São Paulo, terça-feira, 21 de abril de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BENJAMIN STEINBRUCH

Inconfidência dos números


Os indicadores divergentes podem ser o sinal da chegada da estabilidade da economia mundial

NO DIA em que são lembrados os 217 anos do esmagamento da Inconfidência Mineira, movimento que levou Tiradentes à forca e o transformou em mártir da Independência brasileira, vale fazer reflexões sobre a inconfidência dos números da economia em meio à crise.
De um lado, a menor oscilação dos mercados e as altas nas Bolsas de Valores pelo mundo, além de aumentos de produção e vendas em alguns setores, passam a sensação de que já vivemos um momento de recuperação. De outro, dados vindos principalmente dos Estados Unidos e Europa deixam a impressão de que o pior momento da crise ainda não chegou.
Vamos alinhar cinco notícias positivas e cinco negativas sobre a conjuntura local e mundial.
As positivas:
1) a economia brasileira criou 34 mil empregos formais em março. Foi o segundo mês seguido com aumento de vagas, embora isso não tenha sido suficiente para compensar as perdas de janeiro. As vendas no varejo aumentaram 3,8% em 12 meses;
2) os investidores estrangeiros estão de volta comprando ações na Bolsa brasileira, onde movimentam cerca de 40% dos negócios;
3) a indústria da China cresceu 8,3% em março, número que surpreendeu os analistas. No primeiro trimestre, o PIB chinês avançou apenas 6,1%. Mas a demanda está aquecida em abril;
4) alguns bancos americanos já divulgaram balanços com lucros surpreendentes no primeiro trimestre, entre eles o Wells Fargo (US$ 3 bilhões), o Goldman Sachs (US$ 1,66 bilhão), o JPMorgan (US$ 2,1 bilhões) e o Citi (US$ 1,6 bilhão);
5) o setor siderúrgico, um bom indicador do nível geral da economia, aumentou a produção no Brasil em março, embora o nível de atividade continue 40% abaixo do verificado no mesmo período do ano passado.
As negativas:
1) o índice de preços ao produtor nos EUA caiu 1,2% em março. É a deflação em marcha, movimento que segura a demanda, porque os consumidores esperam para comprar no futuro, na expectativa da queda de preços. O Japão foi duramente atingido por esse fenômeno nos anos 90;
2) a produção industrial caiu 1,5% em março nos EUA. Foi o sexto mês consecutivo de recuo. Apenas 69,3% da capacidade de produção da indústria americana está sendo usada, o menor índice em 40 anos;
3) também nos EUA, as vendas no varejo tiveram uma inesperada queda de 1,1% em março;
4) o PIB da Alemanha, maior economia da Europa, deve cair 5% neste ano, segundo previsão do FMI. O Reino Unido, ameaçado por recessão e desemprego e com um déficit fiscal de 11% do PIB, pode pedir socorro ao Fundo;
5) no Brasil, a arrecadação de impostos caiu 10% no primeiro trimestre, o que denota forte desaceleração.
Os cenários, portanto, são divergentes. Em qual deles acreditar? Talvez seja melhor dar crédito a ambos. A economia mundial passa por um momento em que não há tendências firmes, mas também não existe mais a enorme volatilidade de meses atrás. Os indicadores divergentes podem ser o sinal da chegada da estabilidade da economia. E, como lembrou Ben Bernanke, presidente do Fed, a estabilização da atividade é o primeiro passo para a recuperação. Pelo menos essa é a sensação que a inconfidência dos números nos passa neste dia de Tiradentes.


BENJAMIN STEINBRUCH , 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


Texto Anterior: Focus: Mercado eleva previsão de queda no PIB neste ano para 0,49%
Próximo Texto: CGU abre processo para investigar terceirizadas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.