São Paulo, sábado, 23 de agosto de 2008

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Pressão salarial no custo das empresas preocupa BC

Banco vê risco inflacionário no descompasso entre vagas disponíveis e busca por emprego

Reivindicações por reajuste nos salários deverão crescer neste semestre, quando estarão em curso cerca de 300 negociações salariais


SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Apesar de as maiores ameaças ao controle dos preços no país desde o segundo semestre do ano passado estarem concentradas no front externo, nos últimos meses é o mercado interno que tem tirado o sono dos diretores do Banco Central. Nem mesmo o recuo recente nas projeções para o IPCA de 2008 (índice referência para o governo) aliviou as preocupações com os ganhos salariais, fruto do aquecimento da economia e combustível para aumento do consumo.
Segundo a Folha apurou, para o BC, o país vive um momento especial do ciclo de crescimento em que nem mesmo os ganhos de produtividade têm sido suficientes para anular as pressões salariais no custo final das empresas.
A renda dos trabalhadores tem crescido não apenas pelos reajustes acima da inflação registrados nos últimos anos mas também por um descasamento entre uma maior oferta de vagas e a procura por emprego.
Esse descompasso é acentuado pelos gargalos de setores importantes, como a construção civil, e a procura por mão-de-obra mais qualificada em outros segmentos e se traduzem em salários maiores para os trabalhadores que estão entrando no mercado.
Levantamento feito por José Márcio Camargo, especialista em mercado de trabalho, mostra que a preocupação do BC não é à toa. Segundo ele, o crescimento médio da quantidade de pessoas que estatisticamente estão aptas ao mercado de trabalho (a chamada PEA) caiu de algo próximo a 4% ao ano para 2% anuais nos últimos anos. "Ao mesmo tempo, a taxa de geração de emprego, que era de 2% ao ano, subiu para 5% ao ano, a partir de 2006."
Isso, para ele, é mais relevante do que as cerca de 300 negociações salariais que estarão em curso neste semestre. Entre elas, categorias fortes como metalúrgicos, bancários, petroleiros, comerciários e químicos, setores com tradição sindical e fortes lucros.

Dificuldade
Com a oferta de vagas subindo num ritmo maior do que o número de trabalhadores disponíveis, as empresas não conseguem substituir funcionários que são desligados -porque pediram demissão, foram demitidos ou se aposentaram- por outros com salário menor.
"A relação entre o salário dos trabalhadores desligados e os admitidos mostra que as empresas têm dificuldade em contratar com salário menor hoje", diz Camargo, um dos primeiros a destacarem o problema.
Além disso, diz ele, o custo unitário do trabalho -uma medida que avalia quanto o custo real do funcionário subiu acima da produtividade dele- vinha se elevando, em média, 2% ao ano até janeiro deste ano, quando pulou para 7% ao ano.
Num ambiente de forte crescimento da economia, em que as empresas têm bons resultados e até o presidente da República enfatiza que essa é a hora de os trabalhadores pedirem reajustes salariais acima da inflação (como fez Lula na posse da diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, no início deste mês), a chance de esses ganhos serem repassados para os preços ao consumidor e, portanto, para inflação é grande.
Esse é o temor dos diretores do Banco Central e o que, segundo eles, explica, em parte, por que as expectativas para o IPCA do ano que vem resistem a cair. Há cinco semanas, a projeção está em 5%, acima da meta central de 4,5% para 2009. E isso apesar de todo o discurso do BC de que não hesitará em combater a inflação e das altas recentes na taxa de juros.
O objetivo do BC é fazer essa estimativa convergir para a meta. Nas últimas semanas, a projeção para 2008 recuou devido à queda no preço de commodities. Para o BC, as projeções de 2009 só cairão quando empresários e analistas começarem a perceber que haverá, de fato, um freio no crescimento.


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