São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 2004

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CONTRA

Conservadorismo do Copom vai retardar o crescimento

ALEX AGOSTINI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em sua 92ª reunião, o Copom (Comitê de Política Monetária) foi extremamente conservador e contrariou todas as expectativas do mercado financeiro ao decidir por manter a taxa básica de juros (Selic) em 16,5% ao ano.
O que convém neste momento é discutir a alteração de atitude do Copom em relação à condução da política monetária.
Antes da reunião da semana passada, havia no cenário para 2004 a possibilidade de o Copom promover em algum momento, talvez em março ou abril, uma parada estratégica na redução dos juros para fazer um prognóstico de como reagiu a economia brasileira diante das últimas reduções da taxa básica.
No entanto, acredito que foi extremamente prematura a decisão do Copom em manter os juros paralisados. Sabe-se que o setor industrial, tradicionalmente, sofre redução no seu nível de produção entre os meses de novembro e fevereiro. Portanto, só seria possível fazer um balanço exato da reação da economia diante das reduções dos juros por volta de março ou abril, como citado anteriormente.
No que diz respeito à inflação, o processo de aceleração estabelecido entre o final de 2002 e início de 2003 foi um momento em que a decisão de subir a taxa de juros foi acertada por parte do Copom. No entanto, a partir de maio de 2003 a taxa de inflação acumulada em 12 meses entrou em trajetória descendente, passando de 17,2% para atuais 9,3% (IPCA), com expectativa de manter essa trajetória até meados de 2004.
Portanto, não faz sentido justificar que é necessário "preservar as conquistas recentes no combate à inflação", pois essa conquista ocorreu há algum tempo.
A adoção de extremo conservadorismo por parte do Copom causa outros efeitos colaterais à economia que vão além da sua jurisdição.
Uma delas é o fato do país ainda ser o primeiro no ranking das maiores taxas de juros reais (9,95% contra 8,6% da Hungria, em segundo lugar) e isso faz com que uma parte do capital que está investido no mercado financeiro e poderia ser direcionado ao setor produtivo em 2004, permaneça por mais algum tempo no mercado financeiro rendendo o melhor retorno em todo o mundo.
Outro efeito sobre a economia é a postergação do início do processo de reabilitação do mercado de trabalho, ou seja, recuperação da renda do trabalhador e geração de novos postos de trabalho, fato que estava previsto para ocorrer entre o final do primeiro semestre deste ano e que agora poderá ocorrer somente no segundo semestre.
Ademais, há ainda a questão de um desencaixe desnecessário por parte do governo federal para pagar a rentabilidade de seus títulos que estão no mercado financeiro. A manutenção da taxa deverá custar aos cofres do governo R$ 2,2 bilhões nos próximos 12 meses. Portanto, a dívida pública interna, que tem 61,5% de seus títulos indexados à taxa de juros (50,5% Selic e 11% prefixados), continuará elevada.
Por fim, o Copom perdeu uma janela de oportunidade para testar novos níveis de taxas de juros nunca vistos na história recente da economia brasileira e, dessa forma, tentar sair da situação "stop and go" do crescimento econômico brasileiro ocorrido nos últimos anos.
A última vez que o país viveu juros abaixo do patamar de 15% ao ano foi em março de 1975 (13,6%). Na medida em que se retarda uma queda mais consistente dos juros, ampliam-se os riscos de novamente ocorrer uma crise interna e, mais uma vez, abortar o processo de retomada do crescimento.
A manutenção dos juros no mercado externo em níveis historicamente baixos é muito favorável ao Brasil, pois isso direciona capitais de investimentos para o país e produz efeitos positivos nas contas externas, como tem ocorrido nos últimos meses.
Outro ponto crítico é a manutenção da meta de inflação de forma rígida. Ou seja, num país como o Brasil, a taxa de câmbio flutuante, os problemas no fechamento das contas externas ainda não equacionados por completo e as tarifas públicas indexadas são fatores que comprometem a queda dos juros no médio prazo, por causa do cumprimento da meta de inflação, que não tem refresco mesmo estando no gargalo.
Espera-se que o Copom seja muito menos conservador daqui por diante em prol da economia brasileira.


Alexsandro Agostini Barbosa é economista da consultoria Global Invest.


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