São Paulo, domingo, 21 de abril de 2002

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ANÁLISE/ARGENTINA

Controle de capitais não garante o peso

CHRISTOPHER SWANN
DO "FINANCIAL TIMES"

Controles de capital, há muito considerados anátema pelas autoridades e financistas, recentemente adquiriram pelo menos ares de respeitabilidade.
O aparente sucesso dos controles impostos pela Malásia e pelo Chile significou que a introdução de restrições ao movimento de capitais na Argentina não redundou nos uivos de desaprovação que seriam de esperar até o passado recente.
Mas a história das restrições ao movimento de capitais sugere que é provável que elas funcionem apenas sob certas circunstâncias, e mesmo assim a um preço. Infelizmente, faltam muitos desses requisitos à Argentina.
O principal objetivo dos controles de capital, depois da crise asiática de 1997, vinha sendo proteger uma moeda vulnerável por meio de uma limitação à capacidade das instituições financeiras e cidadãos para vendê-la nos mercados de câmbio. Porque os controles restringem artificialmente a demanda por divisas fortes, em geral dólares, eles criam um forte incentivo para trapacear o sistema.
Por exemplo, se os exportadores forem forçados a vender os dólares que recebem imediatamente ao banco central, podem optar por subfaturar suas vendas, fingindo que elas foram menores do que na realidade, a fim de reter preciosos dólares.

Reservas
Em todos os países, excetuados os mais draconianos, esse tipo de problema é inevitável e, como resultado, o sistema só se sustenta quando apoiado por reservas cambiais substanciais detidas pelo banco central.
As reservas cambiais argentinas parecem inadequadas, dada a atual demanda insaciável por dólares. De um pico de US$ 28,5 bilhões em 2000, as reservas estão agora abaixo dos US$ 13 bilhões. Isso é muito menos do que a massa total de depósitos bancários no país, equivalente a US$ 75 bilhões.
Uma preocupação de prazo um pouco mais longo para um país que esteja introduzindo controles de câmbio é o seu índice de poupança. Quando é difícil tirar dinheiro de um país, os investidores previsivelmente hesitam em colocá-lo lá. Faminta de capital estrangeiro, a economia acaba crescendo mais devagar.
Um estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI) realizado em 1998 concluiu que "se um governo decide usar controles de capital para reduzir a instabilidade, o preço é algum crescimento".
As exceções a essa regra são países capazes de financiar seus investimentos com base em sua poupança interna. O alto índice de poupança da Malásia, que se manteve em torno dos 40% do PIB (Produto Interno Bruto), significa que o país dependia menos de fundos externos quando introduziu seus controles de capital, em setembro de 1998.
Uma vez mais, a Argentina não tem como alegar situação semelhante. Os números mais recentes sugerem que o índice de poupança do país agora equivale a cerca de 20% do PIB.

Tipo de controles
A outra diferença entre Malásia e Chile, de um lado, e a Argentina, do outro, está na maneira pela qual os controles foram implementados. Na Argentina, o processo foi quase aleatório.
"Os controles de capital foram impostos de maneira improvisada, em reações imediatas, como buracos que iam sendo tapados quando se tornavam óbvios, mas sem um plano geral", disse Marcel Casard, economista especializado em mercados emergentes no Deutsche Bank de Londres.
Embora os economistas ainda estejam discutindo até que ponto os controles foram eficientes no Chile e na Malásia, a maior parte deles concorda em que foram eficientes e racionais.
Em ambos os casos, o objetivo era tanto reduzir a entrada do chamado "hot money" (capital de curto prazo que migra entre mercados com rapidez) quanto impedir a saída do capital já presente no país.

Exemplos de sucesso
Regras introduzidas em fevereiro de 1999 na Malásia controlaram o fluxo prevendo que os lucros repatriados dentro de um ano seriam tributados em 30% e que o imposto sobre eles cairia para 10% depois de um ano.
Desde 1991, o Chile força as instituições dispostas a investir no país a colocar fundos em contas que não pagam juros o chamado requerimento de reserva não remunerada, o que eleva o custo da especulação de curto prazo.
Medidas preventivas como essas são consideradas mais capazes de sucesso do que medidas de emergência improvisadas, porque elas afetam a composição do capital externo investido no país.
O elemento crucial de que a Argentina ainda carece, no entanto, é a confiança do mercado internacional numa eventual estabilização do peso.
"Quando os malásios introduziram os controles de capital, em setembro de 1998, havia um sentimento de que o ringitt já encerrara sua queda", diz David Lubin, estrategista de mercados emergentes no banco HSBC.
Poucos especialistas da área poderiam alegar que essa situação já foi atingida na Argentina.
Os controles de capital se tornaram mais aceitos como um expediente para proteger uma moeda em momentos de emergência.
No entanto, dadas as condições na Argentina, parece improvável que os controles lá adotados sejam capazes de proteger o peso por muito tempo.


Tradução de Paulo Migliacci


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