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INVESTIMENTO DE FUTURO
Nos EUA, colégios de elite para moças mudam currículo para erradicar "analfabetismo financeiro" feminino
Meninas superpoderosas
JANE GROSS
DO "NEW YORK TIMES"
As meninas da escola Marymount, que ocupa três mansões
de estilo na Quinta Avenida, em
Nova York, estão decididas a controlar seu destino financeiro.
Na aula de estatística avançada,
elas aprendem que os homens se
casam com mulheres mais jovens
e morrem antes do que elas, deixando um exército de viúvas.
Num cálculo preliminar, descobrem que poupar US$ 1.000 por
ano entre o 20º e o 30º aniversários rende um bolo maior do que
poupar a mesma quantia dos 30
anos até a aposentadoria. Na aula
de Matemática 12, esboçam em
planilhas quanto tempo duraria
esse fundo de aposentadoria, dependendo do valor inicial acumulado e de seu tempo de vida.
A Marymount é uma das muitas
escolas para meninas dos EUA
que declararam a "alfabetização
financeira" uma prioridade educacional, essencial para a verdadeira igualdade entre os sexos. Essas escolas -cerca de duas dúzias, segundo a Associação Nacional de Escolas para Meninas- estão na vanguarda da tendência de
ensinar sistematicamente as adolescentes a ganhar, gastar, poupar
e investir com sabedoria, algo que
poucas aprendem em casa.
Até agora, segundo especialistas, o movimento pela alfabetização financeira se limita às escolas
particulares para meninas, que
consideram sua missão produzir
mulheres fortes e independentes e
não são obrigadas a seguir o currículo das escolas públicas.
Domínio das finanças
"Nas escolas para meninas usamos muito a expressão "conquistar poder", diz a diretora de Marymount, irmã Kathleen Fagan.
"Bem, é isso. O dinheiro não é
maligno. Com o dinheiro vêm o
poder e a oportunidade. Até no
convento a gente entende isso."
O objetivo de escolas como
Marymount é que as meninas dominem finanças pessoais básicas:
juros compostos,
dívidas no cartão
de crédito, planejamento de aposentadoria, refinanciamento de
hipotecas; viver
segundo um orçamento e montar
um plano empresarial. A inspiração é feminista: o
príncipe encantado não virá salvá-la. "Felizes para
sempre" geralmente é uma ilusão. As mulheres
passam um terço
de suas vidas sozinhas. Muitas acabam velhas e pobres.
"Muitas vezes as
mulheres não levam isso a sério
até que se vêem
abandonadas e
em dificuldades",
diz Whitney Ransome, que dirige a
Associação de Escolas para Meninas, que tem 103
membros, e há
dois anos realizou
uma conferência
sobre o assunto.
"Preferimos dar
a elas uma capacitação no começo
da vida, garantir
que compreendam que é sua responsabilidade ser
um jogador, e não
apenas um espectador. Mas essa
mudança acontece pouco a pouco, escola por escola, quase menina por menina."
Na escola Holton Arms, em Bethesda, Maryland, as garotas da 8ª
série recebem um "emprego" e
um "salário" e têm de pagar impostos, seguro-saúde, alugar e
mobiliar um apartamento e lidar
com despesas de emergência.
Na escola Julia Morgan, em Oakland, Califórnia, as garotas da 6ª
série fazem o mesmo, além de obter empréstimo para pagar a faculdade e doar uma porcentagem
da renda para caridade.
Na Escola Preparatória de Meninas de Chattanooga, Tennessee,
todas as aulas de matemática incluem temas financeiros, com palestras ocasionais. Na escola Miss
Porter's, de Farmington, Connecticut, mães e filhas participam de
seminários de planejamento financeiro.
Muitas pesquisas sustentam a
necessidade de programas de alfabetização financeira, especialmente para adolescentes de ambos os sexos de famílias abastadas. Um estudo com 4.200 adolescentes de todo o país,
feito pela Escola de
Administração Simmons, mostrou que
as garotas são menos
confiantes em suas
habilidades financeiras do que os meninos por uma margem de 15 pontos
percentuais.
Uma pesquisa nacional feita em 2002
sobre alfabetização
financeira entre alunos da 8ª série revelou notas em declínio nos últimos cinco anos. Não havia
diferença em conhecimento, mas os meninos eram mais
confiantes e tinham
maior probabilidade
de dominar técnicas
quando necessário.
Os adolescentes menos aptos vinham de
famílias com renda
acima de US$ 80 mil
anuais.
"É mais difícil envolver crianças de
maior poder aquisitivo", diz o professor
Lewis Mandell, que
dirigiu o estudo.
"Elas vivem em uma
redoma, gastam
muito no cartão de
crédito e telefonam
para a mamãe para
pagar a conta."
Os cartões de crédito já estão nas
mãos de quase um
terço dos alunos de
8ª série, segundo
Mandell. Quando os
adolescentes entram na faculdade, recebem em média 11 ofertas
de cartão de crédito por mês e fazem uma dívida mensal média de
quase US$ 3.000. As empresas de
cartão de crédito os atraem com
garrafas de água grátis e taxas iniciais de 2,9%, que saltam para
16,5% e chegam a 24,5% depois de
alguns pagamentos em atraso.
Mandell espera que as escolas
secundárias mistas e para meninos sigam as escolas de meninas,
já que os padrões federais exigirão, a partir de 2006, que os alunos da 8ª série passem por uma
prova de economia, sendo um
terço de finanças pessoais básicas.
Desafios financeiros
Na escola Lincoln, em Providence, 70 alunas de 7ª e 8ª séries
responderam a perguntas do
questionário que Mandell usa em
sua pesquisa, acertando 56% delas (a média nacional de acerto é
de 50%). O teste exige conhecimento de índices de Imposto de
Renda, juros sobre empréstimos,
desconto na folha de pagamento e
liquidez de investimentos.
As meninas da Lincoln foram
bombardeadas por fatos e números sobre os desafios financeiros
que as mulheres enfrentam e sua
necessidade de auto-suficiência.
Depois, dividiram-se em dois
grupos para seminários sobre como pagar a faculdade e como evitar dívidas no cartão de crédito.
O seminário sobre cartão de
crédito foi uma advertência: 12%
das alunas de 7ª e 8ª séries da Lincoln os possuem. Algumas pretendiam rejeitá-los, mas ouviram
que precisavam ter histórico de
crédito para futuras aquisições.
Outras pareciam confusas diante de uma situação hipotética de
US$ 1.000 em dívidas de cartão de
crédito, taxa de juros de 16,5% e
pagamento mensal mínimo de
US$ 20. Com US$ 13,75 por mês
só para pagar juros, as meninas
foram informadas de que levariam mais de sete anos para saldar
a dívida.
Lauren Hittinger franziu a testa,
confusa. "Essa é uma pergunta
idiota. Se você comprar uma blusa por US$ 26 e pagar tudo naquele mês, continua sendo US$ 26?"
A pergunta não era idiota, disseram a Lauren. E a resposta é sim:
uma blusa de US$ 26 custa US$
26, desde que você não tome dinheiro emprestado para pagá-la.
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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