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OPINIÃO ECONÔMICA
O paradoxo da concorrência no gás natural
GESNER OLIVEIRA
O governo federal adiou
mais uma vez a definição
das regras e da situação das agências reguladoras para os segmentos de infra-estrutura. Enquanto
se procrastinam pontos essenciais
para o investimento, o projeto de
reforma tributária vai de vento
em popa, apesar de suas inúmeras distorções em prejuízo do emprego e da produção.
O sistema federativo dá pelo
menos autonomia no plano estadual para várias áreas importantes, como é o caso do gás natural,
regulado em São Paulo pela CSPE
(Comissão de Serviços Públicos de
Energia). A CSPE realizou nesta
semana audiência pública para
definir a revisão das tarifas previstas nos contratos de concessão.
Em contraste com o debate no
plano federal, não há questões
existenciais acerca da absoluta
necessidade das agências reguladoras e de regras estáveis para a
inversão produtiva. Nunca se cogitaram, por exemplo, idéias absurdas como a de extinção das
agências.
A CSPE reúne, por sua vez, alguns atributos mínimos necessários para exercer seu papel de regulador do mercado. Diferentemente daquilo que ocorreu no setor elétrico na administração passada, a criação da CSPE e a instituição do Programa Estadual de
Desestatização precederam a
venda da Comgás (Companhia
de Gás de São Paulo).
Na audiência pública realizada
pela CSPE, a discussão aberta e
preponderantemente técnica contrastou com a balbúrdia gerada
na discussão dos indexadores das
tarifas de telefonia no plano federal em virtude da interferência do
Ministério das Comunicações.
A experiência internacional, especialmente a dos EUA, tem revelado que o mecanismo da audiência pública, quando bem conduzido, pode ser um instrumento
útil de debate e entendimento pela opinião pública das complexas
questões envolvidas na regulação
da infra-estrutura.
A definição da tarifa do gás natural, por exemplo, requer critério
e consistência com o processo de
privatização. Uma vez realizadas
as inversões necessárias para a
expansão do setor, não pode haver um súbito descolamento entre
a fixação da tarifa e o preço mínimo definido para a privatização
atualizado pela correção monetária e com os devidos ajustes para
a depreciação e novos investimentos realizados. A previsibilidade e a consistência ao longo do
tempo da regulação constituem o
mecanismo mais eficaz para expandir a capacidade produtiva.
E é exatamente isso o que o setor de gás natural precisa. O gás
natural ainda representa muito
pouco da matriz energética. Segundo a Petrobras, a participação
do gás natural na matriz energética nacional é de cerca de 3%. A
energia elétrica e o petróleo e derivados respondem por 41% e
36%, respectivamente.
Há muito que se fala em uma
expectativa de que a utilização do
gás cresça para um patamar de
12% em 2010. No mundo, tal participação é de 19%, esperando-se
25% em 2010. Na Argentina e nos
EUA, esses percentuais chegam a
47% e 24%, respectivamente.
A descoberta recente pela Petrobras de uma reserva de 419 bilhões de metros cúbicos de gás natural na bacia de Santos comprova, de uma vez por todas, o potencial do setor. Trata-se de reserva
maior do que a soma das reservas
de gás natural conhecidas pela
ANP (Agência Nacional do Petróleo), de 236 bilhões de metros cúbicos. Segundo dados do Ministério de Minas e Energia, a exploração dessa reserva poderia gerar
uma produção diária de 42 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia, mais do que os 30
milhões de metros cúbicos que o
Brasil pode importar diariamente
da Bolívia.
Segmentos ainda incipientes como o de gás natural e que precisam se expandir requerem uma
visão francamente pró-investimento por parte do regulador. A
imposição de controles muito estritos, supostamente em nome da
concorrência e do consumidor,
terminam por comprometer a
constituição de uma rede ampla
que acentue a competição do gás
com outros energéticos como o
óleo combustível. Por sua vez e
paradoxalmente, é a ausência
dessa rede capilarizada o principal obstáculo para que se obtenham os benefícios da concorrência.
Gesner Oliveira, 47, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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