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OPINIÃO ECONÔMICA
Juros: deixem a palavra com o Banco Central
MAILSON DA NÓBREGA
A taxa de juros elevada que
tem caracterizado a economia
brasileira costuma servir para
dois propósitos inteiramente
dissociados da realidade que
justifica sua adoção.
O primeiro é servir de base
para pedidos de concordata
preventiva. As empresas culpam
a política econômica e/ou os juros altos pelo insucesso, nunca
seus próprios erros.
Mudanças bruscas na política
econômica, como a que ocorreu
na reação à crise asiática, podem levar empresas a desequilíbrios superáveis com a concordata, mas são poucos os casos
em que o fracasso não se explica
por problemas gerenciais.
O segundo é permitir críticas
de políticos e setores do governo
ao Ministério da Fazenda e ao
Banco Central. Em período eleitoral como este, chovem informações "off the record" às colunas acusando a equipe econômica de "insensibilidade social".
Já vi esse filme várias vezes e
imaginava que ele havia sido
definitivamente banido da cena
brasileira. Engano. Bastou aparecer uma crise para que ele
voltasse às salas de projeção.
Tem-se visto desde as habituais fofocas e intrigas palacianas até a sofreguidão de autoridades que nada têm a ver com o
assunto, mas aproveitam para
prometer publicamente a queda
de juros. É a eleição.
Ninguém tem dúvida de que
os juros atuais constituem sério
empecilho à retomada do crescimento. Se não baixarem, o
Brasil perderá a oportunidade
de explorar o seu imenso potencial de geração de bem-estar.
Os juros altos são a consequência mais dolorosa do regime fiscal doentio herdado da
crise do Estado e das presepadas populistas da Constituição
de 1988.
Para os que culpam a política
cambial, a desvalorização seria
o meio de restabelecer as condições para o crescimento e para
a queda dos juros, sem risco de
retorno da inflação. A tese é
discutível e nenhum governo sério a assumiria no momento.
Nesses tempos de crise nos
chamados mercados emergentes, a taxa de juros tem sido
fundamental para preservar a
conquista da estabilidade monetária, especialmente na América Latina.
No México e na Argentina, em
1995, a determinação das autoridades em elevar a taxa de juros gerou custos no curto prazo,
mas contribuiu para defender a
estabilidade, melhorar a situação do balanço de pagamentos
e restaurar a confiança.
O Brasil tem sido elogiado pela maneira como reagiu às
ameaças da crise. Vários relatórios de instituições multilaterais, bancos e empresas de análise de investimento realçam a
coragem e a propriedade das
medidas.
Os efeitos negativos na atividade econômica e no emprego
são inequívocos, mas é preciso
deixar de olhar apenas o lado
desfavorável das medidas e
considerar também o fato de
elas terem permitido ao país
preservar a estabilidade da
moeda.
Infelizmente, sem reformas
que mudem radicalmente a situação fiscal e antes que se restabeleça o grau de confiança
prevalecente antes da crise, é
difícil ver a taxa de juros declinar na velocidade demandada
por políticos e empresários.
Dados os riscos que ainda estão no ar, um descuido poderia
detonar uma fuga de capitais e
o estancamento de novos fluxos
de recursos externos, levando-nos a uma desvalorização
descontrolada, de consequências imprevisíveis.
Estudo recente de Nathan
Blanche e Roberto Padovani
mostra que para retornar ao nível real prevalecente antes da
crise a taxa nominal de juros
deveria ser de 19% (28% atualmente).
Nas condições atuais, eles
afirmam que o piso para a taxa
básica de juros (TBC) é de 22%
ao ano. Poder-se-ia reproduzir
os juros reais anteriores à crise
se o governo reduzisse a alíquota de Imposto de Renda sobre as
aplicações financeiras, dos
atuais 20% para 6,6%.
Essa alternativa é barata. Se
fizer as contas, o governo pode
concluir que a alíquota de 20%
dá prejuízo. Diante das vinculações, o Tesouro fica com menos da metade da arrecadação,
um valor menor do que o custo
adicional dos juros. Politicamente, contudo, parece inviável
mudar.
Haveria duas outras saídas
para alcançar esse mesmo objetivo: reduzir o cupom cambial
líquido para 7,1% ao ano ou
diminuir o ritmo da desvalorização cambial para 5,2% ao
ano. Qualquer das duas colocaria sob risco as contas externas
e o Plano Real.
Solução fácil só existe nas declarações destituídas de conteúdo técnico. Quando feitas por
pessoas ligadas ao governo,
criam falsas esperanças. Nessa
área, como acontece nos países
sérios, seria melhor deixar a palavra ao Banco Central.
Mailson da Nóbrega, 55, ex-ministro da Fazenda (governo José Sarney), escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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