São Paulo, quarta, 20 de maio de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF
A Microsoft e o Brasil

Envolta em problemas com o governo americano -acusada de práticas monopolistas-, nos próximos dias a atuação da Microsoft no Brasil deverá ser objeto, pela primeira vez, de análise sobre presumíveis abusos de poder econômico.
O processo foi deflagrado por uma pequena e premiada empresa mineira, a Paiva Piovesan E&I, criadora do software "Finance para Windows", de gerenciamento financeiro, adaptado a "home bankings". Considerado um dos 15 melhores softwares nacionais na Fenasoft-97, premiado pela revista "Informática Exame", o software se viu preterido em algumas grandes compras bancárias, pela estratégia da Microsoft de venda casada do "Money", seu gerenciador financeiro.
Na verdade, essas práticas já vinham afetando há tempos empresas brasileiras. O Brasil tinha uma boa tradição de editores de texto, e algumas tentativas em bancos de dados, que acabaram eliminados do mercado não só pela alta qualidade dos produtos Microsoft, mas pelo sistema de vendas casadas, a preços ínfimos.
A argumentação da Piovesan passa por aí. Em março a empresa entrou com uma representação junto à Secretaria de Direito Econômico, relacionando as seguintes práticas da Microsoft:
1) inclusão gratuita do "Money" em um pacote denominado "Microsoft Office for Small Business", indicando que o mesmo se repetiria com o "Microsoft Office", que detém mais de 90% de "market share" no mercado brasileiro;
2) a aquisição e distribuição de cópias gratuitas por bancos brasileiros para seus clientes;
3) dificuldade de colocar seu produto para ser distribuído pelas grandes distribuidoras nacionais.
A Microsoft terá 15 dias para apresentar sua defesa. Inocente ou culpada, o episódio abre um precedente importante para se discutir a questão do abuso de poder econômico na área de software e o espaço reservado à criação brasileira entre esses produtos estandartizados. Mas sem perder de vista os interesses maiores dos consumidores.
E agora?
Na coluna do dia 8 de março, com base em carta enviada pelo leitor Arnaldo Luís Santos Pereira -um engenheiro civil, como tantos outros que estavam disponíveis para serem consultados pela imprensa-, alertei que a responsabilidade penal pela queda do edifício Palace 2 poderia ter sido do projetista, e não da construtora. Explicava o leitor: "Como a análise do projeto estrutural baseia-se em elementos eminentemente objetivos (plantas, memórias de cálculo e demais peças do projeto), é muito difícil, se não impossível, que um projetista seja responsabilizado indevidamente".
Na revista "Imprensa" de março, voltei a alertar: "Se a culpa é do calculista, muda completamente o espectro de responsabilidades. Em qualquer hipótese, a responsabilidade civil, pela indenização, é da construtora, que contratou a todos. No plano criminal, é do calculista (...) O deputado Naya continuará culpado das picaretagens, do tráfico de influência, de burla ao Código de Defesa do Consumidor, da indenização às vítimas, mas deixará de ser responsável criminalmente pela queda do Palace 2".
Ontem, a divulgação do laudo do Instituto Carlos Éboli confirmou que o Palace 2 desabou por falha no cálculo estrutural. Criminalistas consultados pelo jornal informam que, confirmada a hipótese do laudo, Naya continua responsável pelas indenizações às vítimas. Mas se livra das acusações penais.
Condenam-se antecipadamente os réus, sem uma análise mais técnica dos problemas, porque o que vale é o show. Com a análise técnica, descobre-se que os réus ou são inocentes ou (como o caso Naya) passíveis de outras condenações, mas não da prisão. E o Judiciário acaba pagando o pato pela falta de uma cobertura técnica e de qualidade.
BMD e Proer
Há duas situações complicadas no caso da quebra do Banco Mercantil de Descontos (BMD). A primeira é que o banco foi atingido duramente por uma corrida de depositantes, no ano passado, devido a uma declaração impensada de um funcionário do Banco Central. Se a situação do banco era boa, o BC pode ser processado pelos controladores por tê-lo induzido à quebra. Se era ruim, pode ser processado pelos correntistas, por permitir que se deteriorasse mais ainda, apanhando os pequenos no contrapé.

E-mail: lnassif@uol.com.br



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.