento em relação à economia formal. É só avaliar o que dizem esses economistas de planilha sobre a atividade econômica. Foram incapazes de perceber -até hoje- os efeitos socioeconômicos desse arrocho fiscal e monetário. O arrocho arrebentou as empresas do mundo formal e expôs uma nação inteira à influência do crime organizado.
O sociólogo Fernando Henrique Cardoso jamais anteviu conseqüências óbvias da política que implantou. O metalúrgico Lula jamais conseguirá entender.
Só resta continuar acreditando que Deus é brasileiro.

E-mail -
Luisnassif@uol.com.br


Texto Anterior: Alta: Negócios com título de emergentes sobem 29%
Próximo Texto: Superávit: País tem o maior saldo nas contas externas em 11 anos
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.