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São Paulo, domingo, 21 de setembro de 2003

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NA ATIVA

Com renda achatada, um terço dos pensionistas busca complementar orçamento, o que agrava situação do desemprego

No país, 4,5 mi de aposentados trabalham

CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Quatro milhões e meio de aposentados estão no mercado de trabalho em busca de renda para complementar sua aposentadoria. Esse número, que representa um terço do total de aposentados no país, deve crescer ainda mais nos próximos anos, segundo estudo da Secretaria de Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade da Prefeitura de São Paulo.
Os aposentados que trabalhavam em 1992 -2,8 milhões- representavam 4,3% do total de ocupados no país. Em 2001, esse percentual subiu para 6% -eles somavam 4,5 milhões.
A participação dos aposentados no total de ocupados deve chegar a 8,2% em 2010 -o que significa que 7,2 milhões de aposentados devem estar no mercado de trabalho, se mantidas as taxas de crescimento da população aposentada e de aposentados que trabalham verificadas no período.
A projeção foi feita com base em informações das Pnads (Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios) de 1992 e 2001 e de dados dos censos demográficos, ambos realizados pelo IBGE.
"A renda previdenciária é insuficiente para retirar do mercado quem se aposentou. De cada dez aposentados, sete ganham até dois salários mínimos. Com isso, a aposentadoria passa a ser um complemento, não a fonte principal de renda. Como o Brasil está envelhecendo, a situação tende a piorar", diz Marcio Pochmann, secretário municipal do Trabalho.
O problema, diz, é que a pressão desse contingente agrava a situação do desemprego no Brasil e expõe o empurra-empurra entre o sistema previdenciário e o mercado do trabalho. Ao voltarem à ativa para melhorar a renda, os aposentados ocupam vagas de pessoas que estão sem trabalho e que poderiam, se empregadas, contribuir para a Previdência Social.
Como as contribuições não aumentam, o caixa da Previdência é diretamente afetado. Isso faz com que os benefícios pagos continuem baixos, o que empurra o aposentado para o mercado.

Piso
"O debate que tem de ser feito é qual é o piso digno de sobrevivência para o aposentado", diz o secretário. "Na reforma da Previdência, fala-se em teto [a proposta que será votada no Senado prevê que o teto da aposentadoria passe de R$ 1.869,34 para R$ 2.400], mas qual é o valor ideal para que o aposentado viva dignamente?", indaga Pochmann.
Nas contas do Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas da Força Sindical, o piso deveria ser o previsto pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos) para o salário mínimo. Em agosto, deveria valer R$ 1.359,03 -ou seja, 5,66 vezes o vigente.
"O problema é que quem se aposentou com dez salários mínimos em 1994 recebe hoje apenas seis. A defasagem das aposentadorias varia de 36% a 52%", diz João Batista Inocentini, presidente do sindicato. "O aposentado não trabalha porque ele gosta, mas sim porque precisa comer."
Segundo Inocentini, pesquisa feita em 2000 com aposentados de São Paulo mostra que só 19% conseguiam comprar os medicamentos de que precisavam com o valor do benefício recebido. "Quase metade dos aposentados [48%] comprava parte dos remédios que precisava tomar, de acordo com estudo da Faculdade de Medicina da USP. E 33% nunca compravam, só tomavam remédio quando os conseguiam em postos de saúde. Por aí se vê qual é a situação do aposentado no Brasil."
Para o coordenador do Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas da CUT, Wilson Roberto Ribeiro, o aposentado volta ao mercado para garantir a renda da família no lugar do filho desempregado. "O filho perdeu o emprego e não consegue uma vaga. Como o pai aposentado acaba aceitando um salário menor, e isso representa menos custo para o empregador, ele fica na vaga no lugar de um desempregado."
O estudo da secretaria mostra que a aposentadoria representa, na média, 46% da renda total dos aposentados. De acordo com os dados de 2001, os aposentados que trabalhavam recebiam renda mensal de R$ 1.021,20 -sendo que R$ 549 correspondiam à renda do trabalho e R$ 472,20 à da aposentadoria. "Se não fosse o trabalho, os aposentados teriam queda de 54% na sua renda total."
Esse percentual varia de acordo com a ocupação do aposentado. Entre os que trabalham como empregadores, a aposentadoria representa 30% da renda total. No caso dos trabalhadores autônomos e dos trabalhadores domésticos, a aposentadoria representa cerca de metade da renda total.

Crescimento
Para o coordenador técnico do Dieese, Sérgio Mendonça, se houver crescimento econômico, a pressão de aposentados no mercado de trabalho pode diminuir. "Ao crescer, o país gera mais empregos. Com o aumento do emprego formal, que é a base de financiamento da Previdência, o caixa aumenta. E, com mais dinheiro em caixa, podem-se melhorar os valores pagos."
"É preciso que haja uma reengenharia urgente no sistema previdenciário, buscando novos recursos e fontes de custeio", diz Paulo Henrique Pastori, presidente da Comissão de Seguridade Social da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo.


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