São Paulo, terça-feira, 24 de agosto de 2004

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OPINIÃO ECONÔMICA

O capitão e suas batalhas

BENJAMIN STEINBRUCH

Todos os que lutam pela redução dos juros para impulsionar os investimentos e o crescimento econômico no país perderam algumas batalhas neste ano, mas ainda não perderam a guerra. O Banco Central vem mantendo a taxa Selic em 16% desde abril, uma aberração inexplicável, que segura os juros reais básicos na casa dos 10% ao ano.
A guerra contra os juros altos continua. Em setembro, o Banco Central vai reavaliar a Selic e, diz o mercado, dá indicações de que poderá elevá-la (inacreditável!). Também em setembro haverá outra batalha, esta no Conselho Monetário Nacional, tão importante quanto a do BC, porque no CMN será decidida a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) para o quarto trimestre do ano.
A TJLP tem fundamental importância na política de apoio ao desenvolvimento das empresas de capital nacional por uma razão simples: ela é aplicada nos quase 450 mil financiamentos concedidos pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), principal agente financeiro para créditos de longo prazo no país.
Em junho, a despeito da pressão em favor de uma redução da TJLP no terceiro trimestre, o Conselho Monetário Nacional a manteve em 9,75% ao ano. Para que as entidades empresariais se manifestassem a favor da redução, foi preciso entrar em campo o capitão Carlos Lessa, presidente do BNDES, que publicamente reclamou da indiferença de lideranças das federações das indústrias de São Paulo, do Rio e de Minas Gerais em relação ao assunto.
Lessa defendia e continua a defender uma redução da TJLP para 8% ao ano. Não se justifica essa taxa de 9,75%, porque a TJLP é fixada com base na inflação futura. Como a meta de inflação para 2005 está fixada em 4,5%, conclui-se que a taxa de juros de longo prazo representa mais que o dobro da inflação prevista.
A batalha por juros menores não pertence só a Carlos Lessa, a Darc Costa e às entidades empresariais de classe. Ela deve ser de todos, empresários ou não, que acreditam no capital nacional como fator de desenvolvimento. Não se pode arrefecer a luta só porque a economia entrou em crescimento. Ao contrário, a manutenção do crescimento exige investimentos e decisões de tocar projetos há anos engavetados pelo setor privado. Com uma taxa de juros mais favorável, embora nunca subsidiada, haverá maior estímulo para que as empresas tomem essas decisões.
Não é segredo para ninguém que o aumento da demanda já traz problemas de abastecimento de bens intermediários na área industrial. Gargalos existem em muitos setores, como os de papel e celulose, siderurgia e borracha. No seu conjunto, a indústria já usa quase 85% de sua capacidade instalada, numa demonstração evidente de que o país precisa de investimentos.
Todos devem, portanto, aceitar e apoiar a liderança desenvolvimentista e nacionalista da direção do BNDES nessa batalha pela redução da TJLP. No fundo, trata-se de uma ação que contraria o sistema bancário, ao qual não interessa a redução da taxa de juros para investimentos.
Empresários nacionais que resistiram e mantiveram o controle de suas empresas durante o longo período de vacas magras podem ser considerados heróis. Agora que a economia retoma a expansão e surge a urgente demanda de investimentos, é justo que tenham o apoio financeiro para tocar seus projetos e recuperar posições perdidas para o capital estrangeiro. Isso não é privilégio nenhum.
Cabe ao Conselho Monetário Nacional decidir sobre a TJLP. Infelizmente, a representatividade do CMN está longe de ser a ideal, porque seus membros são todos do governo: os ministros do Planejamento e da Fazenda e o presidente do Banco Central. Por ironia, em momentos menos democráticos da vida brasileira, o CMN já teve melhor representatividade, com membros do setor privado. De qualquer forma, espera-se que tome em setembro uma decisão menos voltada para os umbigos do conservadorismo monetário.


Benjamin Steinbruch, 50, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional e presidente do conselho de administração da empresa.

E-mail - bvictoria@psi.com.br


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