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LUÍS NASSIF
A teoria concreta
A teoria é uma abstração,
uma maneira de estruturar o raciocínio e interpretar a
realidade. Ela não tem vida
própria: depende integralmente do objeto analisado. Ela tem
que interpretar, explicar as reações observadas. Se não consegue, é óbvio que a teoria ou não
é adequada ou não está sendo
utilizada da maneira adequada.
Hoje em dia, as autoridades
econômicas estão repetindo o
mesmo exercício retórico do
primeiro governo Fernando
Henrique Cardoso. Cria-se
uma situação insustentável,
pouco eficaz e, depois, vai se fazendo um check-list, levantando uma lista enorme de detalhes que estariam comprometendo o resultado final, transformando cada dado relativo
em um diagnóstico absoluto.
Antes, havia o câmbio fixo.
Agora, há uma meta inflacionária fixa em um momento em
que nem a inflação internacional está sob controle.
Em uma economia completamente aberta, país nenhum
tem controle total sobre sua política monetária. Monta-se em
uma meta de inflação rígida,
aumentam-se os juros para
conter a demanda. O aumento
dos juros traz capital de arbitragem. Esse capital entra, e o
Banco Central tem duas alternativas. Não interfere, e o câmbio se aprecia até o limite da irresponsabilidade; ou compra
reservas, a um custo fiscal tremendo... e o câmbio continua
se apreciando.
Nas regras atuais, não há como segurar esse fluxo. O dólar
entra a R$ 2,60. Lá fora, custa
4% ao ano. Aqui, consegue
20%. Em um ano, a taxa de
equilíbrio é de R$ 3. Como segurar essa avalanche? Ou se coloca um mata-burro na porteira ou se taxa esse capital.
Na outra ponta, o crédito
consignado em folha dispara
feito um foguete, porque não
há correias de transmissão entre a taxa Selic e o custo do financiamento para pessoa física. O BC aumenta os juros, os
bancos reduzem um pouco
mais seu "spread" (em uma linha de inadimplência baixíssima) e mandam bala.
Hoje em dia, as taxas de juros
de longo prazo dos títulos públicos não acompanham a chamada curva de juros. Aumenta
o curto prazo, o longo prazo
não aumenta na mesma proporção. Pode-se alegar que é
excesso de liquidez na economia. Mas pode-se sustentar que
é por falta de fé nesses juros.
O BC vai dobrando a aposta,
Copom após Copom, o mercado olha e sabe que ele não tem
cacife nem para manter o câmbio nesse nível de apreciação
nem sangue-frio para ver a dívida pública subir, como proporção do PIB (Produto Interno Bruto).
Os recursos externos entram,
beliscam os juros, provocam
mais apreciação no câmbio,
mas nenhum agente econômico vai ter suas expectativas
coordenadas pelos sunitas do
BC. E aí vão se repetindo argumentos que nem seus autores
acreditam, para justificar a
ineficácia da política econômica. Ora seriam os créditos do
BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e
Social), ora seriam os gastos
públicos carimbados.
Seja qual for o diagnóstico, se
quiser manter os juros elevados, o Banco Central terá de encontrar caminhos que reduzam
o impacto fiscal. O custo desse
aumento da dívida, com a Selic, vai se propagar por gerações.
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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