São Paulo, sexta-feira, 24 de agosto de 2001

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LUÍS NASSIF

A FAB e os jatos russos

Na próxima licitação para a compra de caças pela FAB (Força Aérea Brasileira) é curiosa a questão do MIG-29. Praticamente todos os competidores o tratam como um dos projetos mais avançados e mais apropriados ao Brasil. Segundo essas avaliações, possui mísseis de uma geração à frente dos demais.
Além disso -segundo informa o leitor Doug Venan-, tem também uma versão naval, com peso operacional compatível com o porta-aviões São Paulo, o que permitiria o uso em situações de contingência.
Os concorrentes criticam outros aspectos do modelo. Haveria dificuldades de manutenção, falta de estrutura de peças de reposição e dificuldades com financiamentos. O leitor, por seu lado, identifica nessas fragilidades pontos que poderão ser vantajosos em negociações.
Dada a situação atual da Rússia, pode-se investir na possibilidade de produzir o avião internamente sob licença e sem nenhuma restrição de transferência de tecnologia. Bem negociado, se poderia até conseguir a tecnologia de motores, melhorando internamente o projeto, graças ao conhecimento adquirido pela Embraer no período.
Segundo o leitor, alguns anos atrás os russos chegaram a propor trocas comerciais, aceitando o pagamento de material militar com commodities ou produtos industriais, dada a flagrante escassez de divisas do país. Conclui o leitor que, politicamente, uma negociação desse tipo daria ao país real soberania na área, além de ampliar as relações diplomáticas e comerciais com um país importante.
Trata-se de mais uma visão relevante que divulgo, como contribuição a esse debate.

Lobbies
É malicioso, mas pouco eficaz, o lobby dos grandes fabricantes internacionais de aviões, candidatos ao programa F-X da FAB, de compra de jatos. Há um movimento crescente de opinião pública de substituir a licitação por compras diretas da Embraer, com base em um conjunto de argumentos relevantes. É empresa nacional, a fabricação seria aqui, haveria a geração interna de empregos, a absorção de tecnologia pelo país e tudo o mais.
Para compras dessa magnitude, qualquer país do mundo dá prioridade para a própria indústria local, porque é a indústria local que contrata trabalhadores locais, encomendas locais e paga impostos localmente. Esse movimento é suprapartidário e supra-ideológico e tem a adesão de políticos como Paulo Delgado (PT-MG), Roberto Freire (PPS-PE) e Luiz Antônio Fleury Filho (PTB-SP).
Para o lobby das multinacionais, no entanto, a Embraer não é empresa nacional, por ter sócios minoritários estrangeiros. Por esse prisma, a Usiminas dos anos 80 não o era, como não o é a Sadia, a Gerdau ou qualquer empresa com ADRs em Nova York.
Nem se pretenda discutir conceitos de política industrial mais complexos, como o fato de que a absorção de tecnologia internamente irá beneficiar o país como um todo. Nem se peça que entendam conceitos industrialistas correntes, como os de que o desenvolvimento de produtos e tecnologia internamente, ainda que por parte de multinacionais, agrega muito mais valor ao país do que o mesmo produto desenvolvido na matriz. Há toda uma rede de fornecedores que é beneficiada, há conhecimento sofisticado que é transferido para a cadeia de produção, há a contratação de institutos de pesquisa nacionais, criando a massa crítica para a atração de novas empresas.
O papel de uma licitação deve ser apenas o de balizar os preços, para evitar abusos.


Internet: www.dinheirovivo.com.br

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