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Bovespa estréia com filtro antiespeculação
Abertura de capital da Bolsa de SP dá preferência a investidor de longo prazo e traz mecanismo que checa perfil de interessado
Objetivo é evitar excessiva oscilação nos preços dos papéis; advogado diz que medida pode dar margem
a contestação judicial
FABRICIO VIEIRA
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma das aberturas de capital
mais esperadas do ano, o IPO
da Bovespa testará proposta
das mais polêmicas no mercado financeiro: priorizar os investidores de longo prazo, que,
em tese, apostam na companhia da qual estão se tornando
sócios, em detrimento dos
"oportunistas", que entram nas
ofertas públicas e saem nas primeiras horas a fim de embolsar
um lucro fácil e rápido.
Para isso, criou-se uma espécie de filtro para catalogar os
investidores de varejo.
Quem já faz o pedido de reserva para participar do IPO da
Bovespa se deparou com um
item em que deve se classificar
como um investidor "com" ou
"sem" prioridade de alocação.
Ao optar por "com prioridade
de alocação", o investidor diz
que não é especulador e autoriza a CBLC (Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia)
a verificar a informação.
Se disse ser "sem" prioridade, a informação não é checada,
mas ele perde a preferência no
rateio. Investidores que nunca
participaram de um IPO serão
automaticamente rotulados
como "com" prioridade.
Segundo a CVM (Comissão
de Valores Mobiliários), na
maioria dos IPOs (oferta pública inicial, na sigla em inglês), a
demanda dos investidores de
varejo chega a superar em cinco vezes o volume reservado
para o segmento, o que leva a
um rateio dos papéis -ou seja,
após a alocação mínima, o que
sobra é repartido entre os investidores que fizeram reserva.
No caso da oferta da Bovespa,
ganhariam preferência no rateio os investidores com perfil
de longo prazo.
"Flipper"
Chamado no mercado financeiro de "flipper", o pequeno
especulador é indesejado pelas
empresas que abrem capital
porque pode favorecer a baixa
das ações logo nas primeiras
horas de negociação, ao vender
rápido os papéis estreantes.
"Se quer ter uma boa inserção no mercado, faz sentido a
empresa ter o direito discricionário de alocar para investidores que não sejam "flippers'",
disse Sergio Wegelin, diretor da
CVM.
"No dia da abertura, quando
a oferta tem uma grande venda,
pode criar uma percepção de
que [a operação de abertura de
capital] foi mal precificada, que
os fundamentos sugeridos não
sustentavam a avaliação. A empresa tem o direito de evitar
uma volatilidade excessiva que
afete a credibilidade da oferta."
Quebra de sigilo
O problema é que a informação sobre a venda rápida de
ações estreantes é confidencial
e seu uso poderia ser configurado como a violação de um sigilo,
como o bancário. O modelo encontrado para usar essa informação sem esbarrar na violação do sigilo foi fazer o próprio
investidor autorizar o seu uso,
ao pedir a reserva de ações.
Para o advogado Roberto
Justo, do escritório Choiab,
Paiva e Justo, a classificação
poderá dar margem a contestação judicial. Isso porque um
eventual cliente que optou por
não se autoclassificar pode reclamar mais tarde de que não
teve tratamento equânime.
"O não-prioritário pode dizer
que teve desigualdade. Ainda
mais que o prioritário pode ficar quieto e vender depois [as
ações]. Como isso é uma coisa
nova, não tem histórico nenhum. Até para a CVM, fazer
uma coisa dessa abre uma brecha grande. O âmbito da Bolsa é
dar liberdade de comprar a
ação que quiser. É passível de
questionamento, mas acho de
difícil contestação", disse.
A adoção do filtro para apanhar aqueles que entram nos
IPOs apenas para ter lucro rápido, desfazendo-se apressadamente das ações novatas, não
será uma regra imposta às empresas que abrirem capital.
Na opinião de Wegelin, da
CVM, o fato de o investidor ter
autorizado a verificação de seus
dados não configura violação
de sigilo. "Essa informação não
é passada para os coordenadores, não se está abrindo o sigilo
de ninguém. Vai estar sendo
feito só um procedimento de
alocação, não há quebra de sigilo nessa questão. Qualquer verificação que se fizer vai ser de
alguém que autorizou", disse.
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