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Suíça investiga doleiros no caso Parmalat
Procuradoria do país suspeita de que tenham remetido ilegalmente recursos, contribuindo para a quebra da empresa no Brasil
Investigação já solicitou ao governo dos EUA quebra do sigilo de uma série de contas supostamente abertas em Nova York por doleiros
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
A Procuradoria Geral de Justiça da Suíça decidiu investigar
doleiros brasileiros sob a suspeita de que eles ajudaram a retirar recursos que acabaram
por quebrar a Parmalat no Brasil. Os suíços suspeitam de que
dois bancos daquele país serviram para lavar dinheiro desviado da filial brasileira da Parmalat italiana.
Os recursos ilegais da Parmalat que passaram pelos bancos
suíços podem chegar a 1 bilhão (cerca de R$ 2,8 bilhões),
segundo estimativa feita pela
procuradoria. Não dá para saber, no estágio atual da investigação, qual foi o percentual
desse valor que saiu da filial
brasileira da Parmalat.
A Parmalat que opera hoje
no Brasil não tem nada a ver
com a empresa italiana. Está
em processo de recuperação
judicial e paga royalties para
usar a marca.
O primeiro passo da investigação suíça foi solicitar ao governo dos Estados Unidos a
quebra do sigilo de uma série
de contas supostamente abertas em Nova York por doleiros
brasileiros.
A procuradoria quer conhecer todas as remessas feitas pelas "offshores" Gatex, Harber,
Venus e Sorage para três bancos nos EUA -Merchants
Bank, MTB Bank e European
American Bank. "Offshores"
são empresas abertas em paraísos fiscais com o objetivo de facilitar transações internacionais e, ao mesmo tempo, dificultar a investigação para saber
quem é o dono da empresa.
A Gatex, a Harber, a Venus e
a Sorage foram criadas pelo
empresário Antonio Pires de
Almeida, preso em fevereiro do
ano passado sob acusação de
ter feito remessas ilegais para
os EUA que somam US$ 1,8 bilhão, entre 1995 e 2002 -o
equivalente a R$ 3,9 bilhões em
valores atuais.
Pires de Almeida continua
preso -está em prisão domiciliar porque tem 82 anos. Se é
verdadeira a suspeita de que a
Parmalat usou o empresário
para fazer remessas, a multinacional italiana usou um doleiro
que trabalhava para traficantes
de drogas. A primeira acusação
contra Pires de Almeida partiu
do DEA (a agência contra drogas dos EUA) e do DHS (Department of Home Security,
que cuida da segurança interna
naquele país). Numa investigação feita em 1999, o DEA apontou que ele lavava dinheiro para traficantes -o que Pires de
Almeida nega.
Os suíços solicitam aos EUA
informações sobre Maria Carolina Nolasco, uma portuguesa
naturalizada americana que
confessou administrar cerca de
230 contas de doleiros no Merchants Bank.
Esquema triangular
A procuradoria suíça tem indicações de que a lavagem de
dinheiro desviado da Parmalat
seguia um esquema triangular.
O dinheiro saía do Brasil por
meio de doleiros, ia para contas
nos EUA e de lá era enviado para a Suíça e a Itália.
De acordo com a procuradoria, dois brasileiros e um italiano residente no Brasil teriam
aberto contas em bancos europeus para receber o dinheiro
desviado. Ainda segundo os
suíços, os dois brasileiros são
suspeitos de serem laranjas de
um consultor italiano, Luca Sala, que prestou assessoria para
a Parmalat italiana e trabalhou
numa agência do Bank of America de Milão que teria lavado
dinheiro desviado. O banco
afirma na ação judicial em curso na Itália que não cometeu irregularidade.
O curioso é que os supostos
laranjas não seguem o figurino
clássico do laranja: não são pobres, serviçais nem favelados.
Um deles, Arthur Cleber Telini,
é médico ortopedista em Campinas (SP) e fez mestrado na
Santa Casa de São Paulo. O outro, Melford Vaughn Neto, trabalha como advogado tributarista e dá aulas de direito numa
faculdade de Americana -o Isca (Instituto Superior de Ciências Aplicadas).
Telini e Vaughn Neto são
acusados de terem aberto contas num banco suíço, o Graubündner Kantonalbank, na cidade de Chur, para lavar recursos da Parmalat.
Ambos negam as duas suspeitas levantadas pelos suíços e
pelos italianos -a de que tenham servido de laranja e que
tenham feito remessas ilegais.
O italiano radicado no Brasil
é o executivo Andrea Sala, que
prestou assessoria tributária
para a Parmalat no Brasil e é irmão de Luca Sala, ex-diretor do
Bank of America em Milão,
acusado de ter ajudado a criar o
esquema de lavagem.
Andrea é acusado pelos procuradores de ter aberto uma
conta no Banco de Lugano, na
cidade homônima da Suíça,
também com propósitos de lavar dinheiro.
É a primeira vez que a Suíça
investiga doleiros brasileiros. A
regra nesse país era considerar
doleiros como uma espécie de
mal menor para quem não quer
pagar impostos -na Suíça, sonegação fiscal em outro país
não é crime e, por isso, eles recebiam de bom grado os recursos dos sonegadores.
Esse cenário mudou completamente após os ataques terroristas aos Estados Unidos de 11
de setembro de 2001 -todo dinheiro ilegal passou a ser olhado com lupa.
O doleiro Pires de Almeida
também está sob investigação
nos EUA. A promotoria de Manhattan o acusa de operar como banco sem ter a devida autorização. Uma das agências do
Bank of America que recebeu
recursos de doleiros brasileiros
fez um acordo com os promotores e pagou uma multa de
US$ 6 milhões para encerrar as
investigações.
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