|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Bufunfeiros à beira de um ataque de nervos
Os países e bancos
que se apresentavam como modelos de governança
estão hoje na lona
A TURMA da bufunfa vive um
dos seus momentos mais tenebrosos. Não no Brasil, claro. Os elevados juros brasileiros e
outras benesses garantem lucros relativamente fáceis. Os bufunfeiros
tupiniquins não precisam inventar
nada nem correr grandes riscos.
Já os bufunfeiros americanos e
europeus vêm registrando perdas
gigantescas. Várias instituições financeiras estão com a corda no pescoço, buscando socorro governamental. Algumas já sucumbiram. A
última vítima foi o banco Bear
Stearns -uma referência internacional. Normalmente, um bufunfeiro brasileiro não se referia ao Bear
Stearns sem que dos seus lábios
pendesse a proverbial "baba elástica
e bovina da humildade".
Estamos diante de um grande paradoxo. Os países e bancos que se
apresentavam -e eram aceitos-
como modelos de governança estão
hoje na lona.
Não se duvida mais da gravidade
da crise. Segundo o ex-presidente do
Federal Reserve Alan Greenspan, "a
atual crise financeira dos Estados
Unidos deverá ser julgada em retrospecto como a mais violenta desde o fim da Segunda Guerra Mundial". O número dois do FMI, John
Lipsky, numa declaração incomum
para um dirigente dessa instituição,
chegou a dizer que as autoridades
governamentais devem se preparar
para "pensar o impensável".
Como está reagindo o Brasil a esse
tumulto? Até agora, surpreendentemente bem. Digo "surpreendentemente" porque o brasileiro está
acostumado à vulnerabilidade externa. Nas últimas décadas, o Brasil
se mostrou muito suscetível a choques internacionais. É notável que a
crise financeira esteja rolando há oito meses sem ter afetado substancialmente o desempenho da economia brasileira.
O que mudou? Basicamente a
qualidade dos nossos indicadores
econômicos. O Brasil, assim como
outros países emergentes, tem hoje
uma economia mais forte. A inflação
está controlada, as contas públicas
não registram grandes desequilíbrios, a dívida pública vem diminuindo como proporção do PIB.
Além disso, as contas externas
brasileiras se fortaleceram de maneira expressiva nos últimos cinco
anos. Esse é o aspecto crucial. A fragilidade das contas externas era a
grande fonte de vulnerabilidade do
país e uma das principais causas do
crescimento medíocre da economia.
O fundamental é impedir que esse
avanço seja revertido pela valorização persistente do real. Já há sinais
claros de deterioração do nosso balanço de pagamentos em conta corrente. É verdade que parte dessa deterioração reflete a rápida expansão
da demanda interna. Mas a contribuição do câmbio tem sido decisiva.
O Ministério da Fazenda procurou reagir a esse problema com o pacote de medidas cambiais da semana passada. A medida mais importante foi a imposição de um IOF de
1,5% sobre investimentos estrangeiros em renda fixa. Quebra-se assim
mais um tabu. O controle sobre o ingresso de capitais especulativos era
estigmatizado como medida "heterodoxa", "de alto risco", que poderia
desestabilizar a economia. O governo ignorou esse vaticínio e foi em
frente. Não aconteceu nada. O que
se discute agora é se a medida será
eficaz ou se os bufunfeiros encontrarão meios de contorná-la.
Cabe agora acompanhar de perto
os movimentos do mercado e aplicar a medida com rigor. Evidentemente, tudo ficará mais difícil se o
Banco Central insistir em sinalizar
aumento dos juros básicos num momento em que as taxas estão caindo
rapidamente nos Estados Unidos e
em outros mercados.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
Texto Anterior: Análise: Sobe-e-desce de commoditites agrícolas coloca mais tensão sobre produtor brasileiro Próximo Texto: Estrangeiros tiram R$ 2,1 bi da Bovespa Índice
|