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LUÍS NASSIF
Um imenso Paraguai
No começo, aparentemente, era apenas uma
proposta para fins específicos,
que beneficiaria uma fábrica
de papel e celulose no Amapá.
O presidente do Senado, José
Sarney, encaminhou o projeto
de lei 2.403 estendendo as vantagens da Zona Franca de Manaus ao Amapá, para a implantação de fábricas utilizando recursos naturais da região.
Aberto o precedente, fez-se a
farra do boi. Emenda daqui e
ali, e, de um bairro de Manaus,
pelo projeto de lei, a zona franca será estendida a toda a
Amazônia legal, de Rondônia
ao Amazonas.
Como se sabe, zonas francas
são consideradas território estrangeiro para fins tributários.
Não se pagam impostos sobre
produtos adquiridos internamente nem sobre importados, e
a produção é isenta de IPI,
ICMS, PIS-Cofins e Imposto de
Renda, além de financiamento
a fundo perdido do Fundo
Constitucional do Norte. Em
todo lugar do mundo são zonas
de processamento de exportação, vendendo exclusivamente
para o mercado externo. O
Brasil é o primeiro caso de uma
zona franca vendendo para o
próprio mercado interno.
Hoje em dia, a Zona Franca
tem 70 mil trabalhadores, o
que significa uma renúncia fiscal da ordem de R$ 100 mil por
trabalhador/ano.
Estendendo a zona franca
para outras localidades, a primeira vítima será a própria
Zona Franca de Manaus. Depois, o restante do país. Se a
idéia persistir, haverá transferência brutal de indústrias das
regiões industrializadas para
outras sem infra-estrutura,
mas dentro da zona franca
ampliada. E o processo crescerá de forma geométrica. Quanto mais empresas se transferirem para lá, maior será a carga
tributária cobrada das remanescentes, acelerando ainda
mais a transferência.
E se Rondônia tiver uma zona franca, como pretender que
Mato Grosso permaneça vulnerável, sem reagir? Se se pode
mudar radicalmente o modelo
tributário regional mediante
um mero projeto de lei, o que
impedirá a bancada do Nordeste de reivindicar o mesmo
tratamento? Ou as regiões pobres de Minas, São Paulo, Rio
de Janeiro? Seria a porta aberta para o país se transformar
em um imenso Paraguai.
É uma bomba de nêutron,
que destrói o federalismo brasileiro, o modelo fiscal, qualquer
veleidade de política industrial, e ameaça o próprio processo de industrialização do
país. No entanto passaria incólume se o líder do PSDB na Câmara, Jutahy Magalhães, não
tivesse identificado o projeto
na pauta de convocação extraordinária -e o brecado. No
final do ano, o "Globo" chegou
a publicar uma matéria dizendo que o PSDB ajudara o governo, pois o poupara de vetar
o projeto de lei de um aliado
poderoso, o presidente do Senado José Sarney.
Qual não foi sua surpresa
quando o projeto de lei foi introduzido na pauta da convocação extraordinária do Congresso.
Se o governo não quiser incomodar seu aliado, basta permitir que o projeto seja enviado à
Comissão de Constituição e
Justiça da Câmara e, depois, às
comissões de Economia e Finanças. Com isso, se abriria o
debate e a própria opinião pública se incumbiria de sepultar
essa temeridade.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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