São Paulo, Domingo, 22 de Agosto de 1999
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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS
Poupança dos EUA cai para nível dos anos 30

GILSON SCHWARTZ
da Equipe de Articulistas

Nesta semana acontece a reunião do Comitê de Política Monetária dos EUA, um evento que para a grande maioria dos analistas econômicos terminará com o anúncio de mais uma elevação nas taxas de juros norte-americanas, dificultando a recuperação das economias menos desenvolvidas ou "emergentes".
Mas os dados continuam inconclusivos, ainda há economistas que apresentam razões até surpreendentes para justificar um cenário de estabilidade nos juros e continuação do processo de crescimento dos EUA.
Um desses diagnósticos heterodoxos foi apresentado na semana passada por William Gale, da Brookings Institution, em artigo publicado na "Barron's". Para Gale, as estatísticas sobre a poupança nos EUA não correspondem à realidade.
Um dos problemas apontados pela grande maioria dos economistas é a baixa taxa de poupança dos EUA. Consumindo demais, os norte-americanos estariam gerando um déficit comercial brutal, provocando um aquecimento insustentável da economia (risco de inflação) e comprometendo o crescimento futuro.
Se esse diagnóstico estiver correto, a elevação das taxas de juros seria necessária não apenas para esfriar o consumo e o investimento, mas também para elevar a propensão a poupar entre indivíduos e empresas.
Os dados oficiais mais recentes, divulgados no final de julho, indicam uma taxa de poupança negativa nos seis meses anteriores (-0,9% do PIB). É simplesmente o nível mais baixo de poupança desde a Grande Depressão. Essa taxa era de 8% nos anos 60, caiu para 5% no início da década de 90 e bateu em 0,5% em 1998.
Sem poupança interna, a economia norte-americana depende de capitais externos. Enquanto o risco no resto do mundo é alto, os capitais buscam refúgio nos EUA, espontaneamente. Mas, segundo alguns economistas, se o resto do mundo começar a se recuperar, atraindo esses capitais, não restará alternativa aos EUA senão elevar os juros para atrair os capitais (a poupança externa) de volta. Isso poderia gerar novas crises na periferia, induzindo os capitais avessos ao risco a ficar nos EUA mesmo que ocorresse uma nova redução dos juros. Em suma, o Fed (banco central dos EUA) estaria desempenhando o papel de um regulador do crescimento global, obviamente colocando em primeiro plano o interesse nacional norte-americano.
Gale argumenta, no entanto, que os números estão sendo mal interpretados. Se à poupança dos indivíduos forem adicionados os superávits nas contas do governo e a poupança das empresas, o resultado seria uma poupança nacional nos EUA muito maior do que se imagina.
Os cálculos de Gale (feitos junto com John Sabelhaus, do departamento de orçamento do Congresso) indicam uma queda na poupança pessoal a quase zero, mas, quando se incluem empresas e outros fatores, a taxa fica em 7% em 1998. Ou seja, a poupança teria caído, porém menos do que se imagina, estando agora em nível mais alto que o indicado pelo governo dos EUA.
Resta saber se os diretores do Fed têm alguma sensibilidade para esse tipo de argumento. Explicar o vigor da Bolsa de Nova York a partir de dados de poupança que incluem ganhos de capital e outros rendimentos financeiros das empresas, como sugere Gale, parece um procedimento muito próximo de um círculo vicioso.
Ou seja, a Bolsa é vigorosa porque a poupança é maior do que se imagina, mas a poupança é maior do que se imagina apenas quando se leva em conta os ganhos propiciados a empresas e indivíduos por um mercado acionário forte.


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