São Paulo, quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O que fazer?


O Brasil não está condenado a recair no desequilíbrio externo e a conviver com um câmbio sobrevalorizado


OS LEITORES são, às vezes, implacáveis. Um deles foi impiedoso com o meu pobre e humilde artigo da quinta-feira passada. Reclamou que as advertências sobre câmbio e desequilíbrio externo não vêm acompanhadas de soluções. Espírito eminentemente prático, pediu propostas concretas e urgentes. Prometi atendê-lo e estou aqui tentando cumprir a promessa.
Alguns analistas de mercado (bancos e outros) apontam para um desequilíbrio externo em conta corrente da ordem de US$ 60 bilhões em 2010, o que representaria mais de 3% do PIB. Isso não é desejável, pois tornaria o Brasil mais dependente dos humores e das flutuações imprevisíveis, às vezes dramáticas, do mercado financeiro internacional. O aumento do nosso desequilíbrio externo reflete basicamente a combinação de uma taxa de câmbio muito valorizada com a rápida recuperação da economia brasileira desde 2009.
O que fazer? Eis a questão. Comecemos pelo ritmo de crescimento do PIB, que afeta pesadamente a demanda por importações de bens e serviços. Um crescimento de cerca de 5,5% a 6% do PIB parece uma meta aceitável para a economia brasileira em 2010 e 2011.
Suponhamos, entretanto, que a economia aponte para uma expansão maior, de 6,5%, 7% ou mesmo 8%. Não parece prudente crescer tão rapidamente. Haveria pressões sobre a inflação. E o desequilíbrio externo seria provavelmente bem maior do que os 3% do PIB acima mencionados. Nesse caso, seria recomendável segurar a expansão da economia.
O instrumento mais simples, e também o mais grosseiro, é a taxa de juro. Um aumento dos juros básicos pelo Banco Central tenderia a produzir o efeito desejado, mas a um preço bastante considerável. Primeiro porque aumentaria o desequilíbrio das contas publicas ao encarecer o custo da divida governamental.
Segundo -e mais importante no contexto dessa discussão- porque acentuaria a valorização do real, tanto mais que não há sinais de que os principais bancos centrais do mundo aumentarão os juros no horizonte visível.
Melhor seria apertar a política fiscal e segurar a expansão do crédito. Restringir gastos e desativar gradualmente a política fiscal anticíclica de 2009 seria uma forma de diminuir o crescimento da demanda sem acentuar tanto a pressão sobre o câmbio. Outra forma seria conter a oferta de crédito, que se alimenta em parte dos influxos de capital externo.
Conter o ingresso de capital estrangeiro e restringir as operações financeiras externas (inclusive com derivativos) mataria dois coelhos com uma só cajadada: a) moderaria os efeitos de um dos canais de expansão do crédito e da demanda; e b) contribuiria para aliviar a pressão altista sobre o real ao reduzir a oferta de moeda estrangeira.
Uma outra maneira de evitar a valorização do real é acumular mais reservas internacionais. O governo absorve um eventual excesso de oferta de moeda estrangeira e impede assim a valorização da moeda nacional. A criação do Fundo Soberano deve ajudar a executar essa política de compra de reservas com mais vigor.
Em síntese, o Brasil não está condenado a recair no desequilíbrio externo e a conviver com um câmbio perigosamente sobrevalorizado. Pode e deve agir agora para impedir que o problema continue se agravando.

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 54, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É diretor-executivo no FMI, onde representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago), mas expressa seus pontos de vista em caráter pessoal.

pnbjr@attglobal.net


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