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OPINIÃO ECONÔMICA
Risco de aposentadoria precoce
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Ao reduzir em 1,5 ponto
percentual a taxa básica de
juros, o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central)
dá um sinal de que irá flexibilizar
a política monetária. Pode-se lamentar o atraso; pode-se discutir
também se uma redução um pouco mais acentuada, algo na faixa
de dois a quatro pontos, não teria
sido desejável, tendo em vista o
comportamento dos índices de
preços e a fraqueza preocupante
da produção e do emprego. Um
cínico diria: "Antes estávamos
nos suicidando do 26º andar; agora estamos nos suicidando do
24º". Mas o fato é que o Banco
Central começa, finalmente, a
afrouxar o torniquete monetário.
Evidentemente, a decisão do
Copom não modifica o quadro
geral da economia, que está sendo submetida a uma política fundamentalmente hostil ao crescimento e à geração de empregos.
Os juros reais, sobretudo nos empréstimos tomados pelas pequenas e médias empresas e pelas
pessoas físicas, continuarão extremamente elevados. A exagerada
revalorização cambial prejudica
a produção e o emprego nos setores que exportam e nos que concorrem com importações. A política fiscal continua extremamente restritiva, superando as metas
ambiciosas do acordo com o FMI.
Além disso, nada de importante
foi feito até agora para enfrentar
a principal restrição ao crescimento econômico: a crônica vulnerabilidade externa. O déficit de
balanço de pagamentos em conta
corrente diminuiu muito desde
meados de 2002, mas pode voltar
a subir perigosamente em razão
da revalorização recente do real.
A conta de capitais continua excessivamente aberta. E as reservas
internacionais, primeira linha de
defesa em momentos de turbulência, estão muito abaixo do que seria recomendável, como frisou
Paulo Rabello de Castro em artigo publicado ontem neste espaço.
A reforma previdenciária, por
sua vez, está muito marcada por
um enfoque fiscalista e arrecadatório, o que tenderá a reforçar o
movimento de retração da economia. Por conta dessa reforma, o
governo federal colocou-se em
confronto direto com o funcionalismo, elemento fundamental não
só da sua base de apoio político
mas das próprias condições de
funcionamento do Estado.
Os servidores estão se sentindo
não só agredidos em seus direitos
mas traídos por políticos que, em
muitos aspectos, praticam no governo exatamente o contrário do
que pregaram e prometeram ao
longo de suas vidas. Ora, só quem
nunca passou por Brasília ou
qualquer outra função pública
pode imaginar que um governo
tenha chances de funcionar sem o
concurso do seu corpo de funcionários permanentes.
Em matéria de política macroeconômica, o governo Lula tomou
o rumo errado. A cúpula política
do governo já deve ter se dado
conta disso. O presidente da República e o ministro da Fazenda
indicaram, em diversos pronunciamentos, que aguardam o início de uma fase de crescimento
econômico. Eles sabem muito
bem que a sorte do governo depende da retomada do crescimento.
Se a recuperação da economia
demorar ou vier fraca, como no
governo FHC, bye-bye PT. Os
amigos plutocráticos do "new PT"
desaparecerão rapidamente. E os
eleitores darão a resposta merecida nas urnas, primeiro em 2004 e
depois em 2006.
O problema, volto a dizer, é que
no Ministério da Fazenda e no
Banco Central os postos de comando e influência estão, com
poucas exceções, nas mãos de economistas e financistas conservadores, que pouco ou nada sabem
sobre crescimento econômico e
geração de empregos. Vários deles
têm pouca ou nenhuma experiência de setor público. Quase todos
se orientam pelos dogmas e superstições do pensamento econômico convencional, já bastante
desmoralizado pelos fracassos e
desastres que produziu no Brasil e
em vários outros países em desenvolvimento. Como disse o meu
amigo Luiz Gonzaga Belluzzo, esperar dessa equipe econômica
uma nova política de crescimento
é como encomendar comida italiana a um cozinheiro chinês.
Entre as ilusões do pensamento
econômico convencional está a
noção bastante esdrúxula de que
às políticas fiscal e monetária cabe, às vezes, dar demonstrações
dramáticas de austeridade, "cortar na carne" se necessário, para
convencer os mercados de que o
governo merece confiança. Aplicado esse "choque de credibilidade", o setor privado voltaria a investir, propiciando as condições
para o crescimento.
Essas e outras fábulas econômicas contaram com bastante apoio
nos meios acadêmicos norte-americanos em certa época, mas
não funcionaram muito bem no
mundo real. Uma razão é que as
medidas recomendadas para gerar credibilidade (altas taxas de
juro, restrições ao crédito, cortes
de gastos públicos, aumentos de
impostos) geram antes de mais
nada diminuição da demanda
agregada. Em consequência, as
vendas diminuem, os estoques se
acumulam e os níveis de produção acabam caindo. A recessão se
instala, o desemprego cresce, a capacidade ociosa das empresas
também. Nesse ambiente, a recuperação da "credibilidade" transforma-se em miragem.
E os políticos que compram por
muito tempo esse tipo de pacote
ortodoxo acabam na aposentadoria precoce.
Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A
Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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