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CRISE NO AR
Banco diz que pode ajudar investidor interessado na empresa aérea, mas sempre agindo com critérios técnicos
BNDES admite financiar compra da Varig
JANAINA LAGE
DA SUCURSAL DO RIO
O novo presidente do BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Demian Fiocca, 37, afirma que a
imagem de "hospital de empresas" do banco ficou no passado. O
banco é apontado como uma das
principais alternativas para capitalizar e salvar a Varig. O ministro
da Defesa, Waldir Pires, havia
afirmado anteontem que existe a
possibilidade de o governo injetar
dinheiro público para amenizar a
crise financeira da Varig. Sem
apresentar detalhes, citou apenas
o BNDES como opção.
Segundo Fiocca, o banco adotará decisão técnica em relação à
empresa, mas pode vir a financiar
um eventual investidor interessado na compra da empresa.
O banco pretende priorizar neste ano investimentos em inovação
e infra-estrutura. Em junho, o
BNDES vai apresentar um estudo
sobre os setores estratégicos para
o crescimento do país. Veja trechos de sua entrevista à Folha:
Folha - Qual foi o resultado dos
encontros do BNDES com os interessados na Varig?
Demian Fiocca - Temos tido contatos em nível técnico, recebi também uma comitiva de trabalhadores, mas não há nada decidido. O
BNDES não lidera essa questão
nem do ponto de vista do governo
-porque existe a agência regulatória do setor de aviação- nem
do ponto de vista financeiro.
Folha - O BNDES já teve contato
com a situação da Varig ao financiar a compra das ex-subsidiárias
VEM e Varig Log.
Fiocca - O BNDES viabilizou um
aporte de recursos de R$ 150 milhões em novembro do ano passado ajudando no processo de venda da VEM e da Varig Log, mas o
fez emprestando ao comprador,
não à Varig. Efetivamente o comprador até nos pagou antecipadamente. Nossa posição é tratar o
assunto de maneira técnica, dentro da prudência bancária.
Folha - O banco está disposto a financiar um investidor interessado?
Fiocca - Isso é algo que pode
ocorrer. Não há nenhum ônus a
que o BNDES empreste para um
investidor que esteja apto do ponto de vista da qualidade de crédito
a receber recursos do banco. Efetivamente já fizemos isso antes.
Folha - O BNDES ainda traz a imagem de salvador de empresas?
Fiocca - Houve em décadas passadas algum uso de bancos públicos. "A empresa está mal? Manda
no banco público e não paga." Pode ser que tenha ficado essa visão,
como ficou de algumas agências
públicas. A gente tem um histórico de atuação nesse sentido, mas
não vejo como algo recente. Mesmo na gestão Carlos Lessa [primeira metade do governo Lula],
mais associada à idéia de hospital,
não houve nenhum socorro irresponsável para empresas.
Nesse governo, a linha é combinar boa técnica bancária com
apoio ao desenvolvimento. Não é
ser um banco comercial, que quer
lucro máximo e risco mínimo,
mas é um banco também prudente nos seus empréstimos. A carteira de empréstimos do BNDES
tem classificações de risco que na
soma são melhores do que a carteira média do setor privado.
Folha - Que exemplo o sr. daria
dessa nova atitude do banco?
Fiocca - O apoio ao setor de distribuição de energia, que ficou
fragilizado depois da crise de
2001. O anúncio de que o BNDES
criaria um programa específico e
a recuperação da economia fizeram com que, de uma dezena de
empresas, só uma tenha recorrido
ao programa, a Light. É um sinal
que ajuda a desmistificar a idéia
de que o BNDES vai salvar a empresa. Quando ele entra, é exigente. As outras empresas preferiram
não recorrer porque, se fizéssemos uma debênture, seríamos
duros na negociação.
Folha - E como isso poderia ser
feito no caso da Varig?
Fiocca - O caso da Varig não é
igual ao da distribuição, que foi
um programa para todas as empresas de um setor em crise. A
operação de financiamento para
VEM e Varig Log foi mais específica. O setor de aviação não está
mal, a Varig está. Agimos muito
rápido e evitamos o arresto de 20
a 40 aviões. Uma empresa que está voando com 60 teria dificuldade para se recuperar. Para a Varig,
não dava para emprestar, mas tinha a TAP, que queria comprar e
apresentou garantias. O risco do
Tesouro português é menor do
que o risco Brasil.
Folha - Quais serão as áreas prioritárias do banco na sua gestão?
Fiocca - Inovação e infra-estrutura. A inovação é prioridade ao
longo de toda a cadeia, desde pesquisa e desenvolvimento até a
produção e a venda de máquinas
mais produtivas.
Folha - Quanto o BNDES espera
desembolsar neste ano?
Fiocca - Nossa expectativa é de
crescimento de 20%. O orçamento autorizado é de R$ 60 bilhões,
trabalhamos com a perspectiva de
desembolsar R$ 55 bilhões.
Folha - O banco identifica um novo movimento de modernização da
indústria, mas os desembolsos no
primeiro trimestre caíram 28%.
Fiocca - Estamos diante de um
processo virtuoso de modernização da economia. Vejo o desembolso agregado do primeiro trimestre como um ponto fora da
curva porque não há nada que
permita falar em desaceleração.
As variáveis macroeconômicas
também indicam uma retomada.
Os juros já caíram quatro pontos
percentuais, e, em termos nominais, estamos no patamar mais
baixo desde o início do Real. A
TJLP (Taxa de Juros de Longo
Prazo) entrou em trajetória de redução, de 9,75% para 8,15%, uma
redução significativa. O ambiente
internacional continua positivo.
As turbulências políticas não afetaram a confiança no país, o risco
Brasil e o dólar continuam baixos.
Folha - O banco criou um comitê
de assuntos estratégicos. Qual é o
objetivo?
Fiocca - O BNDES pode contribuir mais para a renovação da visão sobre o posicionamento estratégico do Brasil. Como o país se
posiciona depois de sair de uma
situação de 30 a 40 anos de fragilidade da balança de pagamentos,
dos quais 20 foram de crises com
balança de pagamento, para uma
situação de uma certa abundância
de divisas? Esse é um contexto novo. Vamos divulgar os dados
completos desse estudo e os demais setores no aniversário do
banco, em junho.
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