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LUÍS NASSIF
O papel de Mendonça de Barros
Apressar a queda do ministro
das Comunicações, Luiz Carlos
Mendonça de Barros, é simples.
Em vez de manchetes com os
apoios recebidos -que são muitos-, basta destacar as declarações de desconfiança. De preferência, de "aliados" do governo.
Não é necessário explicar que os
"aliados" têm interesse direto no
cargo de ministro da Produção
-oferecido a Mendonça de Barros-, para não enfraquecer a
campanha.
Se pulularem declarações em
"off" atribuídas a gente do Palácio, melhor ainda. O ministro tem
casca grossa para suportar pancadas de adversários, mas é extremamente suscetível a traições de
amigos.
Antes de se prosseguir na escalada, porém, é importante que aliados e adversários se debrucem um
pouco sobre o papel de Mendonça
de Barros no governo e o sentido
do Ministério da Produção -que
caberá ou caberia a ele dirigir.
Desde sua implantação, o Plano
Real consistiu em uma mera âncora cambial, escorada em taxas
de juros extremamente perniciosas. Não conseguiu sequer romper
com o imobilismo que se seguiu
aos desacertos da política cambial, em março de 1995.
Uma política econômica depende, em parte, de conceitos. Mas
muito do chamado comportamento de grupo. Juntou- se no governo um grupo heterogêneo de
ministros, mais ou menos competentes, no plano individual. Mas o
grupo padece de um imobilismo
atroz, enquanto grupo, que acaba
afetando a atuação individual de
cada um e comprometendo fundamentalmente o conjunto.
O catalizador
É aí que entra o papel de Mendonça de Barros.
Nesse período, por iniciativas
individuais, lentamente foram
plasmados os princípios de uma
nova ação de governo no plano
econômico. Do lado prático, Mendonça de Barros ajudou a definir
o novo estilo de atuação do Banco
Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES),
principalmente ao transformar o
banco em instituição moderna na
área de captação, utilizando sofisticados mecanismos de captação de recursos externos. Enquanto o BC trazia capital externo
ruim, cabia ao BNDES trazer capital saudável.
Do lado conceitual, esse conjunto de intervenções foi organizado
e ampliado por outro Mendonça
de Barros, José Roberto, então secretário de Política Econômica da
Fazenda, que avançou nos conceitos de adensamento da cadeia
produtiva e na sistematização de
experiências de desenvolvimento.
Paralelamente, FHC foi convencido da necessidade de criar uma
perna nova na economia, capaz
de equilibrar as ações entre o
mundo virtual da Fazenda e do
Banco Central.
Luiz Carlos vinha cumprindo
papel fundamental nessa área,
não apenas por seu conhecimento
do mundo financeiro (essencial,
quando se for flexibilizar a política cambial), mas pela facilidade
com que se integrou com a Fazenda, BC e Casa Civil. Apesar do estilo externo truculento, internamente sempre desempenhou papel de conciliador. Nos tempos do
Cruzado, era ele quem fazia o
meio campo entre o grupo financeiro (do BC) e o grupo da Unicamp. Tudo devido a seu pensamento não-dogmático e a uma
qualidade ressaltada pelo governador Mário Covas: lealdade.
Hoje em dia, é nele que se depositam as esperanças de rompimento da inércia do primeiro governo e de adesão de todo o segmento produtivo -até agora o
mais sacrificado pela política econômica e o mais crítico ao governo- sem estabelecer a polarização e o conflito com a Fazenda.
O destino de Mendonça de Barros está nas mãos de FHC. E não
se vai segurá-lo com declarações
dúbias, tipo "o ministro agiu eticamente correto, mas politicamente errado".
Ou se considera que o ministro
agiu corretamente do ponto de
vista ético, e, portanto, deve ser
amplamente prestigiado. Ou se
considera que a política de privatização era ilegítima e, mesmo assim, foi aprovada previamente
por FHC, governo e base aliada
-era ilegítima. E trate de se preparar, nos próximos meses, para
expor à suspeição todos os atos de
governo.
Se o presidente permitir a fritura de seu ministro, não estará matando apenas a única expectativa
de agenda positiva que conseguiu
em seu governo. Mas rompendo
com princípios de lealdade e solidariedade que são fundamentais
para manter a coesão de sua equipe e a adesão de seu próprio partido.
O enunciado Simon
Causou viva impressão as declarações do senador Pedro Simon,
de que o ministro agiu de maneira
eticamente correta, mas politicamente errada. Talvez a frase seja
melhor compreendida partindo-
se de um exemplo prático.
Consultor-geral da República,
no governo Itamar, o advogado
José de Castro dá um parecer pelo
desarquivamento de um processo
administrativo de 1982. Refez o
parecer da consultoria da época e
opinou a favor do pleiteante, que
exigia indenização da União. Era
um escândalo, mas a oposição
não tinha força para pressioná-lo,
e os partidos aliados não tinham
interesse no cargo.
Tinha-se o oposto do enunciado
de Simon: o ato era eticamente
condenável, mas politicamente
defensável, porque não havia soma suficiente de interesses políticos para explorar o episódio. E
nosso varão de Plutarco, Simon,
se abstém de se pronunciar sobre
o tema, porque seu campo de
atuação é só a política.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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