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São Paulo, sábado, 21 de junho de 2003

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POUCO CRÉDITO

Depois do FMI, Tesouro americano diz que sistema brasileiro não financia investimento e crescimento

EUA criticam eficiência de bancos no Brasil

SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

Um dia após o FMI (Fundo Monetário Internacional) divulgar documento em que afirma ser o setor bancário do Brasil muito concentrado e pouco eficiente, os bancos brasileiros voltaram a ser alvo de críticas, desta vez do subsecretário do Tesouro americano, Randal Quarles.
Em discurso diante de empresários americanos e brasileiros, reunidos na quinta-feira à noite na Câmara de Comércio dos Estados Unidos, em Washington, Quarles disse que "a intermediação financeira doméstica não tem exercido o papel que deveria, de financiar o investimento e o crescimento".
Segundo dados do estudo do FMI, reafirmados por Quarles em seu pronunciamento aos empresários dos dois países, a intermediação bancária deveria ser o cerne da atividade do setor no Brasil. Por meio dela, os bancos captam recursos no mercado e os direcionam a empréstimos. No Brasil, porém, os bancos têm mais recursos aplicados em títulos do governo do que destinados a operações de crédito, disse Quarles.
O subsecretário afirmou que os 20 maiores bancos brasileiros têm um quarto dos seus recursos aplicados em títulos da dívida pública. É o mesmo dado apresentado no estudo do FMI.
A reunião na Câmara Americana foi motivada pela visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Washington.

Afinação
O subsecretário do Tesouro adotou o tom e os números do documento escrito pela técnica do FMI, Agnès Belaisch, divulgado na quarta-feira à noite, repetindo críticas feitas por ela ao sistema bancário no Brasil.
"Embora os bancos brasileiros tenham um total de ativos três vezes maior do que os bancos mexicanos, eles oferecem, anualmente, o mesmo montante de crédito."
Quarles só não esclareceu, como fez Belaisch, que a comparação entre os dois países diz respeito ao total de crédito em relação ao PIB (Produto Interno Bruto). Enquanto no Brasil o volume de crédito corresponde a 24% do PIB, no México ele é de 23%.
Em alguns momentos, porém, o discurso de Quarles foi mais ácido que o do FMI. Ele destacou que "ao baixo nível de empréstimos se acrescentam os altos custos da intermediação".
Segundo o subsecretário do Tesouro americano, "o crédito bancário continua sendo proibitivo para as empresas pequenas, médias e grandes. Os "spreads" praticados são de 56% nos financiamentos às pessoas e de 24% para as empresas, em comparação com "spreads" de 1% a 2% para as empresas nos Estados Unidos".
"Spread" é a diferença entre as taxas de juros que os bancos pagam ao captarem recursos no mercado e as que cobram nos empréstimos a clientes. É dessa "gordura" que saem seus lucros e o dinheiro para pagarem impostos e manterem seu custo operacional.

Impostos
Quarles fez coro ao FMI também ao criticar a baixa eficiência dos bancos brasileiros. "Os custos operacionais dos bancos brasileiros são o dobro da média encontrada nos demais países da América Latina, e o triplo da média dos países desenvolvidos."
O subsecretário destacou, porém, que parte dos pesados custos do sistema bancário brasileiro se deve aos impostos, que também são mais do que o dobro da média latino-americana.
Este seria, segundo sua opinião, um dos fatores macroeconômicos que interferem no crédito bancário no país. Outros fatores são pontos deficientes da legislação e da estrutura judicial, que acabam influenciando indiretamente as altas taxas de juros vigentes no país. "Os direitos do credor são fracos e as cortes demoram mais de cinco anos para decidir, sendo generosas às apelações", disse.
Outro aspecto enfatizado por Quarles -e que também consta do documento da técnica do FMI- é que os percentuais de depósito compulsório são muito altos, devido à necessidade de combater a inflação.
O Banco Central recolhe 60% dos depósitos à vista e 10% dos depósitos a prazo, o que acaba deixando poucos recursos disponíveis para crédito. Isso "torna necessário aos bancos cobrar altas taxas para o capital que é destinado a uso produtivo", disse.
Quarles ainda fez críticas à ineficiência dos bancos públicos. Segundo ele, essas instituições têm baixo retorno sobre o capital, alto nível de inadimplência e custos operacionais ainda mais altos que os dos bancos privados.

Progressos
Apesar da crítica aos bancos, o subsecretário elogiou os recentes progressos na economia brasileira e a melhora da confiança internacional no país. "Isso poderia representar o início de um círculo virtuoso, com uma taxa mais alta de crescimento econômico."
No entanto, destacou, a economia brasileira cresceu 1,5% no ano passado e a estimativa para este ano é um crescimento do PIB inferior a 2%. Essa taxa foi considerada "muito abaixo do potencial" do país. Uma das causas do baixo crescimento, segundo Quarles, é justamente o alto custo do crédito ao setor privado.



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