São Paulo, terça-feira, 20 de agosto de 2002

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LUÍS NASSIF

A lógica da Embratel

Nos últimos dias descrevi duas visões de uma mesma questão: a gestão da Embratel. A análise de seus balanços mostra um aumento expressivo das despesas operacionais e uma dependência perigosa das ligações de longa distância. A tal ponto que a empresa ingressou na Justiça para impedir a entrada dos concorrentes fixos cuja concorrência poderia destruir a Embratel em seis meses -segundo declarações de um alto dirigente.
Na primeira coluna atribuí os resultados a erros de gestão e de estratégia. Na segunda coluna mostrei os argumentos da Embratel, sustentando que os problemas não foram de gestão, mas se deveram exclusivamente a práticas anticoncorrenciais das operadoras fixas e à competição predatória da Intelig, sua "empresa-espelho". Do lado das operadoras fixas, os principais problemas teriam sido a entrega de cadastros bichados de seus clientes e a cobrança de preços abusivos no "co-billings" (cobrança conjunta) e da interconexão. Do lado da Intelig, uma competição irracional. Por conta disso, diz a Embratel, aumentou muito a inadimplência e, em decorrência dela, os custos operacionais para cobrança, além dos pesados investimentos em publicidade.
A história da Embratel lembra a do caçador despreparado. Se está na selva e encontra um leão, de duas uma: se tem armas adequadas, enfrenta o leão; se não tem, foge. O que a Embratel preferiu foi se deixar devorar, para, depois, atribuir a culpa ao leão.
Existem leões nessa selva, mas qualquer planejamento estratégico competente supõe a clara identificação de riscos e oportunidades.
A Embratel tem duas linhas de atuação. Uma, as ligações de longa distância, um varejo que abarca empresas e pessoas físicas. Outra, o mercado corporativo, em que entram clientes pessoa jurídica, "backbones" para internet etc. No mercado corporativo a Embratel reina absoluta, graças à herança de seu período de estatal e à manutenção da excelência de seus serviços.
Já no mercado de longa distância, a história é outra. Sua diretoria diz que a empresa é operacionalmente eficiente, que o estouro dos custos operacionais se deveu aos problemas enfrentados na longa distância. Não fosse a explosão da inadimplência, dos investimentos em marketing e da estrutura da cobrança dos inadimplentes (tudo na longa distância), seus indicadores seriam similares aos das demais companhias. Além disso, confessa que, quatro anos depois da privatização, a empresa ainda não possui um cadastro confiável de clientes.
Há tempos havia sinais nítidos de crise mundial das operadoras de longa distância. É quase impossível a elas sustentar competição com as operadoras fixas, que têm o acesso direto ao cliente. Além disso, é um setor que exige pesados investimentos em marketing, já que é muito mais fácil ao usuário trocar sua operadora de longa distância do que sua operadora fixa. E essa facilidade levou a quedas sucessivas de margem, para não perder mercado. Escreve o leitor Sérvio Túlio Prado: "Uma ligação Nova York-Chicago de três minutos, antes da revolução digital, custava US$ 5,45. Hoje, por volta de US$ 0,05, podendo ser encontrada gratuita. O negócio atual da empresa está desaparecendo. Como ela não procurou se diversificar?".
Em vez de reforçar e ampliar sua posição onde era evidente sua vantagem corporativa, a Embratel optou por segurar com unhas e dentes sua posição em um mercado sem futuro, quando o correto seria identificar antecipadamente esses problemas e tratar de reduzir a dependência da longa distância, reforçando e agregando valor aos produtos corporativos.
Se a culpa pelos problemas da Embratel é ou não das operadoras fixas, pouco importa. Briga-se com elas enquanto se reduzem as vulnerabilidades. Nada foi feito. Agora, a sobrevivência da empresa está nas mãos de seus advogados.

E-mail - LNassif@uol.com.br


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