São Paulo, sexta-feira, 21 de junho de 2002

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MERCADO EM TRANSE

País precisa de mais dinheiro do FMI, diz Eris

GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S.A.

O economista Ibrahim Eris, 57, ex-presidente do Banco Central e sócio da corretora Linear, acha que o Brasil terá que pedir mais dinheiro ao FMI (Fundo Monetário Internacional) para enfrentar as turbulências do mercado. Segundo ele, a diferença da atual crise para as outras é que, desta vez, a solução não depende de saídas macroeconômicas, e sim do quadro político. Pessimista, Eris disse que foi uma "piada" a decisão do Banco Central de adotar um viés de baixa para os juros básicos da economia. "Não há a menor condição de baixar os juros agora", afirmou.

Folha - O que provocou o terremoto de hoje [ontem"?
Ibrahim Eris -
Na verdade, o que aconteceu hoje [ontem" foi continuação de ontem [quarta-feira", anteontem [terça-feira" etc. Não aconteceu nada de novo. Nós já convivemos com esse clima de tensão há alguns dias, para não dizer algumas semanas. Na medida em que o tempo passa, a tensão só tende a crescer, a menos que o quadro eleitoral caminhe na direção em que o mercado julgue mais confiável.

Folha - O que o governo pode fazer para acalmar o mercado?
Eris -
O grande problema é que, diante das expectativas que se estabeleceram lá fora sobre o quadro político e econômico do Brasil, ficou muito difícil rolar as dívidas que vencem até o final do ano. Com o risco-país a 1.500 pontos, o lançamento de papéis fica totalmente prejudicado. Logo, começam a haver dúvidas se há disponibilidade de dólares suficiente na economia brasileira. Foi exatamente por isso que o Banco Central precisou se calçar de mais recursos do FMI. Pode ser até necessário, eventualmente, que o Brasil precise novamente recorrer ao FMI. Para ser honesto, será necessário que o país recorra ao FMI.

Folha - Mas, além do dinheiro do FMI, o que pode ser feito para combater a crise?
Eris -
A natureza da crise que vivemos hoje é um pouco diferente das outras. Nos outros casos, era uma questão de achar a política macroeconômica correta para superar a crise. Hoje, infelizmente, os riscos estão fora do controle do Banco Central. Não se trata de uma questão de o que o Banco Central deva ou não fazer, e sim do risco político eleitoral. É como se tivesse um doente com problemas de saúde que estava sob cuidados de uma determinada equipe médica que gozava da confiança de todo mundo. De repente, surge a notícia que a equipe vai mudar e logo começa a ser discutida a competência da nova equipe. Nunca ninguém achou que o Brasil não tivesse problemas. O governo exagerava quando dizia que os fundamentos estavam muito bem, o Brasil sempre teve problemas de balança de pagamentos, mas todo mundo achava que a equipe econômica do governo caminhava para uma eventual solução de longuíssimo prazo. Agora, quando você olha a natureza dos problemas com outros olhos, se a próxima equipe errar, quanto tempo de vida terá esse paciente?

Folha - Mas o que precipitou o nervosismo do mercado? A economia ou as incertezas políticas?
Eris -
Não se trata de saber se a questão está nos fundamentos ou nas incertezas do quadro político. Está nas duas coisas. É como se um levasse a gasolina e outro o fogo. De quem é a culpa? Se não tivesse a gasolina, o fogo não faria o serviço. Se os fundamentos da economia estivessem arrumados, o quadro político não faria tanta diferença.

Folha - O incêndio já começou?
Eris -
Eu tenho uma visão preocupante sobre a situação. Eu acho que esse quadro só consegue se inverter se houver uma melhora na pesquisa dos candidatos que os agentes econômicos julguem "confiáveis".

Folha - Quem o sr. julga "confiável"?
Eris -
Não se trata de uma questão de nomes. Não é o candidato do meu gosto, ou do seu gosto, e sim do gosto do mercado.

Folha - O candidato do gosto do mercado não seria o José Serra?
Eris -
O Serra é um exemplo, mas eu não quero entrar no debate se uma subida do candidato x, y ou z poderia acalmar o mercado. Tem uma série de coisas que até mesmo um candidato de oposição poderia fazer para tranquilizar o mercado. Se o candidato de oposição se comprometer em manter os contratos firmados pelo governo e manifestar preocupação com política fiscal, isso certamente ajudaria a acalmar o mercado. Com isso, não quero dizer que o candidato tenha que seguir a política fiscal do Fernando Henrique, que a meu ver não foi nada brilhante, mas certamente a disciplina fiscal é uma preocupação que se aplica a todos os candidatos.

Folha - O Brasil corre o risco de virar uma Argentina?
Eris -
Essa comparação do Brasil com a Argentina é ridícula. A natureza dos problemas dos dois países é muito distinta. O problema da Argentina foi a adoção de uma política cambial ridícula e completamente diferente da do Brasil. A Argentina nunca teve moeda e o Brasil sempre teve moeda. O Brasil nunca adotou o dólar como moeda.



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