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OPINIÃO ECONÔMICA
Contribuição previdenciária de inativos?
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
É defensável exigir contribuição previdenciária de
aposentados e pensionistas? Vamos recapitular um pouco. O servidor ativo faz contribuições previdenciárias para custear a sua
aposentadoria e eventuais pensões. Como propor então que volte a pagar depois de inativo?
Tomemos o caso dos servidores
civis da União, que contribuem
para a Previdência com 11% da
sua remuneração total. Uma determinada pessoa pode ter passado a sua vida profissional inteira
como empregado do governo federal, sofrendo a retenção previdenciária correspondente na folha de pagamento, mês após mês.
Agora, chega o governo, alega desequilíbrios financeiros e propõe
que ele "contribua" com 11% sobre a parcela do benefício que exceder o limite de isenção do Imposto de Renda da pessoa física
(atualmente de R$ 1.058).
Um pouco estranho, para dizer
o mínimo. Trata-se, na realidade,
de (mais um) imposto sobre a
classe média, disfarçado de contribuição previdenciária.
Diversas propostas apresentadas pelo governo para a reforma
da Previdência são válidas, ou pelo menos defensáveis. É defensável, por exemplo, a proposta de limitar a pensão da viúva ou filho(a) menor de 21 anos a 70% do
valor da aposentadoria (preservando, porém, os benefícios de
menor valor). Também é razoável estabelecer formas de reduzir
as pensões de longa duração (nos
casos de viúvas ou viúvos muito
mais jovens do que o falecido ou
falecida).
Outra mudança razoável é o
aumento dos tempos mínimos
para acesso ao benefício. O governo argumenta, com razão, que a
ampliação do tempo mínimo de
permanência no serviço público e
no cargo em que se dá aposentadoria (hoje de dez e cinco anos,
respectivamente) valoriza o funcionário de carreira, que dedicou
a sua vida profissional ao serviço
público, e evita distorções entre as
contribuições feitas e os benefícios
recebidos (Ministério da Previdência e Assistência Social, "Conheça a Reforma da Previdência
Social", março de 2003, pág. 4,
www.mpas.gov.br).
É válida, pelas mesmas razões,
a proposta de benefício proporcional. Hoje, o tempo faltante para 30 ou 35 anos de contribuição
pode ser completado com tempo
de contribuição no Regime Geral
de Previdência Social, administrado pelo INSS. Nesse regime, como se sabe, a contribuição do empregado se dá sobre uma parte da
remuneração (alíquotas progressivas de 7,65% até 11%, conforme
a faixa salarial, até um teto que é
atualmente de R$ 1.561,56). Pelas
regras em vigor, um aposentado
que passou a maior parte do seu
tempo de atividade no setor privado recebe, para o mesmo nível
salarial, benefício idêntico ao que
permaneceu todo o tempo no serviço público, contribuindo sempre sobre o seu salário integral.
Pela proposta do governo, o benefício passaria a ser calculado
proporcionalmente ao tempo de
contribuição em cada regime previdenciário. Só teria direito a
aposentadoria integral o servidor
cujo tempo de contribuição (30
anos para mulheres e 35 para homens) tenha sido todo no Regime
Próprio de Previdência dos Servidores Públicos.
Até aí tudo bem. Mas como justificar a contribuição previdenciária de inativos? Argumenta-se,
às vezes, que muitos dos beneficiários de aposentadoria integral
não fizeram a contribuição previdenciária correspondente. Caberia, assim, uma cobrança a posteriori.
De fato, há muitas pessoas nessa situação, que pode ser considerada privilegiada. Por decisão
política, funcionários contratados sob o regime da CLT passaram a ser estatutários e a ter o direito a aposentar-se com salário
integral. Além disso, a legislação
era, anteriormente, muito frouxa
em matéria de exigência de tempo mínimo no serviço público e
de exercício do cargo. Advogados
em fim de carreira, por exemplo,
fizeram concurso para juiz, exerceram a função por alguns anos e
depois passaram a desfrutar de
substanciais aposentadorias integrais. Um conhecido economista,
ex-colaborador de FHC, fez concurso para uma universidade federal, deu aulas por poucos anos
e se aposentou com remuneração
integral. Confortavelmente empregado no sistema financeiro, o
professor aposentado continua
recomendando, com generosa cobertura da mídia, "austeridade
na administração das contas públicas"...
Vamos admitir que seja possível, do ponto de vista legal, cobrar contribuição previdenciária
de inativos. Nesse caso, se o governo quer, realmente, fazer uma
reforma justa, o correto seria estabelecer contribuições inversamente proporcionais ao tempo
efetivo de contribuição de cada
servidor. Só seriam chamados a
contribuir para o financiamento
da previdência pública aqueles
que não o fizeram, de forma integral, durante todo o seu período
de atividade. Do servidor que tivesse contribuído o tempo todo
sobre o salário integral, nada se
cobraria.
Benefício proporcional, como
quer o governo? Então a eventual
contribuição de inativos também
deveria ser proporcional.
Do contrário, ficará a impressão de que a União e os Estados
estão buscando meios de fazer
caixa sem dar atenção a critérios
elementares de justiça.
O governo Lula vinha afirmando que a reforma tributária não
traria aumento da carga de tributos, uma vez que esta já havia
aumentado de forma muito significativa no período FHC (cerca
de dez pontos percentuais do PIB
em oito anos!).
Agora com a proposta de taxação dos inativos, combinada com
a de aumentar para R$ 2.400 o
teto do INSS, descobrimos que é
por meio da reforma previdenciária que se está buscando novo
aumento da carga tributária!
Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista, pesquisador visitante do Instituto
de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A
Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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