São Paulo, sexta-feira, 23 de março de 2001

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Processo será intensificado, mas não foi definido prazo para conclusão das negociações entre os dois blocos

UE e Mercosul negociam tarifas e serviços

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BRUXELAS

A UE (União Européia) e o Mercosul anunciaram ontem, formalmente, o propósito de "intensificar o processo de negociações em todas as áreas, com vistas a lançar negociações sobre tarifas e serviços o mais cedo possível, após 1º de julho de 2001".
O anúncio significa, em termos práticos, que acabou a fase de pré-negociação, que envolvia aspectos mais burocráticos e estatísticos, e, a partir de uma nova reunião em Montevidéu, em julho, vai se entrar no que de fato conta: a discussão sobre redução de tarifas de importação de mercadorias e sobre liberalização na área de serviços.
Mas não há prazo para concluir a negociação. "O que conta não é levar mais ou menos tempo, mas chegar a um entendimento de alta qualidade", diz Juan Alfredo Buffa Ramírez, vice-ministro paraguaio para Relações Econômicas Internacionais e chefe da delegação do Mercosul (o Paraguai é o presidente de turno do bloco, neste primeiro semestre).
Com isso, o Mercosul pode entrar para as negociações da Alca (Área de Livre Comércio das Américas, uma iniciativa norte-americana que envolve 34 países americanos, menos Cuba) com uma alternativa de aliança, no caso a européia.
Por mais que os europeus insistam em negar que haja uma corrida contra o tempo para ver qual das duas potências (a Europa ou os EUA) faz primeiro um acordo com o Mercosul, as referências aos norte-americanos são constantes nas declarações de funcionários europeus.
"Não precisamos de autorização do Congresso para negociar", ironiza, por exemplo, Guy Legras, diretor-geral para assuntos externos da Comissão Européia, o braço executivo do conglomerado de 15 países.
É uma alusão ao fato de que o governo Bush ainda necessita do Congresso uma autorização especial ("Trade Promotion Authority") para poder negociar acordos comerciais que, depois, o Congresso aprova ou rejeita em bloco, mas não pode emendar.
Sem essa autorização, os parceiros norte-americanos hesitam em negociar porque temem que qualquer acordo alcançado seja, depois, destroçado pelo Congresso.
O chefe da delegação brasileira, José Alfredo Graça Lima, também faz a comparação entre as duas negociações mais ou menos na mesma direção.
"Nas negociações com a União Européia, o pudim já estará sobre a mesa em julho e se pode começar a prová-lo. Com os Estados Unidos, o cozinheiro nem sequer obteve a receita do Congresso", compara o embaixador.
De fato, na nova rodada negociadora, a partir de julho, o Mercosul já saberá o alcance da oferta européia na área agrícola, prioridade um para o bloco do Sul.
Admite o próprio Legras, o negociador europeu: "Sabemos que não se pode concluir uma negociação com o Mercosul sem incluir a agricultura. É um tema absolutamente essencial para o Mercosul".
Mas Legras cuida-se para evitar otimismo exagerado sobre a disposição aberturista dos europeus: "Claro que serão negociações difíceis, até porque há também a negociação na OMC (Organização Mundial do Comércio)".
O tema agrícola está de fato em discussão na OMC, mas avança lentamente. De todo modo, a tese predominante na Comissão Européia é a de que não cabe "pagar duas vezes" (pela abertura agrícola), uma na negociação com o Mercosul e a outra na OMC, como diz Gunnar Wiegand, porta-voz para relações exteriores.
O bloco europeu também repete, uma e outra vez, que a sua oferta ao Mercosul é mais ampla que a dos Estados Unidos.
"Insisto em que a negociação com o Mercosul não é apenas comercial, mas tem também um aspecto político e de cooperação. Nossa ambição é ir além do comércio", afirma Legras.
Todas as promessas e negociações, tanto com a Europa como com os EUA, serão testadas nos próximos meses, na Cúpula das Américas, em abril, e na nova reunião UE-Mercosul de julho, porque, para o Brasil, ambas interessam igualmente.
"Não devemos desprezar nem um nem o outro, porque são nossos maiores parceiros", diz Graça Lima.
De fato, somados, os 33 países americanos que comporão a Alca com o Brasil compram cerca de 50% de tudo o que o país exporta. A União Européia, outros 27%.


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