São Paulo, domingo, 22 de outubro de 2006

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Lula buscará reconstruir credibilidade

Se reeleito, presidente vai querer mostrar a investidor compromisso com a responsabilidade fiscal e a redução da dívida pública

Estratégia para reconquistar confiança passa pela formação da equipe econômica de um eventual segundo mandato

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Por trás do debate sobre os rumos da política econômica nos próximos anos está a preocupação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de, se reeleito, sinalizar ao mercado financeiro que não ficará refém dos desdobramentos da investigação do dossiê contra tucanos, sem conseguir aprovar medidas importantes no Congresso que permitam ao país crescer.
Para isso, avalia-se que é preciso reconstruir a credibilidade do "novo governo" com investidores e analistas financeiros, mostrando uma equipe que tenha compromisso com a responsabilidade fiscal no longo prazo e com a redução da dívida pública.
Segundo um interlocutor do governo, se o mercado financeiro acreditar que o tamanho do endividamento público ante o total da produção nacional (Produto Interno Bruto) vai mesmo recuar do patamar de 50% do PIB, o espaço para queda mais acentuada dos juros estará garantido.
Dessa forma, argumenta, é possível fortalecer a economia e criar um ambiente que se contraponha à turbulências políticas que possam surgir num eventual segundo mandato. Lula está convencido de que as conquistas do lado econômico foram a salvação do governo nos últimos dois anos, quando o país foi inundado por denúncias de corrupção. Agora, no caso de ter mais quatro anos pela frente, ele quer reforçar seu "arsenal" de defesa porque sabe que contará com uma oposição bem mais aguerrida.
Para isso, a primeira condição é garantir taxas de crescimento da economia bem maiores do que a média de 2,5% registrada até agora. A segunda, tirar o Brasil do topo do ranking dos países que têm as maiores taxas de juros reais do planeta. Esses são considerados os pontos fracos da gestão econômica até agora.
Ninguém duvida, no entanto, de que a base do modelo econômico será a mesma que vem desde o governo passado: ajuste fiscal, sistema de metas de inflação e câmbio flutuante. A diferença estará nos ajustes dessas variáveis. E aí começam as divergências dentro do PT.

Poder
Essa discussão das "correções" possíveis, já travada nos bastidores do governo, ganha uma dimensão ainda maior porque se mistura à disputa pelo controle da equipe econômica. Com isso, mais do que uma nova proposta econômica, o governo precisará de nomes que sejam interpretados pelo mercado como pessoas comprometidas com o rumo escolhido.
Lula não quer abrir mão das conquistas obtidas a duras penas na economia, mas quer ir além. O atual ministro Guido Mantega (Fazenda) é visto como alguém que pode fazer a política que o presidente decidir. O problema, nesse caso, é que ele não sinaliza algo novo e tem sua imagem desgastada por ser considerado "gastador".
Com isso, a opção por uma ajuste fiscal mais forte ou a decisão de fazer uma reforma ousada da Previdência, por exemplo, exigiria outra pessoa no comando da política econômica, na avaliação de integrantes do governo. Além disso, Mantega tem que enfrentar a resistência de Antonio Palocci Filho, seu antecessor no cargo.
Eleito deputado federal por São Paulo, o ex-ministro vem atuando nos bastidores pela substituição de Mantega. Palocci tenta abrir caminho para o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, assumir a pasta e, mais recentemente, passou a defender também o nome do prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, como outra opção.

Mudança no discurso
A manutenção de Mantega no cargo exigiria uma mudança no discurso dele, por exemplo, com relação à realização de uma reforma da Previdência, segundo apurou a Folha. Sem isso, avaliam, dificilmente os investidores acreditariam na tese de que os juros cairão de forma mais acentuada do que nas projeções atuais.
Pelas estimativas do mercado, considerando uma inflação de 4% no ano que vem (abaixo da meta de 4,5%), o país chegaria ao final de 2007 com juros reais entre 7% e 8% anuais, o que significa uma taxa nominal entre 11% e 12% ao ano. Atualmente, a Selic, fixada mensalmente pelo BC, está em 13,75% ao ano. Com isso, o espaço para reduzir a taxa é apertado.
Um corte mais forte da taxa, já defendido dentro do governo, faria o país se aproximar das taxas de juros praticadas em economias em desenvolvimento, que estão crescendo a taxas bem mais aceleradas do que o Brasil. O problema é que, para sustentar esse cenário, é preciso avançar também no plano fiscal.
A dificuldade do governo é encontrar fórmula que viabilize isso sem ter de aumentar o arrocho nas contas públicas para não comprometer investimentos na área social. E, aí, novamente, um ponto de alívio para o governo é a reforma da Previdência. Mesmo que o impacto de uma mudança no sistema não seja imediato, só a perspectiva de que ela viria no médio prazo já seria suficiente para criar um ambiente positivo, permitindo queda do juro.


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