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VINICIUS TORRES FREIRE
Crise: com ou sem emoção?
Mercado festeja dados menos horríveis que o esperado e demissões. Mas desemprego é a fase lenta e longa da crise
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AS PERDAS dos bancos americanos devidas à desvalorização
de instrumentos financeiros
complicados deixaram de ser sensacionais, embora ainda enormes.
Mas continuam a aparecer nos balanços os sinais de deterioração da
"vida real": pequenas empresas e indivíduos deixam de pagar dívidas.
Ontem, o Bank of America anunciou que três quartos de suas perdas
com crédito foram devidas à inadimplência de cidadãos que tomaram empréstimos contra o valor de
suas casas, de pequenas empresas e
de empreiteiras de imóveis. O outro
quarto deveu-se a baixas contábeis,
o registro da desvalorização de ativos como derivativos de crédito
imobiliário enrolados e empréstimos para fusões e aquisições.
Decerto o Bank of America, o segundo maior em valor e o maior do
varejo nos EUA, não é um banco especializado em finanças agressivas
ou bucaneiras. É conservador e apenas recentemente, no final da festa,
resolveu entrar com os dois pés em
negócios de banco de investimentos. É um banco mais próximo da
"vida real". A pancada da inadimplência em seus livros indica a lenta
deterioração da "economia real".
Prejuízos desastrosos, como o do
Citigroup, mas menores que o mercado esperava, animaram as Bolsas.
Não foi dado muito destaque às notícias das dezenas de milhares de demissões nos bancos. Corte de gente
de certo modo anima os investidores: tapa rombo e é corte de custo,
que pode ser lucro mais adiante.
Emissão de ações tapa buracos também, mas dilui a participação acionária e, assim, o lucro por ação. Demissões, porém, aleijam a galinha
dos ovos de ouro da economia toda.
A melhor notícia da crise americana é que as grandes empresas não
chegaram ao ciclo de baixa com excesso de capacidade produtiva, com
empregados demais ou endividadas.
Excesso havia na construção e no financiamento imobiliários, em ruína
crescente, e, claro, nos bancos. Que o
mundo "emergente" esteja crescendo muito também sustenta os balanços das empresas americanas.
Mas o fato de o vírus da crise ter surgido longe das empresas não quer
dizer que estas estejam imunes.
Que o Fed e, agora, o Banco da Inglaterra preguem esparadrapos de
centenas de bilhões de dólares no
sistema financeiro não significa que
os bancos estejam prontos para outra, para começar a emprestar -significa que os bancos centrais evitam
uma catástrofe. Mas os bancos ainda
precisam limpar a sujeira do tsunami que provocaram: livrar-se de empréstimos ruins, cortar custos, aumentar capital, vender ativos, encontrar novos negócios lucrativos.
Agora, é ver como essa epidemia
lenta de crédito mais escasso e de
desemprego vai se difundir. É ver
qual será, se algum, o efeito do brutal
corte de juros e do pacote de corte de
impostos nos EUA, que talvez apareça a partir de meados do ano.
Apesar de divergências ainda
enormes de diagnóstico, na visão de
economistas mais sensatos e prudentes a crise entra num estágio que
não seria tão sensacional e midiático
como o dos mergulhos das Bolsas
(que não estão descartados, aliás),
mas de taxas de emprego mais altas
mês a mês, de consumo e investimento progressivamente menores.
Pode ser o estágio mais perigoso para os "emergentes". Nós inclusive.
vinit@uol.com.br
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