São Paulo, quarta-feira, 24 de outubro de 2007

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PAULO RABELLO DE CASTRO

Duas perguntas e a porta do céu


Longe de ser o céu, o próximo "rating" do Brasil é apenas a transição rumo a degraus mais altos de prudência

ANALISTAS financeiros costumam vender o adventista "investment grade" do Brasil como a porta do céu. Não é, e está longe de sê-lo. Há dez anos, quase ninguém na avenida Paulista sabia pronunciar a palavra "rating". Hoje, qualquer estagiário no mercado sabe e espera que o "rating" de crédito do país seja elevado até 2009 para a categoria de "investimento prudente" ("investment grade"), abrindo portas a mais investidores de fora, pela maior confiabilidade na gestão econômica.
As agências de risco atribuem notas (com letras) que procuram mostrar a qualidade de crédito de um devedor qualquer (pode ser desde um país até uma pequena companhia) de acordo com uma escala que tem 20 degraus em que, no topo, está o grau máximo (AAA) e, lá em baixo, a nota do inadimplente ou do falido, que é D (de "default"). A linha divisória entre os riscos "especulativos" e o bloco de "investimento prudente" é bem no meio dessa escala, entre as faixas BB e BBB, e o Brasil está prestes a pular para o nível mais baixo da categoria não-especulativa. Portanto, longe de ser o céu, a próxima nota do Brasil é apenas a transição rumo a degraus mais altos de prudência (são dez), cuja ascensão o país mal inicia. Há ainda muito mais o que plantar e colher antes de a garganta dos políticos posar de ótima, faturando com a provável promoção do "rating" brasileiro.
Duas perguntas: o que falta para o Brasil "virar" "grau de investimento"? E o que se pode fazer para acelerar a marcha por notas ainda melhores daqui para a frente? A resposta à primeira é a questão fiscal, pois o setor público no Brasil é um obeso que esbanja o muito que come, em impostos, dos setores que produzem. A tragédia brasileira não é arrecadar pouco, e sim arrecadar demais!
Mas como? É a arrecadação crescente que tem propiciado o eterno adiamento da melhoria do padrão de gestão do Estado. Em bom português: é a eterna moleza, de contar sempre com uma prorrogação gratuita de CPMF, as recorrentes cobranças do fisco sobre o cidadão que já pagou o que devia, o juro sobre juro e o imposto sobre imposto que o Judiciário ainda permite ao governo, isso tudo facilita a vida do gastador inveterado. E como fazer para quebrar esse maldito hábito de gastar muito e mal? Aqui vem a sempre adiada reforma tributária, embora anunciada, várias vezes, de mentirinha, por governos sucessivos.
O atual partido do governo relançou uma idéia que merece tratativa: convocar uma Constituinte revisora exclusiva, com o propósito específico de propor e votar um sistema tributário e um sistema político realmente adequados ao país "investment grade" que seremos em breve. A proposta merece respeito e, como cidadão, apóio-a. Por duas razões: se bem-feita, a Constituinte revisora traria uma aceleração econômica espetacular; segundo, porque houve, em 1993, uma infausta revisão monocameral da Constituição (que fará 20 anos em 2008) que fracassou por falta de interesse dos parlamentares.
Para a idéia vingar, proponho um plebiscito para aprovar o projeto da Constituinte revisora, com uma pergunta colocada ao eleitor nas próximas eleições de 2008. Se vencedora a tese, far-se-ia uma eleição especial em 2009, para o país escolher constituintes exclusivos, não-parlamentares, que voltariam para casa, inelegíveis, após entregar o novo texto constitucional. É uma tese ousada, para um país que não tenha medo de virar gigante.


PAULO RABELLO DE CASTRO , 58, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.
rabellodecastro@uol.com.br


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