São Paulo, sexta-feira, 22 de setembro de 2006

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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Por que o Brasil não cresce?



A economia brasileira está amarrada por um cipoal de restrições estruturais que impede o investimento

ESSA PERGUNTA está disseminada na imprensa e nos principais formadores de opinião, no Brasil e no exterior. Afinal, estamos há mais de dez anos com a mesma política econômica ortodoxa, a inflação é hoje no Brasil menor do que no Primeiro Mundo, nossa dívida externa líquida está desaparecendo, e o superávit primário tem permitido a estabilização da relação dívida pública/PIB. Além disso, temos um Banco Central com independência operacional inquestionável, com uma direção radical em seu compromisso com a estabilidade de preços e que, pela primeira vez na história recente, cumpre com folga a meta de inflação.
Apesar de todas essas condições, a economia patina em um crescimento medíocre e desequilibrado. O presidente de nossa autoridade monetária, em recente intervenção pública, diz que o crescimento sustentado está ao alcance de nossas mãos. Mas a sociedade está cansada dessas promessas que vêm sendo repetidas há mais de dez anos. Essa frustração tem apenas um lado bom: abrir espaço para que sejam questionadas a racionalidade e a eficiência da política econômica atual.
Para entender por que o Brasil não cresce, não precisamos apelar para análises fora da ortodoxia econômica. Pelo contrário, é dentro do arcabouço teórico das economias de mercado que podemos buscar as explicações pelo nosso baixo crescimento: a economia está amarrada por um cipoal de restrições estruturais que impede o investimento, público e privado. Essas restrições podem ser divididas em dois grupos: o primeiro é formado por uma carga tributária incompatível com a que existe nas economias emergentes modernas e um sistema de impostos irracional e de complexidade inaceitável no mundo competitivo de hoje; no segundo grupo eu incluiria uma série de restrições de natureza institucional, inclusive o sistema judiciário, criando um ambiente hostil para a eficiência das empresas privadas.
Esse nosso aleijão fica ainda mais grave porque o Brasil tem hoje -graças ao aumento da demanda mundial por nossas exportações- uma enorme capacidade de importar. Com a carga tributária atual -composta por impostos nocivos à produção e ao emprego-, fica muito difícil para as empresas brasileiras, principalmente no setor industrial, competir com as importações. No passado, quando havia uma escassez estrutural de dólares em nossa balança de pagamentos, esse efeito não tinha a importância de hoje, pois o crescimento das importações era limitado, com freqüência, por desvalorizações cambiais abruptas. Mas, agora, com a sobra de dólares em nossa economia e uma volatilidade muito baixa na taxa de câmbio, a competição externa começa a pesar. E esse problema será crescente.
A maioria dos analistas tem confundido a relação de causalidade entre nossas dificuldades e a carga fiscal elevada. Não conseguem enxergar que o problema é o crescimento de gastos do governo, que impõe uma elevação continuada da carga tributária, sem a qual o superávit primário seria rapidamente eliminado. A carga fiscal de quase 40% é RESULTADO do nível de gastos do governo, que por sua vez é a CAUSA PRIMÁRIA do baixo crescimento. Por outro lado, o sistema tributário maluco que temos também é RESULTADO do tamanho dos gastos públicos. Primeiro porque o país não tem renda suficiente para que o governo extraia 40% do PIB por meio de impostos com base na renda -do trabalho e do capital- e no valor agregado da produção, o que o leva a apelar para toda sorte de impostos em cascata, com incidência sobre faturamento, transações financeiras etc.
Talvez haja ainda um fator mais difuso. Se transformássemos a miríade de contribuições e impostos que são cobrados ao longo da cadeia produtiva em um imposto simplificado sobre o consumo, teríamos uma taxa de mais de 60% na venda final de produtos e serviços. Foi para ocultar da sociedade essa taxa absurda de impostos que os burocratas de plantão, nos últimos governos, foram criando os CPMFs, PIS/Cofins, IOFs e outras invenções caboclas. Se o sistema fosse transparente, certamente os protestos contra gastos públicos sempre crescentes e a percepção de que o governo não cabe no PIB seriam mais disseminados.
Para finalizar, insisto em que nosso problema de competitividade será agravado pela aceleração do processo de arbitragem racional, de consumidores e empresas, entre produção interna e importações.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 63, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
lcmb2@terra.com.br


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