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OPINIÃO ECONÔMICA
Capital humano
BENJAMIN STEINBRUCH
O ibge (Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística) é
uma das unanimidades nacionais. Todos o reconhecem como
instituição idônea, independente
e eficiente, apesar de ser controlada pelo governo.
Digo isso para comentar alguns
aspectos do excelente trabalho divulgado no mês passado pelo IBGE, de mais de 500 páginas, denominado "Estatísticas do Século
20", um retrato das transformações do país no século passado.
Ao folhear o trabalho, os brasileiros que torcem pelo Brasil tendem a enxergar mais as estatísticas positivas do século. E existem
muitas. Por exemplo, o Brasil foi o
país que apresentou a terceira
maior taxa de crescimento do PIB
do século, com expansão média
de 4,5% ao ano, índice só superado por Taiwan e Coréia do Sul. O
PIB brasileiro aumentou 110 vezes de 1901 a 2000. A expectativa
de vida teve uma transformação
impressionante. Quem nascia em
1900 tinha esperança de viver somente até os 33,6 anos. No fim do
século, essa expectativa havia aumentado para 68,2 anos. A mortalidade infantil diminuiu drasticamente. Em cada mil crianças
nascidas vivas, 162 morriam antes de completar um ano no início
do século. Esse número caiu para
29,6 em 2000.
Na educação, os avanços também foram importantes. É difícil
acreditar que em 1900 cerca de
65% da população brasileira com
mais de 15 anos era analfabeta.
Em 2001, o índice havia caído para 13%. Esse nível ainda não é o
ideal, porque nos países desenvolvidos o analfabetismo está praticamente extinto. Mas mostra que
houve uma massificação do ensino fundamental. Bom seria se essa tendência tivesse sido acompanhada de uma melhoria da qualidade do ensino. Nessa matéria,
infelizmente, o Brasil perdeu de
goleada no século 20. Como disse
o acadêmico Arnaldo Niskier, em
entrevista à Folha, nem é preciso
ter estatísticas para perceber que
a massificação veio acompanhada da perda de qualidade. No ensino público, mesmo quem tem
alergia ao saudosismo reconhece
que a perda de qualidade foi assustadora quando comparados os
níveis de hoje com os de meados
do século passado.
Essa constatação se dá exatamente no momento em que alguns economistas conseguem
comprovar por fórmulas matemáticas que os fatores humanos
-leia-se educação- são tão importantes quanto os fatores físicos
-leia-se poupança interna ou
externa- para o crescimento
econômico dos países.
O economista Paulo S. Tenani,
doutor pela Universidade Columbia, publicou semanas atrás um
artigo sobre a influência do capital humano no crescimento das
nações. Ele, que lançou recentemente um livro sobre o assunto,
lembra que o Brasil teve um extraordinário desenvolvimento
dos anos 1950 a 1980, decorrente
do acúmulo de capital físico, ou
seja, poupanças internas. O país
foi o campeão mundial do crescimento nesse período, com taxas
médias de 7% ao ano, mas a tendência se extinguiu porque não
foi acompanhada pela expansão
do capital humano.
A tendência de quem vive o dia-a-dia dos negócios é centrar fogo
em demandas relacionadas com
os fatores físicos que levam ao
crescimento, como a acumulação
de poupança, a oferta de crédito,
a redução dos juros e o investimento público em setores de base.
Para ter um crescimento duradouro no século 21, porém, o país
precisa de pesados investimentos
também em capital humano. O
desenvolvimento exige, mais do
que nunca, preocupação com
educação não mais de massa,
uma vez que o analfabetismo está
quase erradicado, mas de qualidade.
Benjamin Steinbruch, 50, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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