São Paulo, sexta, 20 de março de 1998

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ARTIGO
Educação e democracia

IBERÊ Z. BANDEIRA DE MELLO
Aloizio Mercadante, em artigo na Folha (Dinheiro, 8 de fevereiro), no afã de atacar o governo Mário Covas, criticou o sorteio de vagas para o segundo grau da rede escolar do Estado. Afirmou: "Distribuir vagas nas escolas" (por sorteio) "é um escândalo inaceitável", mas não apresentou nenhuma alternativa ao sorteio adotado pela Secretaria da Educação. Tão-somente lembrou que sua carreira (assim como a de alguns de seus familiares) deveu-se ao fato de ter estudado numa escola pública em Santos -o colégio Canadá.
De certo o colégio Canadá foi, e deve ser ainda, uma boa escola. Mas o ex-deputado deixou de lado um detalhe importante: era uma boa escola para poucos. Sou santista por adoção e sei que, na minha época, o estudo naquele educandário era uma aspiração de todos os pais com filhos na idade escolar.
Assim, o espantoso é que, nessa relembrança nostálgica, Mercadante não tenha assinalado o seu privilégio, pois milhares de estudantes santistas não ingressaram nesse ginásio e foram obrigados a pagar escolas particulares, nem sempre de boa qualidade.
Mais espantoso ainda é o fato de Mercadante implicitamente apresentar o privilégio que desfrutou (não gozado por várias gerações de estudantes santistas, excluídos pelos exames de admissão) como uma alternativa ao sorteio de vagas.
Felizmente, o panorama do ensino fundamental hoje em São Paulo é bem diferente. Não menos que 520 mil alunos foram matriculados nas escolas estaduais de suas preferências para cursar o segundo grau. Contudo, 83 mil candidatos escolheram determinadas escolas em que o número de vagas era menor que o de pretendentes, embora na rede das escolas estaduais na capital sobrassem 95 mil vagas.
Como, então, distribuir esses 83 mil alunos pelas escolas que ainda dispunham de vagas? Impondo a odiosa discriminação social e cultural dos vestibulinhos? Ou recorrendo ao impessoal e democrático sistema de sorteio para realocar esses 83 mil, ou 14% da clientela, entre as 95 mil vagas disponíveis? O governador Covas e a secretária Rose Neubauer encaram a educação pública com seriedade. Vejamos alguns fatos. A duração da aula passou a ser de 50 minutos corridos, com dez minutos para deslocamentos de alunos e/ou professores entre as salas de aula.
"Mas por que só agora?", perguntaria o leitor. Porque a nova carreira para o magistério, recentemente aprovada pela Assembléia Legislativa depois de amplamente discutida com a categoria, permite enorme racionalização de recursos físicos e materiais, sem reduzir a carga horária de ensino na sala de aula.
A carreira beneficia todos os profissionais do magistério, ativos e aposentados, incorpora gratificações aos seus salários-base e traz uma jornada de trabalho mais adequada. Os professores podem organizar melhor sua jornada; enxuga-se o número de aulas e, portanto, reduz-se de forma expressiva o número de professores não-habilitados, sem a capacitação necessária para o ensino.
Vale lembrar também que, nesta gestão, mais de 4,5 milhões de crianças passaram a ter cinco horas de aulas todos os dias -e não quatro horas, como antes. Isso equivale a ampliar em 25% o número de aulas ministradas da 1ª à 4ª série, ou a um ano a mais de escolaridade. E mais: a separação de crianças e adolescentes em prédios-escolas diferentes produziu um enorme ganho de eficiência.
Foi com as escolas reorganizadas e a grande quantidade de materiais pedagógicos adquiridos com os recursos enviados pelo governo que aconteceu a criação das salas-ambiente, com ganhos pedagógicos significativos, particularmente no ensino de ciências, história e geografia.
Quanto aos professores, há que ressaltar que nenhum deles em São Paulo recebe hoje menos do que 5,4 salários mínimos por 40 horas semanais de trabalho e que os salários médios dos educadores paulistas registraram aumentos de até 81,57%, descontada a inflação do período. Mais: o governo do Estado proporcionou cursos de capacitação em serviço a 75 mil professores da rede, ministrados por universidades e instituições de alto nível.
Com uma escola atraente e eficiente, nada mais justo do que esperar a redução da evasão escolar e o aumento nas taxas de aprovação dos alunos de nossas escolas públicas estaduais. De fato, com 83,8% de índice de aprovação e 7,6% de índice de evasão no ensino fundamental, São Paulo tem hoje os melhores indicadores das últimas décadas na rede pública. E 95% das crianças e jovens de 7 a 14 anos do Estado frequentam escola -o mais alto índice do país.


Iberê Z. Bandeira de Mello, 58, advogado, foi secretário de Negócios Extraordinários da Prefeitura de São Paulo (gestão Mário Covas) e membro do Conselho Estadual e Federal da OAB.



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