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ARTIGO
Outra contribuição social?
GASTÃO ALVES DE TOLEDO
Mais uma "contribuição social"
poderá ser imposta às empresas e
empregadores, caso a emenda
constitucional de reforma da Previdência Social venha a ser aprovada no Senado conforme está redigida.
Com efeito, o texto aprovado na
Câmara, oriundo do Executivo,
modifica o atual artigo 195 da
Constituição Federal, que trata das
fontes de custeio da seguridade social, acrescendo-lhe a palavra "receita", para justificar o advento de
nova contribuição.
Assim, ao lado do "faturamento", em que se baseiam, por exemplo, o Cofins e o PIS, inclui-se esse
termo de larga abrangência, como
se pode notar, alcançando, em
princípio, todo recebimento de
valores.
Consoante se depreende do texto
proposto, o empregador ou empresa (pessoa física ou jurídica,
portanto) que obtiver qualquer ingresso financeiro em função de
suas atividades (e de inúmeras situações decorrentes da lei societária e da relativa ao Imposto de
Renda) poderá, em tese, sujeitar-se a outra contribuição para a
seguridade social.
Ademais, o preceito deverá ser
regulado pelo legislador ordinário, que terá a faculdade de instituir várias modalidades impositivas sobre a mesma base constitucionalmente prevista, em razão de
sua amplitude conceitual, ensejando possivelmente novo conflito
doutrinário e jurisprudencial
acerca da respectiva tipificação,
nem sempre cuidadosamente inscrita na lei.
Trata-se de uma via aberta ao aumento dos recursos securitários,
cuja tendência expansionista é
preciso frear, estando clara a vocação oficial para encontrar fórmulas de extraí-los de toda a sociedade, especialmente da classe produtora, como se nenhuma consequência trouxessem aos custos gerais da economia e dessa maneira
se pudesse sempre amenizar a permanente e angustiante carência financeira da seguridade social.
Convém observar que a reforma
pretendida, alterando o custeio do
sistema, pela modificação do artigo 195 da Carta Federal e suprimindo algumas de suas distorções
e extravagâncias, não trará o efeito
duradouro que todos desejam,
porque não atinge precisamente o
cerne do atual modelo financeiro
do regime geral da Previdência Social, ao preservar o método de repartição de receitas, viciado por
sua irracionalidade econômica, já
tantas vezes demonstrada e cujo
falecimento se busca apenas postergar.
Sem dúvida, o relator da matéria
no Senado Federal vem introduzindo sensíveis aperfeiçoamentos
ao texto da Câmara, sobretudo
quanto à eliminação de privilégios
e de graves disparidades na esfera
pública, além da possibilidade de
se criarem fundos constituídos
por "bens, direitos e ativos de
qualquer natureza", pertencentes
a União, Estados e municípios, visando robustecer sua capacidade
de arcar com os compromissos
previdenciários.
Contudo, ainda desta vez não se
ousou modificar a estrutura do
INSS, eis que a forma de arrecadar
e pagar os benefícios continuará a
mesma, inexistindo por isso qualquer vínculo entre os que contribuem e os que recebem ou entre o
presente e o futuro. Permanece a
divisão dos recursos coletados
sem qualquer tipo de capitalização, única maneira de convertê-los em poupança individual dos
contribuintes, por eles mesmos
controlada para se precaverem
contra as incertezas da velhice.
Perde-se, assim, uma valiosa
oportunidade de redesenhar a Seguridade Social, para submeter os
recursos do setor privado, destinados à Previdência Social e administrados pelo INSS, ao regime de
capitalização, a exemplo dos fundos privados e do programa de
aposentadoria recentemente criado pelo governo federal, mediante
a instituição de um adequado órgão gestor, com regras apropriadas e claras, sob rigoroso plano
atuarial e severa fiscalização, também exercida pelos próprios interessados.
Como não se cuidou disso, a sociedade poderá ser novamente
chamada a "contribuir" para a sobrevida de um organismo cuja enfermidade se procura sempre remediar, como agora, pela inserção
de uma só palavra no texto da reforma, viabilizando o advento do
referido encargo.
Cabe ao Senado Federal atentar
para essa relevante questão, não
percebida pelos senhores deputados e constante do artigo 195, I, b
da proposta. Quando se pensa em
reduzir o chamado "custo Brasil",
não é admissível mais esse ônus à
atividade econômica, em flagrante
contradição com o discurso que
proclama a necessidade de reduzi-lo.
Gastão Alves de Toledo, 53, advogado, mestre
em direito constitucional pela PUC-SP, é membro do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e do Conselho Jurídico da Federação do
Comércio do Estado de São Paulo.
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