São Paulo, sexta, 20 de março de 1998

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LUÍS NASSIF
O relatório McKinsey e a economia

O relatório McKinsey sobre produtividade na indústria brasileira pode se constituir em marco na história econômica do país. Levará tempo para que todas as conclusões possam ser assimiladas. Mas, pela primeira vez, dá-se conteúdo científico a fenômenos que vinham sendo apontados por analistas mais ligados à observação da realidade.
Há três conclusões do relatório -antecipados na última "Veja"--, que corroboram a visão desses analistas que conseguiram escapar da armadilha do macro-economismo:
* Apenas com a reorganização dos métodos de trabalho, a produtividade poderá aumentar em 34%. É a constatação científica dos avanços proporcionados por programas de qualidade total.
* A redução do custo dos equipamentos e do dinheiro permitirá, por si, um salto equivalente a 4% do PIB nos investimentos. Na semana passada a própria Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) da Universidade de São Paulo terminou trabalho demonstrando que a desoneração de impostos na exportação na média equivaleria a uma desvalorização cambial da ordem de 17%.
* O baixo nível de escolaridade dos trabalhadores brasileiros não é empecilho para o desenvolvimento. A Xerox do Brasil conquistou prêmio internacional de qualidade no atendimento ao consumidor através de um programa onde os trabalhadores atendiam a todas as dúvidas apresentadas pelos clientes sem recorrer a um manual sequer -apenas se informando sobre os problemas junto aos respectivos setores.
Avanço no software
Em suma, o relatório demonstra que grande parte de avanços de produtividade, na maioria dos setores, depende apenas de "software" -melhores processos gerenciais, programas de qualidade, treinamento dos trabalhadores, capacidade de se relacionar na cadeia produtiva, assim como redução do custo Brasil.
Em geral a análise macro-econômica convencional associa a capacidade de crescimento de uma economia apenas ao nível de investimento em ativos fixos.
Em 1995 a indústria calçadista tanto de Birigui quanto de Franca estavam quebradas. Em 1997, Birigui saía do buraco e Franca não. A diferença entre ambos não está nos investimentos, mas em um trabalho desenvolvido em Birigui, entre cerca de trinta empresas, procurando formas de atuação em comum, implantando programas de qualidade, buscando a cooperação dos fornecedores e de organizações empresariais (como o Sebrae) para avançar no mercado externo.
Em dez anos a Itália passou de economia em crise para economia dinâmica. Pelos índices macro-econômicos convencionais (investimento/PIB, investimento em pesquisa e desenvolvimento etc.) seria um fracasso. Venceu por conta desse associativismo objetivo e da criação de um ambiente cultural favorável à inovação empresarial.
No lado oposto, a vigorar os conceitos clássicos de macro-economia, a Coréia era para ser a mais competitiva economia do planeta, graças aos seus níveis de investimento. E, no entanto, embora trazendo desenvolvimento, acabou resultando em um super-investimento que precipitou a própria crise coreana.
Não significa que se devam negligenciar os investimentos nem a educação, nem se esmorercer na luta pela redução desse nível estúpido de taxas de juros. Significa que, para efeito da análise macro-econômica, há que se considerar novos insumos na economia mundial, tão importantes quanto o nível físico de investimentos.
Economia e ciência
Da coluna de 17 de dezembro passado: "A renovação da análise econômica nacional vai passar pela capacidade dos jovens economistas fugirem dos manuais, reaprenderem a pensar de maneira sistêmica e a trabalhar realidades complexas. Ampliar o escopo de conhecimento, trafegar pela micro-economia, pelas novas técnicas gerenciais, pelas realidades regionais e setoriais, pelos mercados financeiro e monetário, pela política e pela análise psico-social não é dispersão de esforços: é condição essencial para entender a economia e fazer, de fato, ciência".

E-mail: lnassif@uol.com.br



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