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São Paulo, terça-feira, 24 de junho de 2003

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DINHEIRO NOVO

Para economistas e entidades do setor de crédito, medida não basta para ampliar nível de consumo interno

Juros baixos da CEF devem ter efeito pífio

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Será pífio o efeito que a nova linha de microcrédito -que a Caixa Econômica Federal deve abrir para clientes de baixa renda- terá na economia real. Na melhor das hipóteses, medíocre. É isso o que conclui economistas, entidades privadas e lideranças do setor.
A instituição deve anunciar nesta semana uma espécie de linha de crédito rotativo, de até R$ 300, aos clientes do banco. A ação pode até ampliar a carteira de clientes do banco, mas em nada alterará o atual nível de consumo interno, dizem economistas e entidades privadas ouvidas ontem.
Os recursos a serem liberados podem ser utilizados para consumo ou em pequenos investimentos de microempresários.
"Não chega nem a fazer cócegas no mercado", diz Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Unibanco. Para a Anefac, associação nacional dos executivos de finanças, a "intenção é boa", pode até impulsionar "um pouco" o movimento o acesso de camadas sociais mais baixas aos serviços bancários, mas tem efeito limitado na expansão da demanda.
"Se não tivermos mais bancos oferecendo o mesmo serviço, e rápido, isso não vai para a frente. É preciso volume", diz Miguel de Oliveira, vice-presidente da Anefac. "E, afinal, por que a Caixa vai manter essa linha, num mercado sem concorrentes, se começar a levar calote ou se o retorno for menor que o esperado? Apenas porque conseguiu mais clientes?"
A questão é que, informam os economistas, poucos bancos têm apresentado, e de forma discreta, iniciativas concretas em direção à expansão do microcrédito. O ABN-Amro Bank é um deles. Segundo José Márcio Camargo, professor do Departamento de Economia da PUC-RJ e sócio da Tendências Consultoria Integrada, isso não ocorre à toa.
"A idéia de ter um banco, que tem como meta ganhar dinheiro, dando microcrédito a taxas de juros baixas é um tanto estranha", afirma ele. "Se a idéia da Caixa é boa, e pode mesmo se expandir pelo mercado, por que até agora nenhum banco incrementou essa linha aos pequenos correntistas?" Para ele, "esse dinheiro, de R$ 200 a R$ 300, não é pouco, mas não é solução" para elevar o patamar atual de demanda.
Na avaliação de um diretor financeiro de um banco privado, ouvido pela Folha, a ação da Caixa tem mais um efeito "simbólico" no sentido de mostrar à população que há determinação do governo em impulsionar o crédito.
Hoje, há mais de R$ 26 bilhões em circulação no mercado na categoria crédito pessoal -em que os juros cobrados pelas financeiras ultrapassa 12% ao mês.
Segundo informou a direção da Caixa na semana passada, o banco irá destinar recursos baratos -a taxa de juros deve variar de 2% a 2,5% ao mês- por meio de uma linha de crédito para pessoas com conta corrente na instituição. Serão beneficiados aqueles que possuem conta com movimentação de até R$ 3.000 por mês (cerca de 2,3 milhões de clientes).

Financeira quer participar
Quando esse dinheiro -aquele que pode ser usados em gastos gerais- for parar na conta dos clientes do banco, economistas creditam que o destino será o mesmo. Pagamento de débitos, utilização na compra de bens não-duráveis (alimentos) e, eventualmente, gasto com mercadorias de pequeno valor.
Para Paulo Saab, presidente da Eletros, que representa o setor eletrônico, a medida tomada pela Caixa é apenas "um furinho para entrar o ar" na atividade econômica. Deve atrair, de forma lenta, interessados numa abertura de conta mais simplificada na Caixa, mas não passa disso.
"Eles estão dando o peixe, mas não ensinam a pescar. O camarada pode até usar o recurso para uma compra pequena, mas é preciso mais do que isso para apenas tentarmos sair do sufoco."
A Acrefi, que representa as financeiras, informou ontem que pedirá ao Ministério da Fazenda a inclusão das financeiras no projeto. "Vamos propor que esse dinheiro seja repassado para nós para que possamos oferecer uma linha também", disse Ricardo Malcon, presidente da entidade. A idéia é oferecer esses recursos com taxas mais baixas que as cobradas pelo setor.


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